Projeto para Centro Histórico de Porto Alegre sai até agosto, diz secretário Bremm

Proposta do governo modifica Plano Diretor do Centro histórico de Porto Alegre

Por Marcus Meneghetti

"Estamos trabalhando na transição digital, desburocratização e preparação da cidade para o futuro"
O secretário municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade, Germano Bremm, pretende encaminhar - até o início de agosto - o projeto que modifica o Plano Diretor do Centro histórico. O texto, que cria o Programa de Reabilitação do Centro Histórico, propõe uma série de incentivos e mudanças nas regras das edificações, com o objetivo de atrair investimentos para a restauração de prédios abandonados e a conversão de prédios comerciais em residenciais.
"Com uma política de incentivos e a utilização de instrumentos urbanísticos, como o Plano Diretor, criaremos um espaço adequado, em que o próprio mercado vai respondendo, vai comprando (os espaços). Vai ser do interesse dele a revitalização dessas edificações, porque será possível transformá-las em residenciais", projeta Bremm.
O titular do Meio Ambiente comentou sua permanência no governo de Sebastião Melo (MDB), depois de participar da gestão Nelson Marchezan Júnior (PSDB, 2017-2020). Para Bremm, ele é a prova de que Melo quer "aproveitar aquilo que está bom, não começar do zero".
O secretário sustenta que a principal tarefa da pasta, atualmente, é agilizar o processo de licenciamento para novos empreendimentos. Ele conta que o processo de licenciamento e fiscalização - antes feito em mais de uma secretária - agora é realizado em uma única pasta. Entretanto, não vê conflito de interesses no fato de a mesma estrutura que busca agilizar o licenciamento ser encarregada da fiscalização.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Bremm revela ainda que se preocupa com possíveis efeitos da Mina Guaíba em Porto Alegre, mas confia nos órgãos de licenciamento estadual, responsáveis por analisar o megaempreendimento. Ao comentar sobre o uso de agrotóxicos no Estado, afirma que o mundo caminha para a produção de alimentos orgânicos.
Jornal do Comércio - O senhor é o único secretário que permaneceu da gestão anterior. O governo Melo pode ser visto como continuação da gestão Marchezan?
Germano Bremm - O perfil do prefeito é muito conciliador e, como já foi vereador, vice-prefeito e deputado estadual, conhece muito bem a estrutura administrativa. Um dos motivos que me fez aceitar o convite para permanecer é essa visão de aproveitar aquilo que está bom, não começar do zero. Não vamos inventar a roda, vamos fazer a roda girar. Eu, por ter permanecido na gestão, sou uma prova disso. Quando me convidou, tive um diálogo muito franco, no qual ele deixou claro que quer dar continuidade às coisas boas, me dando toda a tranquilidade para conduzir os projetos que ele entende positivos para a cidade.
JC - Pode dar um exemplo desses projetos?
Bremm - Sim, o projeto de revisão do Plano Diretor. É o nosso maior projeto na secretaria. Houve todo um planejamento e captação de recursos (na gestão anterior). Tivemos que suspender o processo por conta da pandemia, mas vamos dar continuidade a esse processo ao longo da gestão do prefeito Melo.
JC - Essa continuação é em relação ao cronograma de audiências públicas? De qualquer forma, a atual gestão teria que fazer a revisão do Plano Diretor porque está prevista na lei nacional.
Bremm - Sim. Mas, para executar o projeto, as participações populares, as discussões, a leitura comunitária, a leitura técnica que a revisão do Plano Diretor exige, é necessário um planejamento prévio, contratações. Poderia chegar um novo governo e dizer: "não, o que vamos fazer não vai ser dessa forma, não são essas as diretrizes que a gente quer". Em vez de começar do zero, nós (do governo Melo) vamos aproveitar o que já vinha sendo construído.
JC - O que acontece no processo de revisão, de agora em diante?
Bremm - Vamos executar o cronograma de revisão ao longo de dois anos. Em agosto, retomaremos o processo participativo. Esperamos que a pandemia diminua, cada vez mais. Estamos em vias de firmar a carta-corpo, que é um modelo de cooperação com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). Ainda tem um último ponto que estamos ajustando, mas pretendemos assinar ainda no mês de julho. Talvez, ao final de dois anos, tenhamos que reprogramar um pouquinho. Mas, em princípio, deve ser finalizado em 2022, quando enviaremos a proposta à Câmara. Nesse um ano e meio, queremos fazer todos os processos administrativos, as audiências públicas, as sessões técnicas, a leitura da cidade, tudo que exige a revisão do Plano Diretor.
