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Publicada em 21 de Março de 2025 às 17:50

Cozinha das Pretas leva dignidade e conhecimento à periferia de Porto Alegre

Integrantes da  associação também criaram a oficina

Integrantes da associação também criaram a oficina "Tempero das Pretas" para produção de temperos artesanais

THAYNÁ WEISSBACH/JC
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Amanda Flora
Amanda Flora
"Quem tem fome, tem pressa", essa é a frase que guia o trabalho da fundadora da Associação Cozinha das Pretas, Ana Paula da Silva. A iniciativa, que surgiu num momento de dificuldade, a enchente de maio, hoje é exemplo de solidariedade e resistência na periferia. Isso porque é um grupo de mulheres negras, periféricas e de baixa renda que se organizam para auxiliar a própria comunidade, principalmente às pessoas em situação de extrema vulnerabilidade.
"Quem tem fome, tem pressa", essa é a frase que guia o trabalho da fundadora da Associação Cozinha das Pretas, Ana Paula da Silva. A iniciativa, que surgiu num momento de dificuldade, a enchente de maio, hoje é exemplo de solidariedade e resistência na periferia. Isso porque é um grupo de mulheres negras, periféricas e de baixa renda que se organizam para auxiliar a própria comunidade, principalmente às pessoas em situação de extrema vulnerabilidade.
A ideia começou a tomar forma após uma experiência pessoal que a fundadora viveu, quando seu filho recebeu o diagnóstico de Transtorno de Conduta e ela resolveu largar seu trabalho no Hospital Moinhos de Vento. O desafio fez Ana buscar apoio e informação. E é aí que ela começa a conhecer mais a própria comunidade e entender as necessidades do seu povo. "Conversando com a minha enfermeira, ela disse que era o momento de eu parar para dar uma atenção especial para meu filho. E foi o que fiz. Eu não tinha hábito nem de saber o nome dos vizinhos", afirma a fundadora do projeto.
Com a enchente de maio, Ana organizou um grupo de mulheres para preparar e distribuir alimentos aos afetados. "Todo dia da semana, de segunda a segunda, nós enviamos marmita para tudo quanto era canto. E mesmo com o fim da enchente, continuamos a atuação na comunidade", relembra. O gesto solidário cresceu rapidamente e a Cozinha conseguiu o apoio da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Grupo Hospitalar Conceição (GHC). Então, a organização foi formalizada como associação para receber doações com mais segurança.
Dona Maria Eunice foi uma das primeiras beneficiadas pelo projeto, um dia a aposentada precisou do auxílio e foi ao local, de lá, nunca mais saiu. Maria Eunice é uma das integrantes, atuando como cozinheira da Associação. "Eu vim quando ainda era uma barraca. Me sinto realizada em participar, porque as pessoas ficam bem felizes quando recebem um almoço ou uma janta", afirma.
Ainda segundo ela, o espaço é muito mais. Ela conta que, antes de atuar como voluntária, ficava em casa parada. Agora tem uma vida mais ativa por conta desse trabalho. "A cozinha não é só uma cozinha, mas um lugar seguro para conversar, falar dos problemas, ganhar um abraço, um carinho. É de tudo um pouco", finaliza a aposentada.
Hoje, o espaço conta com uma estrutura melhor do que tinha quando começou. Ana Paula lembra que, quando fizeram a primeira distribuição de marmitas, a cozinha ficava numa barraca armada em frente à sua casa. Agora, após as campanhas, apoios externos e a institucionalização da Associação, as voluntárias conseguiram um contêiner para instalar a cozinha.
Além da distribuição de alimentos, hoje o projeto oferece cursos gratuitos, oportunidades de qualificação profissional e oficinas de geração de renda. Quem busca auxílio na Cozinha das Pretas pode ter acesso a capacitações em informática, manutenção de placa solar e até formação técnica em enfermagem, viabilizadas por meio de parcerias com instituições de ensino. A Associação também criou a oficina "Tempero das Pretas", onde os participantes produzem temperos artesanais para comercialização.
O Grupo Hospitalar Conceição (GHC) atua no espaço com orientação nutricional. No dia em que a nossa reportagem foi ao local, profissionais do GHC estavam dando uma capacitação aos voluntários. O módulo do dia: boas práticas de higienização na cozinha.
Agneskelly Ramires, uma das nutricionistas responsáveis pelo curso, afirma que a Cozinha presta um serviço essencial para a comunidade. "A Cozinha atende um público específico, são pessoas em situação extrema vulnerabilidade, e esse acesso à alimentação muitas vezes é negado a elas. Enquanto profissional da saúde, me preocupo com o acesso da comunidade a direitos básicos, porque a insegurança alimentar e nutricional é bem forte nesse território e a Cozinha atua para melhorar essa situação", afirma a nutricionista.
A Associação Cozinha das Pretas está localizada no Acesso E7 da Av. Vila Santíssima Trindade, no bairro Rubem Berta. O projeto serve almoço e janta para a comunidade todas as quartas-feiras, e no primeiro sábado de cada mês é promovido um almoço especial na sede de uma escola da região

Projeto busca apoio para expandir e seguir atuando

Ana Paula espera conseguir  mais recursos e doações para a iniciativa

Ana Paula espera conseguir mais recursos e doações para a iniciativa

THAYNÁ WEISSBACH/JC
Apesar dos avanços, a Associação Cozinha das Pretas ainda enfrenta desafios para manter suas atividades. O projeto depende de doações para continuar garantindo a alimentação da comunidade. Isso porque o custo do botijão de gás, de sacos de cebola e alho, por exemplo, não estão inseridos na lista de itens que o projeto recebe de algumas instituições. Além disso, a estrutura física da cozinha precisa de melhorias, como portas e janelas adequadas, e a construção de um banheiro. "Ainda não temos apoio para a construção do banheiro, a estrutura iria nos ajudar muito", afirma Ana.
A fundadora diz que seu grande sonho é que a Cozinha das Pretas tenha um espaço próprio, onde possam oferecer as refeições, os cursos e as oficinas num ambiente estruturado, com espaço para acolher e fortalecer a comunidade da Rubem Berta. "Imagina uma oficina-escola com um espaço para pessoas comerem, crianças terem turno inverso e idosos oferecerem oficinas como fuxico, crochê e interagirem entre si. Sair da frente da TV, cuidar da saúde. É um sonho", finaliza Ana Paula.
Quem quiser ajudar a Associação Cozinha das Pretas pode contribuir por meio de doações financeiras via Pix — Chave: (51) 980576142 ou oferecendo materiais, insumos e até mão de obra — basta entrar em contato através do e-mail: cozinhadaspretas2024@gmail.com. O projeto também busca parcerias que possam apoiar sua estruturação e expansão.
 

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