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Publicada em 05 de Janeiro de 2025 às 16:00

Promessas de Trump elevam bitcoin a patamar histórico

O presidente eleito fez uma aparição em um dos maiores eventos de criptoativos do mundo

O presidente eleito fez uma aparição em um dos maiores eventos de criptoativos do mundo

Youtube/Reprodução/JC
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Marcus Meneghetti, especial para o JC*
Marcus Meneghetti, especial para o JC*

O preço da criptomoeda bitcoin (BTC) começou uma escalada sem precedentes no dia 5 de novembro de 2024, quando foi oficializada a vitória do republicano Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos. Em pouco mais de um mês, a maior criptomoeda do mundo subiu 59,6% - saindo da marca dos US$ 67.850,00 (cerca de R$ 410,2 mil) em direção ao mais alto patamar já registrado, US$ 108.353,00 (cerca de R$ 660 mil). Apesar de o BTC ter recuado para a marca dos US$ 90 mil na última semana do ano, analistas do setor acreditam que o preço da criptomoeda pode bater novos recordes em 2025, por conta das medidas prometidas por Trump durante a campanha eleitoral.
O presidente eleito - que, há alguns anos, chegou a dizer que as criptomoedas não passavam de "fraudes" - fez uma aparição em um dos maiores eventos de criptoativos do mundo, a Conferência do Bitcoin, realizado em julho em Nashville. Ele foi ovacionado pela plateia composta por milhares de investidores ao afirmar que os "Estados Unidos vão ser a capital mundial das criptomoedas e a maior superpotência do bitcoin".
Durante a campanha presidencial, o republicano se comprometeu com três medidas para o setor de criptoativos, o que garantiu não só o apoio massivo do setor, mas também milhões em doações de campanha. A medida mais importante é a criação de uma "reserva nacional estratégica de bitcoin".
"Vai ser uma política da minha administração à frente dos Estados Unidos manter todos os bitcoins que o governo já possui e adquirir mais no futuro", Trump arrancou aplausos do auditório ao discursar no evento dedicado ao bitcoin.
Atualmente, o governo estado-unidense possui 207.189 bitcoins (o equivalente a mais de US$ 21 bilhões, de acordo com a cotação do bitcoin no horário do fechamento desta matéria). O Estado norte-americano confiscou grande parte dessas moedas em processos judiciais e, pelo menos até hoje, a política estatal tem sido revendê-las no mercado de criptoativos.
O plano de Trump para a reserva estratégica de bitcoins não se resume a manter no tesouro nacional as criptomoedas confiscadas pela Casa Branca. Há a expectativa de que o presidente eleito apoie o projeto da senadora republicana Cynthia Lummis, conhecido como "Bitcoin Act" (Ato do Bitcoin). Inclusive, Trump e Lummis se encontraram na conferência em Nashville.
O Bitcoin Act é um projeto de lei apresentado neste ano pela senadora republicana. Conforme o texto, o governo estado-unidense compraria 200.000 bitcoins anualmente, durante cinco anos. Cynthia Lummis detalhou o objetivo da sua proposta no mesmo auditório onde Trump discursou.
"Por cinco anos, os Estados Unidos vão juntar um milhão de bitcoins, cerca de 5% do total de bitcoin disponível no mercado. Essa quantia vai ser mantida por pelo menos 20 anos. Então, poderá ser usado para um propósito: reduzir o déficit norte-americano", ela também foi bastante aplaudida. Em 2024, o déficit dos Estados Unidos acumulou cerca de US$ 36 trilhões.