JC - O projeto iria para a Câmara na metade 2023...
Bremm - É, no cronograma de dois anos, seria na metade de 2023. Claro, a gente publicizou uma programação até o final de 2022. A gente ainda não tocou essa programação. Mas isso vai ser reavaliado agora, com o ingresso da Ufrgs no processo. Vamos tentar manter o envio para 2022.
JC - Uma das medidas do prefeito, no que diz respeito ao Plano Diretor, foi designar o ex-vereador Reginaldo Pujol (DEM) para tratar desse tema. Onde ele entra nessa discussão?
Bremm - O Pujol é um político extremamente habilidoso, experiente na vida pública de Porto Alegre. Ele foi designado para ser o assessor especial do prefeito, no processo de revisão. Então, (vai) ajudar nessa articulação com a sociedade, com a Câmara. Toda essa costura política necessária para que, quando o plano chegue na Câmara, já esteja o máximo possível ajustado e contornado com os vereadores.
JC - O prefeito pediu um projeto específico para o Centro Histórico. Como está isso?
Bremm - Estamos estruturando a minuta para apresentá-la, no início de julho, ao Conselho do Plano Diretor; e, no final do mês, em uma audiência pública. No início de agosto, devemos enviar à Câmara o projeto que denominamos Programa de Reabilitação do Centro Histórico.
JC - Qual a ideia para a região central?
Bremm - Qual a maior dificuldade do Centro Histórico nos últimos anos? Ele vem perdendo população, porque é uma área mais comercial, além da degradação e do abandono. A pandemia maximizou muito isso, porque, com o e-commerce e trabalho remoto, as empresas e lojas tão entregando (os imóveis). Hoje tem muitos espaços ociosos. Então, o que temos que fazer com o Centro? Trazer de volta a população. Como? Criando uma política de incentivos urbanísticos, alterando as regras que inviabilizam a transformação natural do comercial para o residencial.
JC - Como levar as pessoas de volta ao Centro Histórico? Através da revitalização de prédios abandonados, por exemplo?
Bremm - Isso. Com uma política de incentivos e a utilização de instrumentos urbanísticos, como o Plano Diretor, a gente cria um espaço adequado, em que o próprio mercado vai respondendo. Ele vai comprando... Vai ser do interesse dele a revitalização dessas edificações, porque será possível transformar em residencial. A gente flexibiliza a questão dos recuos ali... Então, a gente cria um modelo econômico que os empreendedores vão começar a apostar novamente no Centro.
JC - Como está a questão do licenciamento?
Bremm - O grande trabalho da nossa secretaria é tentar estruturar o licenciamento. O prefeito foi muito feliz ao unificar as estruturas do urbanismo, meio ambiente e licenciamento em uma única pasta. Não há dúvidas que isso vai se refletir muito em melhorias no processo, porque tem uma unidade de pensamento. E é realmente desafiador, porque a indústria da construção civil impacta muito na cidade. Para ter uma ideia, nos cinco primeiros meses de 2021, aprovamos R$ 3,3 bilhões de investimentos nesse setor. Estamos trabalhando, em um licenciamento em três pilares: transição digital, desburocratização e preparação da cidade para o futuro. Hoje o licenciamento é distribuído assim: 61% são demandas de baixo impacto (ambiental); 37%, de médio impacto; e 2%, de alto impacto. A partir dessa noção de grandeza, a gente vem trabalhando em ações para solucionar, primeiro, os casos de baixo impacto. Nesse sentido, criamos o modelo de licenciamento expresso, que é autodeclaratório, o autolicenciamento, como é conhecido. Está funcionando muito bem, o processo dura, em média, 25 dias. Resolvendo a entrada dos projetos de baixo impacto, vamos trabalhar os de médio e alto.
JC - E quanto à digitalização do processo de licenciamento?
Bremm - Estamos em um modelo de transição, do físico para o digital. São mais de 240 serviços disponíveis no formato digital. Claro, como estamos em uma transição, ocorrem algumas dúvidas, equívocos. Hoje a entrada e a saída do licenciamento estão totalmente digitalizadas. Por exemplo, não existe mais impressão no papel, o atendimento é online, o plantão é online, a pessoa não precisa mais sair de casa. Ainda há alguns processos físicos, mas esperamos até o final do ano ter grandes melhorias.
JC - O senhor mencionou a unificação de várias funções na pasta da qual é titular. Hoje, a mesma secretaria que faz o licenciamento é a que fiscaliza o empreendimento depois?
Bremm - Sim.
JC - Não há conflito de interesses nesse processo?
