Recentemente, o STJ tomou preocupante decisão: embora devidamente declarado, o contribuinte que não pagar o ICMS próprio, incorrerá no delito de apropriação indébita tributária, previsto na Lei n. 8.137/90. A decisão é preocupante, pois esse valor compõe o custo do produto que o contribuinte vende, afinal, todo custo deve ser englobado no preço, somando-se à margem de lucro, caso contrário, seria inviável ter um negócio. É por isso que se realiza a estimativa de custos para vislumbrar o lucro.
Ocorre que com a decisão proferida no HC 399.109, o STJ passou a entender que ao repassar o custo com o ICMS ao consumidor e não pagar ao tesouro, ainda que devidamente declarado, o contribuinte estaria apropriando-se do valor, não sendo dele, mas sim do Estado, podendo responder criminalmente pelo não pagamento da sua dívida.
Além do grave equívoco técnico, pois há muito afirmo que esse crime só pode ser imputado àquele que retém tributo ou contribuição social descontado do devedor original (substituição tributária), a Corte desequilibrou a situação comercial em um período de crise. O Estado passa, novamente, a ser um credor diferenciado, que se utiliza da prisão para aqueles que não o pagam, enquanto deixa de pagar seus fornecedores.
O mais preocupante é o reflexo direto no pequeno empresário, pois os grandes (quase) sempre têm condições de efetuar o pagamento ou parcelar a dívida, enquanto os pequenos, mesmo declarando a dívida, deverão sangram para o Estado, sob pena de prisão. Situação que alcança os contribuintes do ISS, que não recolhem de forma fixa, pela similitude do imposto indireto.
Não se está defendendo o não pagamento da dívida do ICMS ou do ISS, mas há outros mecanismos, como ações de execução ou de cobrança. Utilizar do direito penal para isso é, no mínimo, um abuso. Voltamos aos tempos em que o Estado confisca à força da plebe aquilo que é "seu".
Professor de Direito Penal e Processo Penal