Criptomoeda atua como uma espécie de 'remédio' contra a inflação

Empresas & Negócios - Especial Bitcoin -Rendimentos anuais do Bitcoin - Fonte StatMuse

Empresas & Negócios - Especial Bitcoin -Rendimentos anuais do Bitcoin - Fonte StatMuse

StatMuse/Reprodução/JC
A aposta no bitcoin para reduzir o débito estadunidense está ligada à ideia de que essa criptomoeda atua como uma espécie de "remédio" contra a inflação, uma vez que o número de bitcoins em circulação é limitado a 21 milhões, o que valorizaria o preço de cada unidade da moeda à medida que aumenta a demanda pelo BTC. Ao contrário, as moedas fiduciárias estão sujeitas à desvalorização à medida que os bancos centrais de cada país imprimem mais papel-moeda (gerando mais inflação). É o caso do dólar, euro e real, por exemplo.
Entretanto, o professor de finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Jefferson Colombo, que se dedica à pesquisa na área de criptoativos, afirma que as evidências de que o bitcoin é um escudo contra a inflação são mistas. Ele pondera que o bitcoin, que está no mercado há quinze anos, ainda é um ativo jovem. Ele compara ainda as características dessa criptomoeda com as do ouro, que é usado como reserva nacional há séculos.
"Ao contrário do ouro, que parece oferecer uma proteção contra a inflação em diferentes contextos, o bitcoin parece ser mais suscetível a momentos de incerteza, como aquele período pós-Covid (em 2022, quando a criptomoeda desvalorizou 64,3%). Se você analisa um longo período, esse criptoativo tem propriedades que protegem contra inflação. Mas, em subperíodos, essa propriedade é menos robusta", analisa Colombo.
O professor da FGV também pondera que a reserva de bitcoin faz sentido dentro de um portfólio variado de investimentos, "porque diminui o risco caso dê errado". De qualquer forma, lembra que a nova composição do Congresso dos Estados Unidos vai ser propícia à aprovação dessa medida.
Os republicanos terão maioria no Senado e na Câmara dos Representantes. Além disso, nas eleições de novembro, 247 candidatos defensores dos criptoativos foram eleitos para os 435 assentos na Câmara dos Representantes. Quanto ao Senado, das 100 vagas, 18 serão ocupadas por senadores que se autointitulam "pró-cripto".
O pesquisador em Finanças da Ufrgs Lucas Mussoi, cuja pesquisa de doutorado se debruça sobre os criptoativos, sustenta que a criação da reserva estratégica de bitcoin se articula com as propostas econômicas e políticas internacionais de Donald Trump.
"A reserva de bitcoin está relacionada ao fato de a China possuir muitos títulos da dívida americana. Então, se os Estados Unidos pagarem os títulos da dívida, tiram esses títulos das mãos do governo chinês. Tem um componente geopolítico nessa medida devido ao Trump ser contra o domínio chinês, o embate entre essas duas superpotências e a taxação dos produtos chineses na tentativa de proteger o mercado norte-americano. O Bitcoin Act vai de encontro a todas essas políticas propostas por Trump", avalia Mussoi.
Além da reserva estratégica de bitcoin, Trump se comprometeu em criar regras regulatórias amigáveis ao setor de criptoativos e mudar as diretrizes da Securities and Exchange Comission (agência responsável pela regulação do mercado financeiro, análogo à Comissão de Valores Mobiliários no Brasil). As duas medidas estão interligadas.
Na gestão do presidente democrata Joe Biden, o órgão regulatório foi dirigido por Gary Gensler - que se tornou o inimigo número um da indústria de criptoativos, devido a cerca de 120 processos contra empresas desse setor. O presidente eleito dos Estados Unidos não só prometeu demitir Gensler no primeiro dia de governo, como também escolheu um substituto respeitado no mercado de criptomoedas. O escolhido foi Paul Atkins, diretor da consultoria Patomak Partners, que presta serviços a empresas que atuam no mercado financeiro e de criptoativos.
A escolha foi celebrada entre as empresas do setor. A expectativa é de que Atkins atenda às sugestões das companhias e promova uma regulação mais adequada às criptomoedas. De qualquer forma, o professor da FGV e o pesquisador da Ufrgs concordam que a reserva de bitcoin e a perspectiva de uma regulação mais amigável foram responsáveis pelo rápido aumento do preço do bitcoin.
"A expectativa de uma regulação mais amigável aos criptoativos e a adoção de uma reserva estratégica pela maior economia do mundo (EUA), onde a proporção das coisas é extremamente grande, empurrou o preço dos criptoativos para cima. Como o número de bitcoin é limitado a 21 milhões, o aumento da demanda aumentou o valor da moeda", explica Colombo.