Bremm - Não, não, sempre foi, dentro do município, sempre foi a Secretaria de Urbanismo, a fiscalização sempre esteve vinculada a...
JC - A Secretaria do Meio Ambiente...
Bremm - É, antes tinha a Secretaria do Meio Ambiente... A fiscalização ambiental era da Secretaria do Meio Ambiente. A parte do urbanismo e do licenciamento era na Smurb (Secretaria Municipal de Urbanismo). A fiscalização era na Smurb também. Então, hoje está dentro dessa mesma estrutura. O governo está tentando melhorar esse processo, criando o escritório de fiscalização, vinculado à Secretaria da Segurança. É um processo que busca otimizar as estruturas do município, como a Secretaria de Segurança, a Guarda Municipal, que têm o poder de polícia. Então, existe a tentativa de organizar todas as fiscalizações do município em uma estrutura. Já há o escritório de fiscalização, tem uma pessoa que lidera o escritório, embora legalmente as estruturas de fiscalização ainda estejam vinculadas a cada uma das secretarias. Mas, operacionalmente, estamos trabalhando de forma conjunta.
JC - Um assunto que tem gerado polêmica na Capital é a instalação da Mina Guaíba, a menos de 20 quilômetros do Centro de Porto Alegre. O senhor se preocupa com eventuais impactos?
Bremm - Sem dúvida. Quando se levanta a possibilidade de ter algum efeito em Porto Alegre, a gente fica apreensivo, como todos os cidadãos. Como secretário do Meio Ambiente, se porventura tiver algum problema com relação a Porto Alegre, algum impacto, vamos tentar compor junto ao órgão responsável. Vamos tentar mitigar, minimizar, enfim, as avaliações devem ser feitas. Mas eu confio muito nos processos, na análise técnica dos órgãos competentes. Nesse caso, a competência para fazer a avaliação ambiental é da Fepam (Fundação Estadual de Proteção Ambiental).
JC - Os deputados gaúchos derrubaram a proibição aos agrotóxicos que não são liberados nos países de origem. Entre 2014 e 2017, foram detectados 27 agrotóxicos na água que abastece os porto-alegrenses. O que o senhor pensa sobre o uso de agrotóxicos no Rio Grande do Sul?
Bremm - O mundo caminha no sentido da produção natural, sem agrotóxicos. A gente que mora em Porto Alegre não tem essa experiência com relação a agrotóxicos e o próprio licenciamento dessas áreas, porque não tem áreas agrícolas muito grandes. É um pouco complexo entrar nesse assunto em relação ao Estado. Mas a produção sem agrotóxico é uma diretriz ambiental universal, que está acontecendo no mundo. Por exemplo, em Porto Alegre, estamos tentando organizar as hortas comunitárias, fomentando o desenvolvimento das hortas orgânicas. O mercado demanda essa necessidade mais orgânica e natural.
JC - Porto Alegre teve vários pioneiros do ambientalismo. Um dos maiores do País, José Lutzemberger, foi um dos fundadores de uma das primeiras entidades da América Latina, a Agapan (Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural). O que pensa do legado do movimento ambientalista na Capital?
Bremm - Não há dúvidas, a grande quantidade de áreas verdes na cidade é reflexo dessa organização, desse pioneirismo, da criação da primeira Secretaria do Meio Ambiente do País (na gestão do prefeito Guilherme Socias Villela, PP, 1975-1983). Isso possibilitou que tivéssemos esse diferencial em relação às outras cidades brasileiras, que são as áreas verdes. Sabendo utilizar esse potencial, a gente consegue se credenciar para ser uma cidade do futuro.

Perfil

Germano Bremm nasceu em 13 de março de 1986, em São Pedro do Butiá, na região das Missões. Aos 16 anos, mudou-se para Porto Alegre. De 2003 a 2005, trabalhou no gabinete do vereador Isaac Ainhorn (PDT, falecido em 2006) em um cargo comissionado (CC). Em 2005, quando o vereador assumiu a Secretaria Municipal do Planejamento Urbano, na primeira gestão José Fogaça (MDB, 2005-2010), Bremm o acompanhou como assessor. Entre 2007 e 2010, trabalhou em um escritório de advocacia, enquanto cursava Direito no Centro Universitário Ritter dos Reis (Uniritter). Em 2010, assumiu outro CC na Secretaria do Planejamento, onde permaneceu até 2016, último ano da gestão José Fortunati (na época PDT, 2010-2016). No governo Nelson Marchezan Júnior (PSDB, 2017-2020), assumiu um CC na Procuradoria-Geral Adjunta de Meio Ambiente, Urbanismo e Domínio Público. Tem três especializações: em Direito Imobiliário (Uniritter), em Direito Público (Instituto de Desenvolvimento Cultural) e em Direito Ambiental (Faculdade Verbo Jurídico). Em 2019, assumiu a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade. Nunca teve filiação.