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Entrevista especial

- Publicada em 27 de Março de 2022 às 11:00

Secretário de Mobilidade de Porto Alegre defende subsídios ao transporte público

O governo não pensa em fazer algum tipo de cobrança dos aplicativos, mas acreditamos que o sistema pode contribuir mais para a mobilidade urbana, afirma Castro

O governo não pensa em fazer algum tipo de cobrança dos aplicativos, mas acreditamos que o sistema pode contribuir mais para a mobilidade urbana, afirma Castro


fotos: ANDRESSA PUFAL/JC
O secretário de Mobilidade Urbana da Capital, Adão Castro Júnior - que assumiu o cargo neste mês -, acredita que são necessários subsídios para custear as gratuidades e descontos nas tarifas do transporte público. Ele citou como exemplo o projeto aprovado no Congresso que obriga o governo federal a pagar a passagem dos idosos com mais de 65 anos, que andam gratuitamente nos ônibus; e recursos da educação que estão sendo utilizados para financiar as passagens com desconto e a gratuidade de estudantes carentes.
O secretário de Mobilidade Urbana da Capital, Adão Castro Júnior - que assumiu o cargo neste mês -, acredita que são necessários subsídios para custear as gratuidades e descontos nas tarifas do transporte público. Ele citou como exemplo o projeto aprovado no Congresso que obriga o governo federal a pagar a passagem dos idosos com mais de 65 anos, que andam gratuitamente nos ônibus; e recursos da educação que estão sendo utilizados para financiar as passagens com desconto e a gratuidade de estudantes carentes.
Castro foi o responsável pela reforma do sistema de mobilidade urbana de Gravataí. "A primeira medida foi a redução da tarifa em R$ 1,05 - de R$ 4,80 para R$ 3,75. Isso proporcionou um aumento no número de passageiros imediatamente."
Em seguida, a prefeitura de Gravataí passou a pagar a viagem dos passageiros isentos. "A partir de janeiro deste ano, a prefeitura passou a pagar (para as empresas de ônibus) a passagem dos isentos. Isso proporcionou um volume maior de passageiros pagantes, o que permitiu a redução da tarifa."
No momento, Castro avalia se a diminuição das isenções e passes livres na Capital, junto com a extinção dos cobradores e isenção de impostos municipais, viabilizará a diminuição da passagem - como ocorreu na cidade vizinha. Por outro lado, também manifesta preocupação com o aumento do diesel, que pressiona a tarifa para cima.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o secretário de Mobilidade Urbana também defende a regularização do transporte por aplicativos, sem que isso implique a cobrança de alguma taxa. Ao mesmo tempo, pretende expandir a rede ciclovias em Porto Alegre e conectar a malha já existente.
Jornal do Comércio - Quando foi instalada na Assembleia Legislativa a comissão especial que estuda soluções para o transporte público metropolitano, a presidente do colegiado, deputada Patrícia Alba (MDB), disse que o caso de Gravataí era um exemplo. Poderia detalhar quais os principais problemas e soluções?
Adão Castro Júnior - De 2013 para cá, a crise no transporte público se instaurou por vários motivos, desde o mal atendimento até o preço alto da passagem. Isso fez com que o passageiro fosse a procura de outras formas de deslocamento. Entre 2013 e 2019, grande parte dos municípios perdeu em torno de 40% dos seus passageiros. Então, antes da pandemia, já existia uma crise. Tanto que as manifestações de 2013 iniciaram por causa do transporte. Em Gravataí, não foi diferente.
JC - A pandemia diminuiu mais o número de passageiros...
Castro - Com a pandemia, o agravamento da crise foi agudo, em 2020 e 2021. Tivemos uma redução drástica dos passageiros, por conta das restrições provocadas pela pandemia, pelo distanciamento social. Consequentemente, tivemos que encolher o atendimento ao público e o tamanho do sistema. Em Gravataí, depois de encolhermos o sistema, o atendimento ficou bastante precário, e a passagem evidentemente foi a um preço absurdo.
JC - Lá houve redução do preço da passagem. O que viabilizou a diminuição da tarifa?
Castro - Fizemos os mesmos movimentos que Porto Alegre vem fazendo, que é pagar parte do déficit (do sistema de transporte), custear parte dos passageiros isentos... No final de 2021, como secretário de Mobilidade de Gravataí, lancei um programa chamado Pro Coletivo, o que proporcionou um círculo virtuoso para o sistema. A primeira medida foi a redução da tarifa em R$ 1,05. Foi de R$ 4,80 para R$ 3,75. Isso proporcionou um aumento no número de passageiros imediatamente. Nos dois primeiros meses de 2022, o programa segue uma nova fase, focada na ampliação de rede (de ônibus), o que envolve aumento da frequência, das linhas, da frota, do atendimento à população. A próxima etapa do programa deve acontecer no próximo ano: a qualificação do sistema, com novos ônibus e novas estruturas.
JC - Teve algum tipo de subsídio para reduzir a tarifa?
Castro - Reduzimos a tarifa através do custeio das passagens dos isentos. A partir de janeiro deste ano, a prefeitura passou a pagar (para as empresas de ônibus) a passagem dos isentos (como idosos). As gratuidades representavam 40% das passagens. Pagando a passagem do isento, isso proporcionou um volume maior de passageiros pagantes (para as empresas), o que proporcionou a redução da tarifa. Afinal, o custo passou a ser dividido por um número maior de pagantes.
JC - Os passageiros isentos, como os idosos e pessoas em vulnerabilidade social, continuaram tendo o direito de andar de ônibus gratuitamente?
Castro - O passageiro isento não perdeu a gratuidade, ninguém perdeu. Apenas a prefeitura passou a comprar a passagem para ele, pagamos (para as empresas de ônibus) a passagem dele.
JC - Gravataí passou a pagar para as empresas de ônibus a passagem dos isentos, o que injetou dinheiro no sistema e preservou a gratuidade para parte da população. Em Porto Alegre, metade das isenções municipais foi extinta. Ou seja, muitos passageiros que não pagavam a passagem passaram a pagar, injetando novos recursos no sistema. As duas cidades geraram mais receita para o sistema: Gravataí, com dinheiro público; Porto Alegre, com dinheiro do passageiro. Por que a Capital não baixa a tarifa?