Reserva de bitcoin pode gerar corrida por essa criptomoeda no mundo

Presidente de El Salvador Nayib Bukele instituiu a primeira reserva nacional de bitcoin no mundo

Presidente de El Salvador Nayib Bukele instituiu a primeira reserva nacional de bitcoin no mundo

/Presidencia de la República de El Salvador/Divulgação/JC
Alguns países - como El Salvador - já possuem uma reserva nacional de bitcoin (BTC), semelhante à que o presidente eleito Donald Trump pretende criar nos Estados Unidos. Mas a perspectiva de a maior economia do mundo criar uma reserva nacional dessa criptomoeda tem gerado um impacto maior em outros países, que já demonstram interesse em medidas similares. Inclusive, o Brasil já tem um projeto de lei tramitando na Câmara dos Deputados prevendo a criação de um fundo brasileiro.
Em 2021, o presidente de El Salvador Nayib Bukele instituiu a primeira reserva nacional de bitcoin no mundo. O país vinha comprando essa criptomoeda em diferentes quantidades, até que, em 16 de março de 2024, o país estabeleceu a política de comprar um bitcoin por dia. "Isso vai continuar até que o bitcoin seja inacessível com moedas fiduciárias", Bukele escreveu em sua conta na rede social X. Até o fechamento da reportagem, o país possuía 5.969 bitcoins.
O presidente do país localizado na América Central também divulgou no X os números da reserva nacional no dia 5 de dezembro, quando o bitcoin alcançou o valor de US$ 100 mil pela primeira vez. De acordo com o balanço, o país já gastou cerca de US$ 269,7 milhões na compra de bitcoins, o que havia rendido um lucro de US$ 333,5 milhões à nação até aquela ocasião.
Junto com a reserva nacional de bitcoin, o governo de Nayib Bukele aprovou uma lei obrigando os estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços a aceitar bitcoins como pagamento. O texto abria exceções para empresas e trabalhadores sem acesso a recursos tecnológicos financeiros. A medida gerou protestos em 2021.
Na tentativa de aumentar a adoção do bitcoin, o governo salvadorenho criou uma carteira digital oficial - a Chivo Wallet - um aplicativo que permite que a população receba bitcoins como pagamento, converta bitcoins em dólar e faça saques em mais de 200 caixas eletrônicos. Entretanto, segundo uma pesquisa divulgada em 2024 pela Universidade de San Salvador Francisco Gavidia, apenas 7,5% do povo salvadorenho utiliza BTC em pagamentos atualmente.
A principal razão para a resistência ao bitcoin é a volatilidade desse ativo. O próprio Fundo Monetário Internacional (FMI) alertou El Salvador sobre o caráter volátil da criptomoeda, o que representaria um risco para a economia local. Para se ter uma noção da variação desse ativo, basta comparar a valorização de 155,4% em 2023 com a desvalorização de 64,3% em 2022.
