Tema no topo da agenda pública nas últimas semanas, o projeto de reforma da Previdência também esteve na ponta da língua dos líderes empresariais gaúchos reunidos ontem no Teatro do Sesi, em Porto Alegre, durante a apresentação dos resultados da 21ª edição da pesquisa Marcas de Quem Decide, realizada pelo Jornal do Comércio (JC) em parceria com a Qualidata. Para os empresários, a aprovação nas mudanças pode destravar a economia e ajudar a acelerar o crescimento econômico do País que, em 2019, ainda deve ser lento.
"Como todo ano de novo governo, temos várias expectativas, mas nada que se confirmou. O que imaginamos é que a pedra de toque para o planejamento do governo seja a reforma da Previdência", afirma o presidente em exercício da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), Gilberto Ribeiro.
O industriário projeta um desfecho para a reforma até junho, o que poderia incentivar investimentos estrangeiros e nacionais. Outro problema, hoje, é a falta de financiamento para capital de giro das empresas, segundo Ribeiro. "Existem faixas para investimento em bens de capital, mas isso as indústrias não precisam com urgência", reclama o presidente em exercício, citando a capacidade ociosa das fábricas.
O compasso de espera com leve otimismo também é visto na construção civil, que já sente movimentação de incorporadores adquirindo terrenos e tirando da gaveta projetos antigos. "Esperamos que a retomada venha timidamente já no segundo semestre, mas mais fortemente em 2020, 2021 e 2022", argumenta o presidente do Sindicato das Indústrias da Construção Civil do Estado do Rio Grande do Sul (Sinduscon), Aquiles Dal Molin Júnior, que acrescenta que, embora não espere um crescimento enorme, projeta um ritmo "consistente e constante". Dal Molin salienta que o aumento nos valores do Minha Casa, Minha Vida também pode ajudar na recuperação do setor.
Crédito mais barato e menos concentrado em poucos bancos é o que o setor produtivo rural coloca na agenda de negociações com a pasta da Economia do governo federal, diz Domingos Antônio Velho Lopes, diretor financeiro da Federação da Agricultura do Estado (Farsul). Lopes diz que o tema é decisivo para evitar que endividamentos de produtores virem problema. "O crédito como é colocado hoje beneficia muito mais o sistema financeiro e não chega ao produtor", aponta o dirigente da Farsul.
No varejo, o presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL-POA), Alcides Debus, admite que o fôlego do ano ainda não está na medida que o setor esperava, por isso não há um otimismo exacerbado. Porto Alegre, destaca Debus, terminou fevereiro com melhor desempenho, pois houve mais dias úteis. Além disso, os lojistas estão sentindo que o frio chegou mais cedo e já encomendam as coleções de outono-inverno. "O clima melhora no comércio, quem sabe pode contagiar o cenário nacional", compara o presidente da CDL-POA.
No setor supermercadista, o fator renda pesa mais, e o presidente da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas), Antonio Cesa Longo, pondera que os consumidores podem ficar mais cautelosos no ano. Sobre a pauta política, Longo avisa: "Não é só a reforma da Previdência de que precisamos, mas a tributária também".
Investimentos estão na agenda de empresas para 2019
Enquanto aguardam sinais de aquecimento, muitas empresas se preparam para colocar novos investimentos para rodar nos próximos meses. A Cooperativa Santa Clara, por exemplo, planeja iniciar em julho a produção comercial em uma nova planta, no município de Casca, com capacidade para processar 600 mil litros de leite por dia (a média atual da cooperativa é de cerca de 800 mil litros/dia).
A planta, fruto de pelo menos R$ 115 milhões em investimento, se concentrará na produção de leite UHT, achocolatados e cremes, permitindo à cooperativa especializar também suas outras fábricas, em Carlos Barbosa e Getúlio Vargas, em outros produtos. "O objetivo de Casca é a produção de alta escala, reduzindo custos com uma planta moderna e automatiza, pois entendemos que só permanecerá no mercado quem for mais eficiente", salienta o diretor da Santa Clara, Alexandre Guerra, que é também o presidente do Sindicato da Indústria de Laticínios do Estado (Sindilat).
Outra gaúcha no aguardo de uma nova fábrica é a Fruki, de Lajeado, que espera inaugurar sua nova planta em Paverama no fim de 2020. O projeto, segundo o presidente da Fruki, Nelson Eggers, ainda está em fase de desenvolvimento do leiaute industrial. Eggers comemora não ter tirado o pé do acelerador mesmo com a crise econômica dos últimos anos, tendo lançado novas linhas de sucos, energético e cerveja. "Esses produtos são nossos, mas estão sendo fabricados em terceiros, até porque precisam ajudar a pagar a nova fábrica", brinca o empresário. A cerveja Bella Vista, por exemplo, tem tido resultado melhor do que o esperado, com vendas de mais de 1 milhão de litros por mês.
Além de novas fábricas, o Interior gaúcho também deverá perceber a chegada de serviços, como a Uber. O aplicativo, há pouco mais de três anos em Porto Alegre, já atua em diversas cidades do Estado e inaugurou o serviço nessa semana em Bagé, Uruguaiana e Passo Fundo. "Estamos sempre olhando se há mercado nas cidades menores, e tentamos chegar onde for possível", conta o porta-voz da empresa no Brasil, Andre Monteiro. Na Capital, a Uber ainda estuda projetos para o ano, mas Monteiro argumenta que Porto Alegre sempre está no roteiro de novas categorias, como aconteceu com o Juntos, lançado no fim de 2018.