Castro - Estamos debruçados sobre o tema, avaliando todas essas reduções que ocorreram. Em Porto Alegre, saímos de 14 isenções para sete. (Entre essas sete) lembramos que o idoso de mais de 65 anos ainda é um usuário isento (conforme previsto em lei federal). Inclusive, o prefeito Sebastião Melo (MDB) tem feito um esforço, junto à Frente Nacional de Prefeitos, para que o Congresso aprove o PL 4.393, que já foi aprovado no Senado e está na Câmara dos Deputados, para que haja um custeio do idoso com recursos federais. Hoje essa isenção está sendo bancada pelo passageiro que paga na roleta. Nada contra o usuário idoso, mas, como é uma lei federal, entendemos que o governo federal deveria custear isso, não o município. Temos ainda o estudante (cuja isenção só é concedida àqueles que possuem renda familiar per capita abaixo de R$ 1.650,00), que está sendo custeado com recursos da educação. É um fundo de cerca de R$ 25 milhões que vai custear praticamente 100% dos estudantes. Ainda temos os estudantes com desconto de 25%, 50% e 75%. Mas os recursos da educação custeiam esses usuários, em um modelo parecido com o de Gravataí.
JC - Além da redução das isenções, a prefeitura está buscando financiar duas das principais isenções que ainda existem, a dos estudantes e a dos idosos acima de 65 anos. O governo reduziu pela metade os dias de passe livre (de 12 para seis), isentou as empresas de ônibus dos impostos municipais e iniciou o processo de extinção dos cobradores. Em tese, a Capital reduziu os custos mais do que Gravataí. Isso não deveria garantir uma diminuição significativa da tarifa?
Castro - Olha, não posso me atrever a afirmar isso. Nesse momento, estamos avaliando essas medidas e em que tempo elas estão realmente acontecendo. Muitas delas são previsões de incremento que, muitas vezes, não se concretizam. Então, não poderia afirmar que só essas (medidas) são suficientes para manter ou reduzir (a tarifa). Agora, estamos trabalhando para avaliar qual é o impacto positivo que essas ações terão, seja o cobrador, que temos um prazo até 2025 para a retirada dele; seja as 14 isenções que agora passaram a ser sete; seja o custeio do estudante através de recursos da educação. Além disso, é difícil comparar o sistema da Capital com Gravataí. Nosso trabalho é como uma balança: de um lado, criamos ações que trazem um efeito positivo no custo e na tarifa; de outro lado, ampliamos o atendimento de uma linha que, muitas vezes, é deficitária. Isso pode trazer um custo negativo para o sistema. Por exemplo, no dia 14, aumentamos a oferta (de ônibus) aos usuários, porque a população pede mais ônibus na rua, em horários mais tarde, noite, madrugada. Temos atendido na medida do possível, porque, quanto mais ônibus rodarem com baixa lotação, maior é o impacto negativo.
JC - Porto Alegre tem uma das passagens mais caras do Brasil. Qual a característica do sistema de transporte local que faz a tarifa ser tão alta?
Castro - Historicamente, existia um número grande de isenções. Em outros municípios, não havia tantas. Além disso, muitas cidades que têm a tarifa mais barata já vêm custeando (o sistema), botando um grande volume de recurso para manter a tarifa no mesmo patamar ou até mesmo baixá-la. Agora, vale lembrar que estamos com a tarifa congelada desde 30 de junho de 2021. A prefeitura tem segurado o aumento com algum tipo de aporte para cobrir o déficit tarifário. No ano passado, foram R$ 103 milhões para manter a tarifa em R$ 4,80.
JC - E a inflação passou de 10% em 2021, e a gasolina disparou...
Castro - Cerca de 25% do custo da tarifa é o combustível. O custo da mão-de-obra incluindo motoristas, cobradores, mecânicos e administradores, representa 45%. Esses são os dois maiores custos.
JC - O preço do combustível assusta?
Castro - Sim, se considerarmos o histórico, em um ano, talvez tenhamos tido mais de 60%, 70% de aumento do diesel. Agora, tivemos esse anúncio da Petrobras, do arrefecimento do aumento nos últimos dias. De qualquer foram, isso realmente impacta muito negativamente no custo do sistema.
JC - O que o senhor pensa sobre os aplicativos? Devem ser regulamentados?
Castro - O transporte por aplicativo caiu na graça da população, porque é de porta a porta e tem um preço bastante razoável. Mas ele precisa ter o mínimo de regularização para que possa contribuir positivamente na mobilidade urbana, no deslocamento das pessoas, para servir com segurança. Não estou falando de taxa. O governo não pensa em fazer algum tipo de cobrança dos aplicativos. Mas acreditamos que o sistema pode contribuir mais para a mobilidade urbana. Deslocamento de massa feita por automóveis não contribui para uma mobilidade inclusiva, porque é mais caro, cria mais custo para o município, por causa da maior manutenção do sistema viário (causado pelo aumento do tráfego), do engarrafamento e da poluição. Nesses pontos, o transporte por aplicativo acaba sendo negativo. Deslocamento de massa precisa ocorrer através de um sistema de transporte coletivo, que seria o ônibus, no nosso caso.
JC - Se a ideia não é cobrar taxa, como seria a regulação?
Castro - O transporte por aplicativo poderia entrar como uma espécie de transporte por demanda, ao qual ele poderia trazer os passageiros para um sistema troncarizado de ônibus, que, por sua vez, deslocaria o passageiro por um trajeto maior. Muitas vezes, isso já está acontecendo de foram natural: a pessoa pega um ônibus, faz o seu trajeto maior, pagando R$ 4,80 que é a tarifa atual; depois, próximo a sua residência, ela desce na sua parada, e pega um Uber até a sua casa. Isso acontece com taxi também. Mas, claro, isso não está regulado, está acontecendo de forma orgânica, natural. Com o mínimo de organização, os aplicativos poderiam contribuir mais com o deslocamento das pessoas. Mas ainda não temos um modelo, uma definição sobre isso.
JC - E sobre as bicicletas? Há previsão de ampliar as ciclovias?
Castro - A secretaria está debruçada em ter um sistema cicloviário seguro para as pessoas. Hoje temos 38 quilômetros de novos trechos para implantar, que já está na fase de projeto. Ao mesmo tempo, queremos olhar o sistema existente, com o objetivo de fazer as conexões que não foram implantadas. Não estou fazendo uma crítica ao que está implantado, mas uma observação. Muitas vezes, se aproveita uma obra em uma determinada via para implantar uma ciclovia, já aproveita a ocasião para incluir uma ciclovia no projeto. Então, se aproveita a obra que vai acontecer (para fazer a ciclovia), mas muitas vezes não se pensa na conexão (com outras ciclovias). Porto Alegre é uma das cidades com um maior volume de ciclovias, ciclofaixas, ciclorrotas e espaços para bicicletas no Brasil. São aproximadamente 50 quilômetros. O micro deslocamento é importante para pensar a mobilidade. É o caso do ciclista que saiu do bairro, foi até um ponto, botou sua bicicleta em um bicicletário, pegou um ônibus e veio ao Centro. Nossa visão é totalmente positiva quanto aos espaços para as bicicletas. Precisamos olhar a questão da segurança (do ciclista), as conexões (entre as ciclovias) e, evidentemente, a ampliar a rede.