O professor de finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Jéfferson Colombo explica por que a criptomoeda é tão volátil. "O bitcoin tem uma natureza especulativa, porque é difícil encontrar um método para auferir o valor justo dele. Ele está muito suscetível ao sentimento das pessoas. Agora, nesse período de euforia, o preço sobe. Depois, teremos algum momento de pessimismo, e o preço vai descer. Temo que o tombo seja grande. Imagina a reserva de um país diante de uma queda significativa", pondera Colombo.
Apesar do risco inerente à volatilidade, os entusiastas do bitcoin - incluindo o presidente salvadorenho - acreditam que os ganhos de longo prazo compensam o risco. Entre 2011 e 2021, a média dos rendimentos foi de 154,7% por ano, segundo a consultoria norte-americana YCharts. O segundo investimento mais rentável nesse período foi a Nasdaq 100, com um ganho médio de 20% por ano. Nos últimos dez anos, a criptomoeda teve rendimento negativo em 2022, 2018 e 2014.
De qualquer forma, o professor da FGV acredita ainda que as discussões em torno da criação de reservas nacionais devem levar algum tempo ao redor do mundo. Além de o bitcoin ser um ativo recente, com um risco maior que outros investimentos, a sua adoção pode sofrer resistência de alguns setores financeiros tradicionais, que muitas vezes influenciam as decisões políticas dos governos. "Quando a gente fala sobre a adoção de reservas nacionais, acredito que o debate vai ser longo sobre o interesse social dessa medida", projeta o professor.
O pesquisador de criptoativos da UFRGS, o doutorando Lucas Mussoi, acredita que a reserva nacional de bitcoin deve se tornar uma tendência em outros países. Ele comenta que vários governos nacionais já mantém uma quantidade significativa de bitcoins, entretanto, em geral, ainda não têm um plano oficial para esses ativos. O maior detentor de BTC é os Estados Unidos (207.189 bitcoins), seguido pela China (194.000), Reino Unido (61.000), Ucrânia (46.351), Butão (13.029) e El Salvador.
“Acredito que a reserva estratégica de bitcoin deve ser adotada por outros países, mas talvez alguns países sem uma legislação específica ou com proibições para esses criptoativos vão manifestar alguma resistência quanto a isso. No entanto, no futuro, mudanças podem ser feitas em uma eventual mudança de governo”, destaca o pesquisador da UFRGS.
Mussoi acredita que a França e a Alemanha, países que venderam os bitcoins que possuíam, devem mudar sua postura em relação a esse criptoativo. Em dezembro, o ex-ministro das finanças da Alemanha Christian Lindner discursou no parlamento alemão, onde cobrou uma discussão em torno de uma reserva nacional de bitcoin.
Na Rússia, o uso de criptomoedas foi aprovado em dezembro e um projeto prevendo uma reserva de bitcoin está em tramitação. O Japão também estuda a criação de um fundo próprio. Países africanos, como a República Centro-Africana, adotaram o bitcoin como moeda oficial. Outras nações daquele continente cogitam um fundo com a maior criptomoeda do mundo.

