Candidata a vice-governadora na chapa de Miguel Rossetto (PT), Ana Affonso (PT) defende maior participação feminina nos processos decisórios, e a integração de políticas públicas estaduais para combater a violência contra a mulher. Ex-deputada estadual durante o governo Tarso Genro (PT) e professora por formação, Affonso criticou o projeto Escola Sem Partido e o que chamou de "política do ódio" vinda de setores "fascistas conservadores" da sociedade.
Em mais uma entrevista com candidatos a vice na série do Jornal do Comércio, a vereadora de São Leopoldo falou também sobre as experiências administrativas do PT na cidade do Vale dos Sinos, atualmente a maior prefeitura do partido no Brasil.
Jornal do Comércio – Na sua opinião, qual o papel do vice e como você pretende atuar nessa função?
Ana Affonso – Nós temos uma concepção de que o espaço de vice governador é um espaço atuante, inclusive pela baixa representação de mulheres que nós temos na política, apenas 11% de mulheres nos espaços de decisão. Uma das concepções que nosso partido tem é de que a gente fizesse uma composição igualitária, e conseguimos construir isto com nossa chapa. Eu pretendo como vice governadora atuar bastante junto ao governador tomando a frente de temas que são estratégicos pro estado, buscando a recuperação e seu desenvolvimento pleno, e principalmente também a temática das mulheres que é uma política que precisa transversalizar em todas as áreas, buscando enfrentamento a violência contra mulher e a participação plena das mulheres nas decisões através do programa de participação popular.
JC – Como a senhora pretende desenvolver essas políticas públicas para mulheres?
Affonso – Nós temos um desejo muito grande de construir uma política no estado que consiga enxergar todos os setores de forma ampla. O tema das mulheres é um tema que nós vamos puxar com muita força, principalmente a partir desse espaço de vice governadora. É uma lástima que nosso Estado tenha extinguido a Secretaria das Mulheres. Nós já éramos uma referência nacional no enfrentamento a violência contra mulheres, com experiências como a patrulha Maria da Penha, que foi reconhecida nacionalmente. Tínhamos diminuído os índices de violência contra as mulheres, e hoje esses índices explodiram, no sentido do aumento da criminalidade, homicídios, latrocínios e o feminicídio também. É inadmissível que a cada dia 11 mulheres sejam estupradas, e isso fora aquelas que não formalizam a queixa. Então, através de políticas para mulheres e também o combate a homofobia, a questão da igualdade racial... Essas políticas, que nós implementamos em São Leopoldo, podem e devem ser uma boa experiência para estadualizar.
JC – São Leopoldo é a maior cidade governada pelo PT no Brasil. O partido perdeu representatividade nas eleições de 2016 no País, mas na sua cidade aconteceu o contrário. A que fatores a senhora atribui esse fenômeno?
Affonso – São Leopoldo é uma cidade que vive muito o tema da participação popular. A sociedade civil lá é muito ativa, tivemos experiência de orçamento participativo, tudo isso fez com que a gente vivesse uma experiência popular e democrática. A experiência do governo do PSDB, que foi uma interrupção dos dois governos do PT, foi desastrosa porque mudou totalmente essa dinâmica, trouxe um viés mais de privatização e de sucateamento das políticas públicas e acabou precarizando os serviços básicos da população. Eu acho que as vezes se busca uma mudança e não percebe exatamente o conjunto dessa política que acompanha os candidatos que defendem a mudança, mas a partir desse retrocesso na garantia de direitos e das políticas, acaba se convencendo que uma gestão popular democrática prima muito pelos serviços básicos.
JC – Nesta eleição o PT está coligado apenas com o PCdoB em nível estadual, e é a primeira vez desde 2002 que o partido lançou tanto o cabeça de chapa e a vice ao Piratini. O que motivou o PT a ter uma candidatura "puro-sangue"?
Affonso – Nesse momento eu acho que, diante do quadro político que está colocado, os desafios do PT e da esquerda como um todo também são grandes. Nós temos uma avaliação do conjunto de erros e acertos que tivemos durante os períodos que governamos e uma das questões que nós revisamos dentro do nosso partido foi o campo de aliança, então acho que nós acertamos ao construir uma o campo da esquerda, onde a gente não perca a nossa posição ideológica que é de defesa da classe trabalhadora. É um desenho novo, no sentido de chapa pura majoritária, mas também não foge do campo da esquerda e também acho que não nos tira essa vontade de recuperarmos falhas que nós tivemos não no estado, mas em nível nacional com as nossas alianças, não perdendo a nossa identidade ideológica. A chapa pura do PT tem uma consistência no sentido de trazer as nossas experiências, minha e do Rossetto, pra dentro desse processo que representa um novo período da política, e o PCdoB foi o partido que nós, em nível nacional e também no estado, buscamos desde o início estarmos coligados.
JC – Como a senhora avalia o cenário que a esquerda como um todo está inserida hoje no Rio Grande do Sul?
Affonso – O avanço do fascismo e do conservadorismo são elementos que a gente não pode desconsiderar, principalmente depois que aconteceu o golpe. Hoje se tem um ambiente hoje mais permissível pra uma política do ódio, pra defesa do estupro, pra criminalização de gays, pra defender a escola sem partido, isso parece que abriu uma janela e veio à tona uma cultura de violência política. Eu vivo isso em São Leopoldo, a gente têm colegas vereadores que são aliados com a candidatura do Bolsonaro, eu tive que liderar lá um processo de derrota do Escola Sem Partido e foi forte a tensão. Esse segmento fascista conservador tá presente no campo político e opera uma política do ódio e também muito mascarado atrás de um perfil não bem identificado, produzindo uma política mais raivosa e de ameaça. Não vai ser uma eleição fácil, mas isso não vai me intimidar e não vai me tirar o direito de denunciar a forma como esses setores fazem política de forma destrutiva que atinge a democracia com um todo. Estou preparada.
Perfil
Natural de Maldonado, no Uruguai, Ana Inês Affonso tem 45 anos, é vereadora de São Leopoldo e professora da rede municipal. Filha de mãe uruguaia e pai brasileiro, mora no Brasil desde os dois anos. A carreira docente teve início em 1992 na Escola Municipal Dilza Flores Albrecht, onde foi professora e diretora. Em 2004, se tornou a primeira mulher petista a ser eleita vereadora em São Leopoldo, sendo reeleita em 2008 e presidindo a Câmara Municipal em 2009. Em 2010, conquistou o cargo de deputada estadual, mas não conseguiu se reeleger no pleito seguinte. Em 2016, após dois anos da volta às salas de aula, retornou à Câmara leopoldense. Com militância na área da educação pública, foi presidente do Ceprol, sindicato dos professores municipais de São Leopoldo, entre 2001 e 2003.