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Presidente do IEE, Júlia defende reformas após a pandemia
Júlia Evangelista Tavares assumiu a presidência do Instituto de Estudos Empresariais em maio, em meio à pandemia de Covid-19
A advogada Júlia Evangelista Tavares assumiu a presidência do Instituto de Estudos Empresariais (IEE) em maio, em meio à pandemia de Covid-19. Por isso, ainda não teve uma solenidade de posse sobre a retomada econômica do País.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Júlia fala sobre os impactos da pandemia no setor público e privado e defende a retomada do processo de reformas no Brasil, para que as medidas possam ser aprovadas quando passar a crise do coronavírus. "A agenda de reformas deve retornar à pauta imediatamente e, diante da crise sanitária, se tornou ainda mais necessária", avalia. Ao mesmo tempo, a presidente do IEE mostra preocupação com as flexibilizações de leis que estão ocorrendo no período da pandemia.
Júlia sustenta, ainda, a importância de reduzir o tamanho do Estado, retomando também o processo de privatizações. "Correios, Banco do Brasil, Eletrobrás, isso tudo já deveria ter sido vendido. A gente está perdendo tempo e oportunidades de vender os nossos ativos das melhores formas", conclui.
Jornal do Comércio - Qual é a sua avaliação da conjuntura política nacional e o governo do presidente Jair Bolsonaro?
Júlia Evangelista Tavares - Desde o início da pandemia, por razões óbvias, o foco da política mudou para o combate ao coronavírus. Preocupa, no entanto, que os ânimos tenham se acirrado profundamente, adicionando a uma já complexa crise de saúde e econômica também um conflito institucional que não parece ter sido solucionado em nível federal. Há questões que podem atentar contra o Estado de Direito e precisam ser esclarecidas, assim como a agenda de reformas deve retornar à pauta imediatamente e, diante da crise sanitária se tornou ainda mais necessária. Dentro desse contexto, se por um lado vemos um esforço fantástico para salvar vidas - muito dele estimulado pela iniciativa privada, como ocorreu com o Hospital Independência em Porto Alegre e o Centro de Tratamento no M'Boi Mirim em São Paulo -, nos preocupam as diversas flexibilizações de leis para aumentar o controle sobre a população. Quais os limites desses poderes extraordinários que os governantes estão recebendo? Estão sendo usados para suprir o sistema de saúde ou em despesas de supérfluos? Tão importante quanto combater o coronavírus é evitar que esses poderes exacerbem os restritos fins a que foram concedidos. Não é aceitável que troquemos a preocupação com o vírus por alguma espécie de conforto com o controle. É possível combater a epidemia sem aumentar o poder dos governantes.
JC - Foi positivo o apoio emergencial da União, com liberação de recursos para estados e municípios?
Júlia - Os estados têm de enxugar despesas. Obviamente, a União é a única que pode imprimir dinheiro, emitindo dívida; os estados não têm esta prerrogativa. Acredito que não se deva dar um cheque em branco. Os estados, os governadores e os prefeitos têm que ter responsabilidade no momento de pandemia. Não acho saudável esses gastos desenfreados da máquina pública.
JC - E o auxílio emergencial que está sendo pago para trabalhadores informais?
Júlia - O auxílio foi uma medida emergencial. O País parou, as pessoas não tinham dinheiro para se sustentar. Todo mundo em isolamento, mas a economia precisa ser retomada. Algo pontual, para realmente deixar as pessoas continuarem vivendo com o mínimo de dignidade, mas não é algo que tenha que ser permanente. Foi algo pontual, atípico, digno para uma crise deste tamanho.
JC - Quais são as perspectivas para a economia daqui para frente?
Júlia - Sou bastante otimista e tenho esperança que o País consiga fazer as reformas estruturantes. A população está muito mais consciente do tamanho do Estado, das necessidades das reformas e das condições das nossas finanças públicas. Quando este furacão passar, poderemos retomar as pautas importantes, que são pautas não de governo, mas da sociedade inteira. Toda sociedade deveria querer um Estado eficiente, que não fosse dispendioso com recurso público, porque não existe dinheiro do Estado, existe o dinheiro do pagador de impostos - de todos nós, contribuintes.