Bitcoin tem conquistado cada vez mais investidores tradicionais

Lucas Mussoi, da Ufrgs, avalia que investidor dos EUA é mais tolerante ao risco, enquanto brasileiro ainda passa por processo de inclusão financeira

Lucas Mussoi, da Ufrgs, avalia que investidor dos EUA é mais tolerante ao risco, enquanto brasileiro ainda passa por processo de inclusão financeira

/Lucas Mussoi/Arquivo pessoal/JC
Após alguns anos circunscrito aos entusiastas das criptomoedas, o bitcoin (BTC) tem se tornado cada vez mais popular entre os investidores tradicionais. A aprovação dos ETFs (Exchange Traded Funds) para o bitcoin acelerou a popularização desse criptoativo em 2024. Além disso, a adoção institucional do BTC tem legitimado esse criptoativo entre os investidores mais conservadores.
Os ETFs são uma maneira mais confortável de investir em bitcoin. Nessa modalidade de investimento, o investidor não compra a criptomoeda em si, mas ações indexadas ao desempenho do BTC. É como comprar ações de uma empresa, mas, nesse caso, a empresa seria o bitcoin. Ou seja, em vez de os rendimentos das ações estarem ligados ao crescimento de uma empresa, estão ligados à valorização dessa criptomoeda.
Esse tipo de investimento permite que o mercado financeiro tradicional ofereça aos seus clientes alguma exposição à maior criptomoeda do mundo – sem que os investidores precisem se preocupar com o armazenamento seguro em uma carteira digital, os procedimentos digitais de compra e venda, ou outros aspectos tecnológicos relacionados ao manuseio dos criptoativos. Além disso, o oferecimento desse ativo em instituições convencionais, que obedecem a um marco regulatório consagrado, transmite maior segurança aos investidores.
Atualmente, o site Coinglass, que coleta dados relacionados às criptomoedas, lista 21 ETFs indexados ao bitcoin ao redor do mundo. O primeiro fundo dessa natureza foi lançado no Canadá em fevereiro de 2021. Alguns meses depois, o Brasil se tornou o segundo país a oferecer essa modalidade de investimento. Segundo a agência de notícias Cointelegraph, todos os ETFs brasileiros relacionados a criptomoedas receberam US$ 24,7 milhões (mais de R$ 150 milhões) em investimentos ao longo de 2024. Isso engloba não só os fundos que acompanham o valor do BTC, mas também os que incluem outros criptoativos.
Os órgãos regulatórios norte-americanos só aprovaram os primeiros ETFs de criptomoedas em janeiro de 2024. Hoje, existem 11 fundos indexados a criptoativos na maior economia do mundo. O maior é o Ishare bitcoin Trust, gerida pela gigante do mercado financeiro Blackrock, que alcançou um saldo positivo de US$ 34,8 bilhões até 11 de dezembro. Segundo o portal de notícias Bloomberg, esse ETF se tornou o terceiro maior dos Estados Unidos.
O professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Jefferson Colombo acredita que os ETFs ajudam a popularizar o investimento em bitcoin, porque eliminam a necessidade de conhecimentos tecnológicos relacionados à custódia das criptomoedas.
“O investimento em bitcoin tem um fator limitador: é perigoso para os usuários que não têm conhecimento da tecnologia, do manuseio (das carteiras digitais e das chaves virtuais). É mais para os nativos digitais, o pessoal mais libertário. Mas, no momento em que foram criados os ETFs, houve uma expansão bastante grande na adoção do bitcoin. No Brasil, eles estão entre os três ETFs com maior número de custódia”, analisou Colombo.
Ao analisar a expansão das criptomoedas, especialmente do BTC, o pesquisador da UFRGS Lucas Mussoi compara o perfil do investidor brasileiro com o norte-americano.
Quando olhamos para os Estados Unidos, os investidores têm uma tolerância ao risco muito maior. Quando olhamos para o Brasil, precisamos abordar a questão da inclusão financeira: se a pessoa tem uma conta no banco, se ela sabe o que é a bolsa de valores, se ela investe em algo além da poupança ou do CDB. O mercado brasileiro tem espaço para se desenvolver muito mais. Muitos investidores brasileiros estão colocando em bitcoin quantias mínimas, com as quais se sentem seguras, para terem alguma exposição a esse ativo”, relata.

Aposta no BTC pode atrair a atenção de investidores

Professor da FGV, Jéfferson Colombo afirma que megaempresas já adotam reserva de bitcoin nos seus portfólios

Professor da FGV, Jéfferson Colombo afirma que megaempresas já adotam reserva de bitcoin nos seus portfólios

