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gestão pública

- Publicada em 16 de Agosto de 2021 às 20:27

Cresce resistência à privatização da Corsan

Propostas do governo para reestruturar a gestão dos serviços da Corsan foram encaminhadas em regime de urgência à Assembleia Legislativa

Propostas do governo para reestruturar a gestão dos serviços da Corsan foram encaminhadas em regime de urgência à Assembleia Legislativa


/JOÃO PAULO FLORES/DIVULGAÇÃO/JC
Em audiência pública realizada nesta segunda-feira (16) para analisar os dois projetos do governo do Rio Grande do Sul para autorizar a regionalização e privatizar os serviços da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), a Comissão de Assuntos Municipais da Assembleia Legislativa acolheu os pedidos de prefeitos, especialistas e gestores da companhia para que o Palácio Piratini retire o pedido de urgência das matérias.
Em audiência pública realizada nesta segunda-feira (16) para analisar os dois projetos do governo do Rio Grande do Sul para autorizar a regionalização e privatizar os serviços da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), a Comissão de Assuntos Municipais da Assembleia Legislativa acolheu os pedidos de prefeitos, especialistas e gestores da companhia para que o Palácio Piratini retire o pedido de urgência das matérias.
A manifestação de todas autoridades presentes na audiência foi na mesma linha: para uma proposta tão complexa, que interfere em um direito primário como o saneamento básico e acesso à água potável, atingindo tantos municípios gaúchos, é necessário mais tempo.
Tanto a Federação das Associações de Municípios (Famurs) quanto o Ministério Público (MP) e o Tribunal de Contas do Estado (TCE), assim como os deputados participantes da audiência online, foram unânimes em alertar que a urgência na votação é incompatível com a complexidade do tema. Em especial, alertaram que a repercussão de aspectos jurídicos poderão resultar em ações contra os prefeitos.
O promotor de justiça do MP Maurício Trevisan informou que o assunto é tema de estudo da instituição, tanto no âmbito federal quanto no estadual. Segundo ele, "a compreensão adequada das consequências e sobreposições que possam estar acontecendo se torna dificultada em função do prazo reduzido para o debate". Trevisan lembra que outro projeto, que tramita em regime normal, trata das regiões que não estão previstas no texto em urgência. Ele também observou a insegurança jurídica que a regionalização gera aos prefeitos, uma vez que às Câmaras de Vereadores não será dado o direito de legislar sobre o tema.
O deputado Tiago Simon (MDB), que solicitou a audiência, lamentou a ausência do governo neste primeiro debate sobre os dois projetos que tramitam na Assembleia. Disse que o que está em debate é o futuro do saneamento e da água no RS, e não apenas o da Corsan. Com o depoimento, revelou o desconforto da bancada do MDB com o "atropelamento" do tema pelo governo do qual faz parte enquanto base no legislativo.
Simon observou que faltam informações técnicas para sustentar o projeto de regionalização, que cria um bloco de 307 municípios que perdem as prerrogativas atuais sobre o saneamento: "estamos vendo um modelo de definição da política de saneamento até 2060 que não atende os interesses dos usuários, dos municípios e das regiões, mas à vontade de geração de receitas do governo do Estado", resumiu. Mesmo favorável às privatizações, o deputado defendeu o debate das matérias e encaminhou, ao final da audiência, o pedido unânime das entidades para que o governo retire o pedido de urgência.
Presidente da comissão, o deputado Eduardo Loureiro (PDT) também alertou que a pressa imposta pelo governo sobre um tema complexo e com repercussão negativa nos municípios não pode excluir a sociedade civil do debate.
Também o deputado Jeferson Fernandes (PT) argumentou em favor do debate e alertou para os riscos de o Estado representar mais o poder concedente do que os municípios, assim como a fragilidade em que ficarão os municípios menores. Ele criticou o que define como tática do governo de impedir o debate público mediante pedidosde urgência.

Insegurança jurídica dos processos de regionalização e desestatização preocupa prefeitos

Uma das preocupações do prefeitos gaúchos é a insegurança jurídica que o processo de provatização pode gerar para os gestores municipais. O ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Pedro Henrique Poli de Figueiredo explicou que a preocupação do governo com a privatização da Corsan determinou a escolha da regionalização, que se tornou um instrumento para a desestatização quando, segundo ele, deveria ser primeiro a regionalização e, posteriormente, a desestatização.
"Do ponto de vista formal, o projeto não teria problemas em termos de desestatização. O que há é a possibilidade de transferência de ações para os municípios, que alcança 6% das ações da companhia, quando em outras iniciativas, como na Companhia Estadual de Água e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), essa participação chegou a 15%", informou.
Outra questão é a responsabilidade dos prefeitos, que é o representante do titular do serviço público de água e saneamento, tido por essencial, do ponto de vista dos direitos humanos, de proteção constitucional: "isso gera responsabilidade que pode efetivamente ser cobrada mais adiante", afirma Figueiredo. Ele referiu que o compartilhamento de um interesse local em formato regional pode esbarrar em entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito de responsabilidade compartilhada em regiões metropolitanas, uma vez que o estado não pode ficar com a maioria do poder e deixar de lado os municípios. "Com responsabilidade compartilhada, não pode haver predominância de apenas um ente. O protagonismo deve ser de todos os entes, e os projetos de lei de regionalização retiram do município o poder relacionado às suas decisões", afirmou o ex-conselheiro do TCE.
Outro especialista ouvido pela audiência foi o economista Ricardo Hingel, que discorreu sobre estudo a respeito da operação de privatização da Corsan e classificou o projeto como "inconsistente do ponto de vista do mercado de capitais", apontou a pressa do governo em aprovar o tema, disse que a avaliação é se a Corsan é viável para atingir o que define o Marco do Saneamento e se tem alternativa que não seja a venda pulverizada, modelo que ele não vê sentido em ser adotado.
Ex-presidente da Corsan, Flavio Presser também argumentou pela retirada do pedido de urgência e pela busca de consenso entre prefeitos para a regionalização. Alertou para possíveis impactos futuros na tarifa e destacou o exemplo de Minas Gerais, onde as regiões metropolitanas foram respeitadas e houve debate prévio com os prefeitos antes de os projetos serem enviados ao Legislativo.