JC - Acredita que haverá ensinamentos positivos, avanços para a economia, após a pandemia?
Júlia - No pós-pandemia, tanto o setor público quanto o privado vão sair ainda mais machucados. A iniciativa privada sofreu muito também com este isolamento social, com o fechamento do comércio, das indústrias... O público também. O orçamento público sofreu, tendo de cobrir vários rombos, estimulando a economia da forma que foi possível. Então, agora passando isso, temos que nos conscientizar que é importante esta agenda de reformas.
JC - A agenda de reformas no País e as privatizações ficaram paradas em função da pandemia. Acredita que essas medidas devem ser retomadas ainda neste ano?
Júlia - Sim, sem dúvidas. O orçamento público sofreu muito com a pandemia. Teve de tirar dinheiro da onde não tinha. Havia a pauta das reformas, então, é preciso realmente focar naquilo que é importante e vender ativos que não são relevantes - isso tem de ser feito para ontem. A sociedade como um todo tem que encampar um Estado mais eficiente, menos dispendioso.
JC - O que deve ser papel do Estado e o que deve ser concedido ou privatizado na sua opinião?
Júlia - O papel do Estado tem que ser mínimo, tem que participar só do que não há como a iniciativa privada fazer. Correios, Banco do Brasil, Eletrobrás, isso tudo já deveria ter sido vendido. A gente está perdendo tempo. Está perdendo tempo e também oportunidades de vender os nossos ativos das melhores formas.
JC - Quanto a instabilidade política do País interfere nos problemas econômicos?
Júlia - A instabilidade é muito prejudicial. Perde-se muito tempo com debates e polarizações que são totalmente desnecessários e tiram o foco do que realmente é importante.
JC - Qual deveria ser o foco dos gestores no País?
Júlia - A melhoria do papel do Estado como um todo. Delegar ao setor privado, enxugar despesas, tornar o Estado mais eficiente, para entregar bons resultados, com uma boa prestação do serviço público para população.
JC - Como avalia a conjuntura política estadual e o governo de Eduardo Leite (PSDB)? O que pensa sobre o modelo de distanciamento controlado no Rio Grande do Sul?
Júlia - Muito difícil separar o que acontece no Brasil do Estado. De certa forma, vemos tudo interligado: as questões são basicamente as mesmas. Talvez no Estado foquemos mais nos micro detalhes do distanciamento controlado, que, apesar de ter após longos 90 dias finalmente alguma metodologia, talvez essa não tenha sido a melhor estratégia. Países que já mostram saídas melhores para a crise, como Coreia do Sul, adotaram estratégias diferentes. Nos preocupa que a sociedade se sinta confortável em ceder a sua responsabilidade individual pelo cuidado pessoal (higiene básica, evitar aglomerações, preferir locais arejados) para receber uma ordem do governante. Isso não pode se tornar um hábito: somos os senhores do nosso destino. O que não impede que o governo exerça o seu papel constitucional de agir em momentos extremos para evitar contágios e efeitos de externalidade. Mas não é papel dos governos substituir a sociedade na tomada de decisões: essa é uma liberdade e uma responsabilidade individual.
JC - Como o Instituto de Estudos Empresariais está atuando hoje no sentido da formação de lideranças?
Júlia - O foco está na retomada do País. Temos que construir uma retomada segura e com base nas condições de saúde e sem deixar a economia parar. O instituto é apartidário. O IEE sempre se posiciona a favor ou contra ideias que são colocadas. No encontro, em que o (vice-presidente da República) general (Hamilton) Mourão (PRTB) participou, frisou-se a necessidade de reformas para o Brasil. É importante que elas sejam feitas. Defendemos uma pauta liberal há muito tempo. Nosso papel é discutir essas reformas; discutir entre os nossos associados - o nosso posicionamento liberal. Reformas para estruturação do Estado como um todo. Um Estado sustentável. Quem irá pagar a conta será a próxima geração. A questão da pandemia agravou ainda mais (a crise das) finanças públicas da União, de estados e dos municípios.
JC - Sua gestão à frente do IEE vai até 2021. Está previsto ato de posse? Como estão as atividades nesse cenário de pandemia do coronavírus?