/FGV/Divulgação/JC
Outro fator que pode aumentar a aceitação do bitcoin é a adoção institucional. O professor da FGV Jéfferson Colombo comenta que muitas megaempresas já adotam reservas estratégicas de BTC, em moldes similares ao que os governos nacionais estão considerando após a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos. “A reserva de bitcoin já é uma estratégia adotada pelo mundo corporativo, em empresas como a Microstrategy, Tesla, Mercado Livre, Square e outras”, exemplificou Colombo.
A Microstrategy Incorporated, empresa estado-unidense que fornece soluções inteligentes para outras companhias, ganhou os holofotes em 2024 devido à aquisição massiva de bitcoins. A companhia fechou o ano com mais de 439 mil unidades dessa criptomoeda. Isso equivale a cerca de US$ 43,9 bilhões, o que corresponde a mais da metade do capital da companhia (em torno de US$ 80 bilhões).
Apesar do aumento de empresas com investimentos em BTC, há exceções. Algumas megacorporações – como a Microsoft – tem se mantido cautelosas quanto ao investimento nesse criptoativo. Em dezembro, o conselho de acionistas da gigante tecnológica rejeitou uma proposta para a compra de bitcoins, sob o argumento de que essa criptomoeda ainda é muito volátil para compor o portfólio da companhia.
Mesmo que a adoção institucional do bitcoin não seja uma unanimidade, o número crescente de grandes empresas investindo nessa criptomoeda, a criação de uma legislação adequada aos criptoativos nos Estados Unidos e a instituição de uma reserva nacional de bitcoin durante o segundo governo de Donald Trump têm mantido essa indústria aquecida.
“Acredito que o aumento do preço (do BTC), a regulamentação amigável nos EUA e a adoção institucional vão expandir ainda mais esse tipo de investimento (em bitcoin)”, afirma Colombo.

Projeto defende criação de uma reserva de criptomoeda no Brasil

Deputado federal Eros Biondini (PL-MG) apresentou projeto estabelecendo que União invista 5% das reservas do País em bitcoins

Deputado federal Eros Biondini (PL-MG) apresentou projeto estabelecendo que União invista 5% das reservas do País em bitcoins

/Vinicius Loures/Câmara dos Deputados/JC
O deputado federal Eros Biondini (PL) apresentou no final de novembro um projeto de lei para a criação da Reserva Estratégica Soberana de Bitcoin (RESBit). A proposta prevê a aquisição de bitcoins até atingir o valor máximo correspondente a 5% das reservas internacionais do País. Ao final de 2024, as reservas internacionais brasileiras totalizavam US$ 360 bilhões. Se a matéria tivesse sido aprovada ainda em 2024, o governo teria que destinar US$ 18 bilhões para a compra dessa criptomoeda.
Conforme o parlamentar, a RESBit pode servir de lastro para o DREX, a moeda digital que está sendo desenvolvida pelo Banco Central, conhecida como "real digital". O DREX vai se manter pareado com o real, o que significa que um DREX deve custar sempre um real. "Incorporar bitcoins como parte das reservas do Tesouro Nacional reduzirá a exposição do Brasil a flutuações cambiais e riscos geopolíticos, ampliando a resiliência econômica", justifica Biondini.
Contudo, segundo o professor Jefferson Colombo, as criptomoedas não estão imunes a eventos geopolíticos ou crises financeiras, como pôde ser constatado após a pandemia de Covid-19, quando o bitcoin caiu 64,3%. Para Colombo, a reserva faz sentido se englobar um percentual pequeno de um portfólio, porque isso "reduz os riscos e aumenta o potencial de ganhos."
O deputado Biondini acredita que o País precisa integrar as criptomoedas ao seu sistema econômico. "O mercado de criptomoedas tem demonstrado expansão consistente", comenta. Em 2021, o valor total do mercado global de criptomoedas ultrapassou US$ 3 trilhões, segundo o site CoinGecko.

Rolante é a cidade gaúcha com maior aceitação de bitcoins como pagamento

Muitos visitantes são pegos de surpresa ao lerem as opções de pagamento: dinheiro, cartão, Pix e bitcoin

Muitos visitantes são pegos de surpresa ao lerem as opções de pagamento: dinheiro, cartão, Pix e bitcoin