Perfil

Adão de Castro Júnior nasceu em Porto Alegre em 13 de maio de 1966, mas logo sua família se mudou para Cachoeirinha. Entretanto, tem vivido pelos últimos 20 anos em Gravataí. Estudou os ensinos Fundamental e Médio em Cachoeirinha e Gravataí. Iniciou sua carreira na área de Segurança no Trânsito em 2000, em um centro de formação de condutores, onde atuou como instrutor. Em 2009, graduou-se em Gestão de Trânsito e Transporte, na Ulbra, em Canoas. A partir dos anos 2010, tornou-se professor do Instituto de Desenvolvimento Cultural (IDC) e do Senac , em Porto Alegre, no curso de pós-graduação em Gestão e Segurança. Ocupou um cargo técnico na Câmara Municipal de Gravataí em 2010, no mesmo ano que se filiou ao PSB. Em 2013, no início da gestão do ex-prefeito Marco Alba (MDB, 2013-2020), assumiu a Secretária Municipal de Mobilidade Urbana, cargo que ocupou até o início deste ano, quando deixou o posto para assumir a mesma pasta na gestão do prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB). Durante o período como secretário de Mobilidade de Gravataí, filiou-se ao MDB. Também é sócio da empresa Serviços de Consultoria, Assessoria e Planejamento em Trânsito Ltda. Preside a Associação Nacional de Fabricantes de Simuladores Profissionais.