Júlia - Há ideia de fazer uma posse formal, porém, estamos vivendo uma pandemia. Acredito que ocorra próximo ao fim do ano e quando os decretos das autoridades liberarem a realização de eventos presencias. No IEE, hoje, todos os eventos são realizados de modo on-line, tudo por videoconferência. É um momento atípico. Quando as autoridades sanitárias permitirem, vamos retomar a vida presencial.
JC - Quais são as metas de sua gestão?
Júlia - É um desafio diferente para todos viverem nesta pandemia. No IEE, vamos fazer eventos on-line e trazer para os nossos associados pessoas que agreguem (conhecimento) para a nossa formação. Que isso ocorra, mesmo sendo por intermédio de eventos por videoconferência, mesmo faltando aquela proximidade com os palestrantes. Tornar o IEE mais conhecido também é outra meta. A instituição já é uma referência no Rio Grande do Sul e no Brasil. Queremos fortalecer ainda mais esta posição do IEE em defesa das ideias liberais. Principalmente em momentos pós-crise. Então, devemos firmar nossas posições de liberdade individual e de liberdade econômica.
JC - E o Fórum da Liberdade?
Júlia - Vamos reforçar a marca Fórum da Liberdade. Estamos com um projeto novo, que é o Fórum da Liberdade Talks. Pretendemos reacender discussões do fórum - evento geralmente realizado só em abril. A ideia é fazer "pílulas" em formato on-line e com um espaçamento de tempo menor, cerca de dois em dois meses. Debater perspectivas para o futuro e para preparação da 34ª edição do Fórum da Liberdade.
JC - A edição deste ano já ocorreu de forma on-line...
Júlia - O evento ocorreu nos dias 6 e 7 de abril, foi logo depois que estourou a crise da Covid-19. Isso obrigou a realização do fórum em formado on-line. Realizamos três painéis com alguns dos palestrantes já confirmados para versão presencial. Vimos que a sua realização então foi um sucesso. O fórum, que, por si só, é um sucesso de público, já estava precisando se expandir para um modelo on-line. E este projeto do Fórum da Liberdade Talks vai nos ajudar a expandir o fórum de forma on-line. O IEE debate ideias e mantemos uma agenda relevante.
JC - Pode dar exemplos?
Júlia - Recentemente, realizamos uma conversa só com os associados com a participação do vice-presidente Hamilton Mourão para debater questão política e o País hoje. Também trouxemos para os debates empresários relevantes, como: Florian Bartunek, da Constellation, Henrique de Breda, José Galló. Vamos trazer também Michel Temer (MDB), ex-presidente, via videoconferência, para discutir o cenário político. Estamos sempre mesclando lideranças políticas, econômicas e intelectuais nos encontros. O IEE tem esse cuidado de fomentar o debate e trazer para os seus associados palestrantes de alto nível. O IEE tem como base formar líderes empresariais. Já as lideranças políticas, essas são consequência desses líderes que formamos e que sentiram a necessidade de contribuir de forma mais ativa para mudar o País.
Perfil
Fortes laços unem a advogada Júlia Evangelista Tavares, 28 anos, natural de Porto Alegre, com o Instituto de Estudos Empresariais (IEE), associação civil sem fins lucrativos, fundada na capital gaúcha em 1984. O IEE prepara e forma lideranças com base nos conceitos de economia de mercado e da livre iniciativa, além do ideal democrático de liberdades individuais, subordinadas ao Estado de Direito. Júlia ingressou no IEE há cinco anos, por indicação do tio, o empresário Paulo Afonso Feijó, que foi o vice-governador do Rio Grande do Sul (no governo Yeda Crusius, 2007-2010). Seu pai também foi associado há mais de 30 anos. Em cinco anos no IEE, Júlia atuou em diversas funções, tendo sido vice-presidente e diretora de eventos. Formada em Direito na Pucrs em 2014, tem pós-graduação em Direito e Processo do Trabalho. Participou do curso em Leadership for Young Leaders da Foundation Friederich - Naumann na Alemanha, em 2018, e do curso Atlas ThinkTankLeadership Training- Atlas Network em Nova York. É presidente do IEE desde maio.