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Rússia intensifica ataques a Odessa e sinaliza ação no mar Negro
Kremlin fala do risco de uma escalada rumo a uma Terceira Guerra Mundial, o que o Ocidente considera um blefe
A Rússia intensificou os ataques contra Odessa, principal porto ucraniano, que fica no sudoeste do país e é a chave para o controle da costa do país no mar Negro. Quarta maior cidade da Ucrânia, com uma população de quase 1 milhão de habitantes antes da guerra iniciada por Vladimir Putin em 24 de fevereiro, até aqui Odessa tem sido relativamente poupada pelos russos.
No fim de semana, contudo, ocorreram ataques com mísseis de alta precisão Onix, lançados por sistemas costeiros Bastion baseados na Crimeia, anexada pela Rússia em 2014. A pista do aeroporto de Odessa e um depósito - que segundo os russos guardava armas enviadas pelos EUA e pela Europa - foram destruídos.
Já nesta segunda-feira (2), foi a vez de um foguete russo destruir, segundo o governo de Odessa, a ponte rodoferroviária que liga a cidade à região administrativa homônima, a sudoeste do centro. É a principal ligação daquela área com o resto da Ucrânia, passando pelo estuário do rio Dniester. Além disso, a prefeitura disse que houve outro ataque com mísseis em áreas habitadas, ferindo e matando um número incerto de pessoas.
As ações podem sinalizar uma prévia daquilo que um general russo revelou há duas semanas durante um evento: que Moscou quer tomar o Donbass (leste russófono) e toda a costa do mar Negro, ligando por terra no caminho a Crimeia e a região separatista russa da Transnístria, na Moldávia, que fica na ponta oeste desse mapa.
Até aqui, com a tomada de Mariupol - com a exceção do bolsão de resistência numa siderúrgica -, os russos conseguiram estabelecer a ligação até perto de Mikolaiv. Com isso, a costa do mar de Azov, uma subdivisão do mar Negro, está sob seu controle. Estabeleceram, a partir de Kherson, a primeira cidade de maior porte que tomaram na guerra, um governo local e, agora, pretendem inventar um plebiscito visto em Kiev como fraudulento para emancipar a região.
Na semana passada, ataques contra posições pró-Kremlin na Transnístria levaram ao temor de que Moscou pudesse reforçar suas forças no local, hoje de apenas 1.500 soldados, para fazer um ataque múltiplo a Odessa - que fica a meros 70 km a oeste da fronteira da área separatista.
Isso poderia ser apoiado por um desembarque anfíbio. A visão de navios russos no horizonte de Odessa é uma constante, embora a perda do cruzador pesado Moskva no mês passado e de duas lanchas de patrulha nesta segunda-feira levante a questão acerca do quanto risco naval os russos estão dispostos a correr.
Tudo isso faz sentido, mas as ações também podem apenas ser um diversionismo para as Forças Armadas da Ucrânia, concentradas em defender suas posições no que sobrou do Donbass não ocupado por russos ou separatistas russófonos, que travam lá uma guerra civil desde 2014 com o apoio de Moscou.
Como todo o movimento do Kremlin foi anunciado, há pouca surpresa em curso: os russos estão tentando envelopar o centro das tropas ucranianas na região. No fim de semana, fizeram avanços que sugeriram que, lentamente, estão conseguindo estabelecer essa pinça ao norte - faltando então um ofensiva vinda do sul, já mais controlado.
A questão é que os ucranianos por ora resistem. Aparentemente, segundo vídeos que circulam nos canais militares do país no Telegram, o mérito poderá ser dado aos obuseiros de 155 mm norte-americanos doados por Washington para bombardear posições russas. Segundo o Pentágono, até sexta-feira, 72 das 90 peças de artilharia prometidas já haviam sido posicionadas no Donbass.
Ainda é cedo para dizer se elas vão mudar o rumo da ofensiva russa como as armas antitanque e antiaéreas portáteis fizeram na fase inicial da guerra, quando Moscou fez um ataque ambicioso com poucas forças em várias frentes e acabou fracassando em derrubar o governo de Kiev.
Um relato vazado pelo Pentágono à mídia dos EUA, sugere que a situação preocupa Moscou. Segundo ele, o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas da Rússia, general Vasili Gerasimov, visitou secretamente pontos de combate na frente entre o Donbass ocupado e a Ucrânia. Se confirmado, é sinal de que a operação militar de Putin está sob forte escrutínio. Enquanto é comum que generais russos participem de suas guerras em postos avançados, tanto que quase dez já foram mortos neste conflito, é raro alguém do quilate de Gerasimov fazê-lo. Ele é o terceiro homem na hierarquia militar russa, atrás de Putin e do ministro Serguei Choigu (Defesa), e o principal comandante de carreira do país (Choigu não é militar de origem).
A presença das armas ocidentais, reforçada com a promessa norte-americana de estabelecer um grande programa de empréstimo que pode envolver até caças, é um dos principais pontos de atrito político hoje da guerra. A Rússia fala abertamente do risco de uma escalada rumo a uma Terceira Guerra Mundial, o que vem sendo considerado um blefe no Ocidente.