Em um cenário climático favorável, os produtores de trigo do Rio Grande do Sul estão finalizando a semeadura da safra 2024/2025. E, apesar da redução de área plantada, a perspectiva é de uma colheita 55,2% maior que a do período anterior, chegando a cerca de 4 milhões de toneladas.
O volume corresponde a 45% da safra brasileira estimada pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), de 9 milhões de toneladas, quase 1 milhão a mais que a frustrada temporada passada. Levantamento da Emater-RS aponta que o plantio em solo gaúcho deverá ocupar 1.312.288 hectares.
Na semana passada, mais de 80% já haviam sido finalizados, chegando a quase 100% em regiões como Santa Rosa e Ijuí. Lá, inclusive, a estimativa de produtividade é de 3.287 quilos por hectare, superior à média geral esperada para o Estado, de 3,1 mil quilos.
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“Boa parte das áreas se encontra em fase de desenvolvimento vegetativo e com bons padrões, embora pontualmente haja desuniformidade na densidade das lavouras, por conta de dias sucessivos de chuva e da umidade. Mas, de modo geral, a cultura vem muito bem. E o frio é um fator positivo durante a fase de desenvolvimento do trigo”, diz o diretor técnico da Emater-RS, Claudinei Baldissera.
De acordo com ele, a queda de 12,8% na área plantada na comparação com o inverno de 2023 é justificada pelos riscos climáticos e pela frustração econômica da última safra. E o número final ainda pode cair mais.
É que nas regiões de Caxias do Sul, no Sul e na Campanha, a semeadura está atrasada. E em algumas áreas, como nos Campos de Cima da Serra, os produtores avaliam se mantêm ou desistem do plantio para não atrapalhar o da soja na próxima safra. Em outras, como em Bagé, a dúvida é se não devem trocar o trigo pela pecuária. O Zoneamento Agrícola de Risco Climático da cultura estabelece que o plantio no Rio Grande do Sul deve ser concluído até 20 de julho, com algumas exceções até o final do mês, para que os produtores possam acionar o seguro contra perdas causadas por circunstâncias ambientais.
Boa parte do atraso na semeadura se deveu às chuvas extremas de maio, que, além de impedirem a entrada das plantadeiras nas lavouras, causaram a deterioração das condições de solos, obrigando produtores a fazer uma recuperação dessas áreas, ressalta o analista de trigo da Safras & Mercado, Élcio Bento.
“Não é um atraso que obrigue o produtor a sair da janela (de semeadura), mas que pode impedir o melhor escalonamento das suas lavouras. Como temos um cultivo de risco de inverno, muitas vezes o produtor planta um pouco mais cedo e vai escalonando as vendas para evitar que algum episódio climático acabe prejudicando toda a lavoura de uma vez”, analisa.
Já a redução na área cultivada, de acordo com o analista da Safras, é explicada pelos maus resultados da safra passada e que comprometeu até mesmo a oferta de sementes para a atual semeadura. Bento acredita que com os preços atuais do cereal no mercado e a perspectiva de clima favorável, com transição de El Niño para La Niña, a intenção de plantio tenha sido maior que a disponibilidade de sementes.
Conforme a Central Internacional de Análises Econômicas e de Estudos de Mercado Agropecuário (CEEMA), os preços do trigo no Brasil permaneceram relativamente estáveis no início de julho. No Rio Grande do Sul, a média fechou em R$ 68,28 por saca de 60 quilos, enquanto os preços nas principais praças variaram entre R$ 67,00 e R$ 68,00.
Produção nos Estados Unidos e na Argentina pode rebaixar preços do cereal
Safra de inverno americana, que está em fase de colheita, pode pressionar preços do cereal no Brasil
WENDERSON ARAUJO/CNA/DIVULGAÇÃO/JCPorém, há um contexto internacional que coloca as cotações do cereal em risco de queda. Os Estados Unidos estão em colheita adiantada de sua safra de trigo e, segundo o Departamento de Agricultura (USDA), a indicação é de que a produção supere as expectativas iniciais. Os americanos devem produzir 54,6 milhões de toneladas do grão, 3,6 milhões de toneladas a mais que a projeção do mês de junho.
“Cerca de 70% da safra de inverno americana está colhida. A safra de primavera não começou a colheita. Mas ambas as safras são de boa qualidade, boas condições de lavoura. São as melhores condições de lavoura que a gente tem na safra de inverno, por exemplo, desde 2020. Não é uma grande produção, mas é uma produção maior que a do ano passado. E o ingresso dessa safra neste momento no mercado achata as cotações”, alerta o analista de trigo da Safras & Mercado, Élcio Bento.
Além disso, todo o hemisfério norte, que produz quase 90% do trigo no mundo, está colhendo agora. Porém, as condições climáticas estão complicadas na Europa e na região do Mar Negro, com sinalização de perdas de produção na Rússia, na Ucrânia e no continente, de um modo geral.
Esse contexto, avalia Bento, deve consolidar pressão sobre os preços neste momento. Mas ao longo do ano comercial, que vai de junho de 2024 até maio de 2025, a tendência é que cotações mais firmes em relação ao ano passado.
Outro ponto de atenção é em relação à safra argentina. Com ótimo desenvolvimento, depois de dois anos de fortes secas, o país vizinho caminha para uma produção recorde, com condições climáticas perfeitas até o momento. O USDA projeta uma colheita de 18 milhões de toneladas de trigo na Argentina.
O risco é a repetição do que aconteceu recentemente, com o La Niña provocando nova estiagem durante a formação das lavouras. A diferença, acrescenta Bento, é que nos dois últimos anos, o clima foi seco desde o início do plantio. "E agora os parâmetros de umidade são muito bons na região", finaliza.