/Acisa Rolante/Divulgação/JC
Os turistas podem se surpreender ao visitar as vinícolas, padarias, mercados e outros estabelecimentos comerciais em Rolante. A qualidade dos produtos coloniais e as belezas naturais não são os únicos atrativos do município gaúcho com cerca de 21 mil habitantes, localizado a 100 quilômetros de Porto Alegre. Muitos visitantes são pegos de surpresa ao lerem na vitrine das lojas as opções de pagamento: dinheiro, cartão, Pix e bitcoin (BTC).
Mais de 200 comerciantes colaram na fachada das suas lojas o adesivo indicando a aceitação do BTC como pagamento - o que representa cerca de 40% do comércio do município. Isso transformou Rolante na cidade gaúcha com maior adesão a essa criptomoeda. Mais que a capital do Rio Grande do Sul. Segundo o site BTC Map, que mapeia os locais que aceitam bitcoin no mundo, Porto Alegre possui apenas 115 estabelecimentos aptos a receber essa forma de pagamento.
O bitcoin se difundiu em Rolante graças ao projeto "Bitcoin é aqui", promovido pela Associação do Comércio, Indústria, Serviços e Agricultura (Acisa) de Rolante. A secretária executiva da Acisa, Sonia Kraemer, contou que o projeto surgiu após um grupo de entusiastas da criptomoeda utilizarem uma sala da entidade para uma reunião sobre criptoativos. Após a associação se interessar pelo BTC, a diretoria pediu que eles fizessem uma palestra sobre o tema para os associados da Acisa. Em poucos meses, centenas de comerciantes passaram a aceitar bitcoins.
"A gente incentiva as pessoas a utilizarem o bitcoin como moeda de pagamento. Não incentivamos o investimento nessa criptomoeda, porque isso demanda mais conhecimento. Então, se uma pousada recebe em BTC, a proprietária já vai ao supermercado para comprar mantimentos com os bitcoins que recebeu. Hoje essa criptomoeda funciona como uma segunda moeda no município, como se fosse dólar ou outra moeda", relata Sonia.
A secretária executiva da Acisa conta que, após a implementação do projeto, turistas de vários lugares do Brasil passaram a visitar a cidade. "Pessoas de outras cidades e outros estados vem até aqui por curiosidade. Elas querem ver para crer (que o bitcoin realmente é usado como moeda). Muitas vezes, os turistas vão ao mercado e compram qualquer coisa só para ter o prazer de pagar com bitcoins. Como estamos a 40 quilômetros de Gramado, um polo turístico, muitas pessoas passam alguns dias lá e depois vêm até aqui para usar essa criptomoeda".
Na prática, o pagamento em BTC nos estabelecimentos comerciais é parecido com o Pix. Basicamente, o cliente transfere o valor correspondente ao produto da sua carteira digital para a da empresa (essa carteira é um aplicativo responsável por guardar e transferir criptoativos). Devido ao alto valor do BTC, os produtos ou serviços custam uma pequena fração de um bitcoin, o que é conhecido como "satoshi".
"Primeiro, o cliente deve ter bitcoins na sua carteira digital no celular. A empresa usa o celular da empresa para gerar um QR Code com a ordem de pagamento. O cliente lê aquele código e os 'satoshis' são transferidos para a carteira digital do estabelecimento", detalha a secretária executiva da Acisa.
A deputada estadual Delegada Nadine (PSDB) considera o caso de Rolante um sucesso tão grande que apresentou um projeto de lei para dar o título de "capital estadual do bitcoin" para o município. Esse seria o terceiro título da cidade, que já é conhecida como "capital das cucas" e "terra do Teixeirinha". Parece que, por um lado, a cidade mantém suas tradições nas vinícolas e padarias; por outro, avança para o futuro com o bitcoin.

