Já enraizada na paisagem de Porto Alegre, a linha do aeromóvel localizada próxima ao Gasômetro não chegou a desenvolver todo o potencial que podia representar para o Município. No entanto, esse cenário pode mudar. O CEO da Aerom (detentora da tecnologia do veículo), Marcus Coester, adianta que será entregue em setembro para a prefeitura da capital gaúcha o estudo sobre a possível ampliação e uso do complexo. O empresário, que também é CEO da Coester Automação, acrescenta que, além de uma opção de mobilidade, a meta é criar naquela região da cidade um urban living lab (espaço onde são implantadas e testadas várias soluções tecnológicas e ações para o desenvolvimento da área de inovação).
Empresas & Negócios (E&N) - Há planos para retomar o projeto da linha do aeromóvel do Gasômetro?
Marcus Coester - Estamos respondendo a um PMI (Procedimento de Manifestação de Interesse) da prefeitura para revitalizar e ampliar a linha de Porto Alegre. Entregaremos os estudos em setembro. Será um urban living lab. A ideia é expandir mais uma estação para o lado da Avenida Mauá, próxima ao Tribunal de Contas, e a linha também será estendida para a zona Sul da Capital, acompanhando a orla do Guaíba. A linha total deverá ter cerca de 4 Km e hoje ela possui em torno de 1 Km.
E&N - Qual será o investimento nesta iniciativa?
Coester - Estamos em fase de estudos. O projeto engloba a praça do Gasômetro e áreas adjacentes. O que estamos propondo é que aquela região seja um distrito elétrico, uma área de alta sustentabilidade, que seja referência arquitetônica e de desenvolvimento para a cidade. Será como um corredor (de soluções e empreendimentos), quase um bairro. Vamos abordar toda a parte de sustentabilidade e energia renovável, é o conceito do living lab. É um equipamento de alta tecnologia, voltado à visitação, ao entretenimento, mobilidade na orla, mas também abrange a ideia de um laboratório urbano.
E&N - A iniciativa avançando, quanto tempo é necessário para expandir a linha?
Coester - Esse projeto permite várias implementações de curtíssimo prazo. Por exemplo, restaurar a operação da linha existente é muito rápido, talvez um pouco mais de seis meses. Mas há coisas mais complexas. Também faz parte a criação de um hub de tecnologia sustentável. Além disso, estamos propondo que uma escola municipal da região conte com programação pedagógica na área de sustentabilidade.
E&N - Qual é o principal diferencial do aeromóvel?
Coester - A propulsão pneumática é a grande inovação do aeromóvel. Ela veio em cima do que era um problema, que era como fazer um sistema em via elevada, eficiente, com baixo peso. Esse é o grande dilema no momento de sustentabilidade que vivemos hoje com as baterias (para veículos elétricos), porque são itens muito pesados. Na parte inferior, o aeromóvel tem uma viga de sustentação que também é um tubo oco onde se faz a pressão de ar. O carro, também na parte inferior, tem uma espécie de vela, como um barco a vela, que vai dentro do tubo. A disrupção do aeromóvel é que a sua força propulsora não tem nada a ver com o peso dele, separando o peso da potência.
E&N - Como está a implantação do aeromóvel no aeroporto de Guarulhos (SP)?
Coester - Em Guarulhos é um contrato em andamento. Foi uma concorrência internacional que vencemos por meio de um consórcio formado por quatro empresas (consórcio AeroGRU, integrado pela Aerom e pelas companhias HTB, FBS e TSEA). Já está em obra e deve ser concluído no final do próximo ano. São 2,7 mil metros, ligando os três terminais (do aeroporto) e o trem metropolitano, da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CTPM).
E&N - Qual é o investimento estimado no complexo em Guarulhos?
Coester - Cerca de R$ 270 milhões. É um sistema semelhante ao de Porto Alegre (no aeroporto Salgado Filho), mas maior, operando com dois veículos ao mesmo tempo.
E&N - Canoas também possui um projeto envolvendo a implantação do aeromóvel, mas que foi interrompido. Como ficou esse assunto?
Coester - Começou como uma questão política e hoje tem ali uma discussão jurídica com a cidade, de como vai ser a eventual continuidade ou não. Nós ficamos em uma situação difícil como fornecedor. De repente o projeto que a gente estava fornecendo se tornou uma discussão de campanha política. Nossa relação não é partidária, nossa relação é com a prefeitura. Essa situação toda foi muito desagradável, muito incômoda. Hoje, tem um imbróglio gerado ali pela discussão política que houve com a sucessão dos prefeitos. Mas, existe uma pendência judicial para saber qual o próximo passo desse projeto, se é a continuidade ou a rescisão. Atualmente, a obra está tecnicamente paralisada.
E&N - Na sua opinião, qual o futuro da mobilidade no planeta?
Coester - Será uma mobilidade elétrica, automatizada e de alta eficiência energética. Está claro hoje que não temos tecnologia para reverter o processo das emissões de carbono, não existe. O acordo de Paris é um acordo para reduzir o dano, para parar de aumentar, mas ele não reverte o dano das emissões que vem sendo feito há 150 anos e que chegou hoje a um limite grave. Vemos as consequências disso com as mudanças climáticas. A eficiência energética dos processos é uma das chaves, a gente vai ter que gastar menos energia e aí o aeromóvel é uma tecnologia que se destaca porque o consumo energético dele por passageiro é mais baixo do que outros sistemas, como metrô, VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) e ônibus.
E&N - Antes de surgir a Aerom e o aeromóvel, foi criada a Coester Automação, na década de 1960. Como nasceu a empresa?
Coester - Eu costumo dizer que a Coester é uma empresa spin-off da engenharia da Varig. Muito do nosso DNA, tanto na base tecnológica como na questão de valores da governança, veio da onde se conhecia. O meu pai (Oskar Coester, inventor do aeromóvel e fundador da Coester) entrou na Varig com 17 anos e sempre foi uma pessoa que teve uma base científica muito presente, na verdade um cientista-empresário, nessa ordem. E com essa vocação técnica, dentro do mundo da aviação, usando tecnologia de ponta e conhecendo o mundo, abriu-se uma baita oportunidade.
E&N - E como está o desempenho da companhia atualmente?
Coester - A Coester Automação é uma empresa que faz equipamentos e está indo muito bem. Estamos dobrando o tamanho da empresa em quatro anos, é uma companhia que está crescendo na base de 20% ao ano, pelo menos. Hoje, é uma empresa de R$ 60 milhões de faturamento. A Coester iniciou com equipamentos de comunicação, depois teve uma fase de equipamentos navais e hoje ela se dedica a processos automáticos na indústria e o grande mercado que atualmente está despontando é o de saneamento.
E&N - Então, a empresa vem mudando seus principais nichos de mercado?
Coester - Nos anos 2000, 70% (do faturamento) era oriundo do setor de óleo e gás, mas começamos a procurar diversidade, vendo o que estava acontecendo no mundo, buscamos novas oportunidades e observamos que o mercado de água no mundo todo era importante, mas não no Brasil. Contudo, agora com o marco regulatório do saneamento isso mudou. A empresa mais importante (para as vendas da Coester) ainda é a Petrobras, é a maior cliente individual, mas o setor de saneamento é atualmente 70% do faturamento.