Do ramo de farmácias, a Panvel projeta abrir 40 filiais em 2019 nos três estados do Sul e em São Paulo. E o número pode até ser maior, se o ambiente econômico melhorar, pois os planos foram traçados em 2018 ainda sem maior convicção sobre este ano. Roberto Luis Weber, do Conselho de Administração do grupo Dimed, dono da Panvel, diz que a disputa no mercado vai ser guiada por qualidade de serviço e atendimento e pontos bem localizados.
Dirigentes esperam que deputados aprovem privatizações gaúchas
Estado possui um agronegócio forte, aponta Mariante, da PwC
MARCO QUINTANA/JCNão é só o cenário nacional que está no foco de dirigentes do setor econômico. A expectativa de que o governador gaúcho Eduardo Leite (PSDB) possa emplacar as propostas de privatizações de estatais para fechar um acordo com a União domina opiniões dos segmentos de varejo. A aposta é que a autorização para venda de empresas como CEEE, Sulgás e Companhia Riograndense de Mineração (CRM), que depende de aprovação do Legislativo estadual, possa gerar ambiente mais atrativo a investidores até do exterior, projeta ainda o sócio da consultoria Pwc Rafael Biedermann Mariante.
"O Rio Grande do Sul desperta interesse, pois tem um agronegócio forte e possíveis áreas de concessões que estão na meta. O governador terá de fazer uma agenda positiva com empresários e convencer a sociedade que há poucas alternativas, uma delas é privatizar e fazer parcerias público-privadas (PPPs) para atrair investimentos e melhorar o ambiente econômico", traduz Mariante. O sócio da Pwc reforça que as medidas, que se complementam coma agenda nacional, influenciam para atrair capitais externos e dar mais confiança interna.
O presidente do Sindiatacadistas, Zildo De Marchi, avalia que Leite não tem muita saída, pois se deparou com um cenário de dificuldades "devido ao volume de despesas da máquina frente à receita". Para De Marchi, as privatizações das companhias gaúchas são inevitáveis, para buscar a sustentação do governo. Mas o presidente do Sindiatacadistas não espera um terreno fácil da tramitação. As Propostas de Emenda Constitucional (PECs) do Estado para retirar a exigência do plebiscito foram protocoladas no começo de fevereiro. "A Assembleia tem interesses políticos, que podem interferir, mas certas privatizações não têm saída. Minha aposta é a maioria vai dar voto para a aprovação", afirma De Marchi.
O presidente do Sindilojas de Porto Alegre, Paulo Kruse, segue a percepção do colega do setor atacadista e espera que as PECs sejam confirmadas pelos parlamentares. O governo quer resolver a pauta até a metade do ano. "O Estado está parado. Sem estas modificações, vamos continuar para trás. O povo terá de entender que, se não soltar as amarras e deixar a iniciativa privada trabalhar, não vai ter saída. A Assembleia vai aprovar", diz com firmeza Kruse.
A entidade enfrenta uma queda de braço com o Estado na cobrança de diferenças no regime especial da Substituição Tributária (ST). Com liminar, o sindicato orienta que comerciantes afetados façam depósito em juízo. "A pressão é para dialogar com o governo. As empresas estão sufocadas com impostos", reage Kruse. "O impacto maior é nas franquias, setor que é bitributada. Praticamente serão inviabilizadas."
Companhias buscam superar travas do crédito
Setor cooperativo apresenta demanda crescente, destaca Lima
MARCO QUINTANA/JCA oferta de recursos baliza o desempenho de segmentos de consórcios a serviços, como a operação de cooperativas de crédito. Para áreas como a associativa, as restrições dois últimos anos que afastaram clientes e reduziram carteiras quase não foram sentidas, diz o diretor executivo da Central Sicredi Sul/Sudeste, Leandro Gindre de Lima.
"O setor cooperativo contraria a tendência, com demanda crescente com alta de 20% em 2018", disse Lima, sobre o comportamento recente. E num dos alicerces é o campo, que responde por 50% da demanda da Sicredi. Atuar perto do associado e que busca recursos é um dos trunfos do resultado. Mas Lima admite que, se a economia estiver mais robusta, os negócios aumentam em geral. O que preocupa agora é a oferta de crédito de longo prazo, que depende do aporte do banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes). Este tema está em pauta na Expodireto, em Não-Me-Toque.
Do lado do consumidor que escolheu consórcio para bancar suas aquisições, operadores como a Racon também surfa uma onda de crescimento e estabilidade, quando outros segmentos de crédito registraram perdas. O gerente executivo da Racon, Augusto Letti, reforça que a meta é crescer mais no Sul e Sudeste do País, dobrando a rede atual de 200 franqueados no longo prazo. "Em 2019, devemos crescer 15% a 20% em unidades", revela Letti.
Do lado de um segmento mais tradicional e que precisa de crédito, revendedores de veículos acreditam que a recuperação se mantém em 2019. O presidente do Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos no Estado do Rio Grande do Sul (Sincodiv-RS), Fernando Augusto de Carvalho Esbroglio, avalia que há melhora no setor e que o ano pode fechar com vendas 10% a 12% maiores. "Tem crédito, mas precisa melhores condições para consumidor entrar", condiciona Esbroglio. Renda e emprego são os dois indicadores que precisam aumentar para que o carro do setor acelere.