Entenda melhor o bitcoin

Criptomoeda saltou 59,6% em pouco mais de um mês

Criptomoeda saltou 59,6% em pouco mais de um mês

Pixabay/Divulgação/JC
O que é o bitcoin?
É a primeira criptomoeda, uma espécie de dinheiro digital, adotada massivamente no mundo. Ele foi criado em 2009 por uma pessoa ou equipe que usava o pseudônimo “Satoshi Nakamoto”. A ideia era criar uma forma confiável de transferir valores de pessoa a pessoa através da internet, sem a intermediação de uma instituição financeira, governo ou outra entidade.
O bitcoin se baseia em duas tecnologias: a criptografia (que codifica as transações de uma maneira segura e protege as informações dos usuários) e a blockchain (uma rede descentralizada de computadores que registram as transações num “livro de registros” aberto a qualquer usuário). Hoje, embora existam milhares de criptomoedas, o bitcoin domina em torno de 60% desse mercado.
O que é blockchain?
Blockchain é uma espécie de livro de registros, onde são listadas as transações financeiras com criptomoedas. Ao contrário do livro de registros de uma instituição financeira (acessível e controlado apenas pelos bancos), as blockchains oferecem um sistema de registro descentralizado (acessível a todos os usuários).
Esse livro de registros é dividido em blocos virtuais (blocks). Esses blocos são organizados em cadeias (chains). Cada bloco é rotulado com etiquetas criptografadas (as “hashs”). A criptografia impede que os dados sejam apagados ou modificados, além de manter em sigilo os dados dos usuários.
As transações através de blockchains são mais seguras por três razões. Primeiro, os dados das transações são imutáveis. Segundo, as informações são criptografadas. Terceiro, seria necessário hackear os milhões de computadores de uma blockchain para adulterar o seu funcionamento, o que é praticamente impossível. Em tese, a possibilidade de hackear o computador central de uma instituição financeira é muito maior.
Hoje em dia, a tecnologia blockchain tem sido aplicada não só em criptoativos, mas também em outras áreas, como rastreio de produtos em cadeias logísticas, registros de prontuários na área da saúde, sistemas de autenticação virtual e muitos outras aplicações. Esse método garante maior segurança a um custo menor.
Como funcionam os pagamentos com bitcoin e outras criptomoedas?
Uma transação tradicional é intermediada por uma instituição financeira. Por exemplo, se você quiser comprar um lanche com o cartão de crédito, o banco vai enviar o seu dinheiro para a lancheria (não é você quem transfere o dinheiro, diretamente). Após checar se a sua conta tem saldo suficiente para o pagamento, o banco envia o seu dinheiro para a lancheria e registra a transação no livro de registros (computadorizado) da instituição financeira.
Por outro lado, ao pagar um lanche com bitcoin, por exemplo, o pagamento é validado pela rede descentralizada de usuários da blockchain. É como se todos os usuários da blockchain verificassem se você tem saldo para fazer o pagamento à lancheria. Após chegarem a um consenso de que você tem bitcoins suficientes para o lanche, o pagamento é efetuado e registrado no livro de registros da blockchain. Imediatamente, todos os usuários recebem uma cópia atualizada desse livro, incluindo a transação recém realizada. Esse método não necessita de um banco para intermediar a transação.
Se, por exemplo, algum dos milhares de usuários tentar validar a transação de alguém que não tem bitcoins suficiente para o pagamento, os outros milhares de usuários podem excluir o indivíduo mal-intencionado. Os usuários que se dedicam à validação de transações na blockchain recebem bitcoins como pagamento, de modo que a validação correta é premiada com a criptomoeda mais valiosa do mundo. Esse processo é conhecido como “mineração de bitcoin.”
Por que o valor do bitcoin sobe cada vez mais?
O bitcoin tem uma quantidade limitada de moedas – 21 milhões. Essas moedas são colocadas em circulação gradativamente. As novas moedas começam a circular através dos usuários responsáveis pela validação das transações na blockchain, uma vez que eles recebem uma determinada quantia de bitcoins por cada bloco de transações validada.
Quando o BTC foi criado, cada bloco validado era recompensado com 50 bitcoins. Mas, a cada quatro anos, essa recompensa cai pela metade. Atualmente, a recompensa é de 3,125 bitcoins por bloco. A expectativa é que os últimos blocos sejam minerados em 2140.

Sobre o autor desta reportagem

* Marcus Meneghetti é jornalista formado pela Ufrgs. Pós-graduado em Artes da Escrita, pela Universidade Nova de Lisboa. Trabalhou como jornalista político por mais de oito anos. Atualmente, dedica-se ao mercado de criptoativos.

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