Porto Alegre,

Anuncie no JC
Assine agora

Publicada em 20 de Dezembro de 2024 às 16:52

Redução da jornada de trabalho: desafio ou oportunidade para empresas?

Kerlen Costa
Advogada da área Trabalhista e Gestão de RH do escritório SCA – Scalzilli Althaus

Kerlen Costa Advogada da área Trabalhista e Gestão de RH do escritório SCA – Scalzilli Althaus

Scalzilli Althaus/Divulgação/JC
Compartilhe:
Kerlen Costa
A discussão sobre a redução da jornada de trabalho ganhou espaço nas últimas semanas, especialmente com a proposta de emenda constitucional (PEC) que sugere reduzir as 44 horas semanais atuais para 36. Embora o tema pareça recente, trata-se de uma pauta antiga, defendida por diferentes espectros políticos, sindicatos e até pela igreja, há décadas.
A discussão sobre a redução da jornada de trabalho ganhou espaço nas últimas semanas, especialmente com a proposta de emenda constitucional (PEC) que sugere reduzir as 44 horas semanais atuais para 36. Embora o tema pareça recente, trata-se de uma pauta antiga, defendida por diferentes espectros políticos, sindicatos e até pela igreja, há décadas.
Desde a Constituição de 1988, quando passamos de 48 para 44 horas semanais, o Brasil já vivenciou momentos de ajustes legais significativos na relação entre tempo à disposição e produtividade. Essas mudanças trouxeram benefícios aos trabalhadores, sem causar o temido desemprego generalizado na época. Contudo, o contexto atual traz novos desafios que não podem ser ignorados.
A pandemia acelerou a transformação do mercado de trabalho, trazendo à tona modelos mais flexíveis e eficientes, como o programa internacional 4 Day Week, que experimentou jornadas reduzidas em grandes empresas de diferentes setores. Os resultados foram surpreendentes: aumento da produtividade, menor índice de burnout e maior qualidade de vida para os trabalhadores.
Porém, trazer essa realidade para o Brasil requer ajustes e análises detalhadas. A economia brasileira, baseada em setores com alta dependência de mão de obra, como o varejo e a indústria alimentícia, não é comparável à de países escandinavos. Aqui, a adaptação exige repensar processos, qualificar a força de trabalho e investir em tecnologias para garantir que a produtividade cresça enquanto o tempo de labor diminui.
Estudos revelam que um trabalhador brasileiro demora uma hora para realizar a mesma tarefa que um trabalhador americano efetua em 15 minutos. Essa diferença não está apenas na jornada de trabalho, mas na qualificação, no acesso à tecnologia e na eficiência dos processos. Assim, reduzir horas sem abordar esses gargalos pode criar uma falsa expectativa e, em setores como o de restaurantes e indústrias, gerar impactos financeiros substanciais.
A redução da jornada deve ser acompanhada por medidas de desoneração da folha de pagamento, incentivos para adoção de tecnologias e um período de transição que permita às empresas se adaptarem. O debate sobre o tema não pode ser apenas uma disputa entre "sim ou não", mas uma construção estratégica que beneficie trabalhadores e empregadores.
Se bem planejada, a redução da jornada pode transformar o ambiente corporativo, melhorando tanto o desempenho quanto o bem-estar dos trabalhadores. O desafio está em garantir que a transição ocorra sem prejudicar os pequenos negócios, que empregam grande parte da força de trabalho nacional.
Dessa forma, esse debate não deve se limitar a um número de horas. É uma oportunidade de rever a gestão de pessoas, otimizar processos e criar um ambiente mais eficiente e sustentável.
As empresas precisam, desde já, adotar uma postura estratégica, pensando não apenas no cumprimento da lei, mas em como transformar essa mudança em um diferencial competitivo. Afinal, produtividade não é sobre estar mais tempo à disposição, mas sobre entregar mais valor com inteligência.

Notícias relacionadas