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Milhares de ucranianos já buscam refúgio em países vizinhos
Segundo a ONU, pelo menos 50 mil pessoas já deixaram o país nas primeiras 48 horas posteriores à invasão russa
Após a invasão da Ucrânia por parte da Rússia na última quinta-feira (24), dezenas de milhares de ucranianos já deixaram o país em busca de proteção, segundo informa o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur). Filippo Grandi, líder da organização, revelou na noite de sexta-feira (25) que os números já o preocupam.
“Mais de 50 mil refugiados ucranianos fugiram de seu país nas primeiras 48 horas, a maioria para a Polônia e Moldávia. Muitos outros ainda estão se movendo em direção às fronteiras”, declarou o político italiano em seu perfil no Twitter.
A Ucrânia é o segundo maior país europeu em extensão, tendo também a sétima maior população no continente, aproximadamente 44 milhões de habitantes. Segundo explica a advogada Márcia Abreu, especialista em Direito Internacional e Direito Migratório, é natural que a fuga inicial dos refugiados, principalmente com menor renda, seja para os países limítrofes.
“Nas guerras, as pessoas que têm melhor condição financeira conseguem sair mais fácil, muitas vezes antes do conflito, e aí se deslocam para países mais longínquos. Mas as pessoas de baixa renda normalmente conseguem ultrapassar no máximo uma fronteira, e por isso a grande maioria das pessoas que de fato conseguirem sair nesse momento deve ficar nos países fronteiriços”, explica a advogada.
A oeste da Ucrânia, lado oposto à localização de Rússia e Bielorrússia, a maior fronteira ucraniana é com a Polônia. Além disso, também é o país nesse momento com o melhor acesso vindo de Kiev, capital e maior cidade ucraniana, com cerca de 3 milhões de habitantes, e distante pouco menos de 500 quilômetros da fronteira com os poloneses.
“Por isso que a escolha principal dos ucranianos inicialmente tem sido ir para a Polônia. Os refugiados não têm muito tempo para escolher onde ir, devem se deslocar ao local seguro mais perto e de fácil acesso o mais rápido possível. Mas Moldávia, Hungria, Romênia e Eslováquia também irão receber ucranianos, assim como, em um segundo momento, os outros países da Europa”, complementa Márcia Abreu.
Acolhimento na Polônia
O acolhimento do governo polonês em relação aos refugiados ucranianos tem sido satisfatório nos primeiros dias. A administração polonesa é conhecida na comunidade internacional por diversas violações de direitos dos imigrantes que tentam ingressar no país, inclusive as ocorridas no último ano na fronteira com a Bielorrússia, onde hoje o país inclusive está construindo um muro. Contudo, com os ucranianos a situação está sendo diferente, como esclarece a advogada polonesa Hanna Umecka.
“O governo polonês definitivamente vai tratar os refugiados ucranianos melhor do que outros, como foi recentemente com os fluxos de sírios e afegãos, por exemplo. Já estão organizando centros de recepção e acolhimento nas fronteiras e nas maiores cidades do país. Além disso, os guardas da fronteira estão facilitando para os ucranianos passarem, muitas vezes dispensando documentos”, destaca a advogada.
Para Hanna Umecka, alguns fatores explicam essa diferença de tratamento. “Além de ser uma guerra em um país vizinho, também tem que levar em consideração que temos uma comunidade ucraniana muito grande na Polônia. Há mais de 1 milhão de ucranianos morando no país, e esse movimento de imigração ficou ainda mais forte recentemente, a partir de 2014, após o conflito da Crimeia. Por isso, muitas das pessoas que estão chegando agora já podem ter familiares e amigos que moram aqui, o que facilita a rede de acolhimento”, ressalta.
Ainda segundo a advogada polonesa, o número de refugiados no país já seria até maior, se não fossem obstáculos impostos pelo governo ucraniano. “Muitos ucranianos estão sendo impedidos de sair pelo próprio governo, porque os homens estão sendo convocados para a guerra. Alguns comboios de pessoas foram interceptados pelas forças armadas e os homens não puderam sair, e as famílias chegam desesperadas na fronteira”, afirma Hanna Umecka.
Ucranianos devem ser reconhecidos como refugiados
Há diferença entre os conceitos de imigrante e refugiado, o que traz implicações práticas na proteção que recebem. Enquanto qualquer pessoa que sai de um país para morar em outro, seja pela razão que for, é um imigrante, refugiados são uma categoria especial, estando em situações de vulnerabilidade e emergência.
“O refugiado é um imigrante vulnerável, porque a razão dele estar saindo de seu país é proteger a sua vida ou sua integridade física. Para a pessoa ser reconhecida como refugiada, tem que atender aos requisitos presentes no Estatuto dos Refugiados e outros tratados internacionais. Ou seja, ter saído do seu país de origem por ter um fundado temor de perseguição relacionado a questões de raça, religião, nacionalidade, pertencimento a um determinado grupo social ou opinião política, ou também devido à grave e generalizada violação de Direitos Humanos e conflitos armados”, explica a advogada Márcia Abreu.
“No caso dos ucranianos, eles devem ser reconhecidos como refugiados nos países em que forem acolhidos, justamente por fugir de um conflito armado e se enquadrarem na definição da legislação, assim como os sírios, por exemplo, em razão da guerra na Síria. A burocracia faz com que eles primeiro devam solicitar formalmente seu pedido de refúgio quando entrarem no país, mas devem ter algum rito especial para agilizar o reconhecimento”, acrescenta a advogada.
O acolhimento dos países aos refugiados é mais robusto, tendo sua proteção ligada a tratados internacionais como o próprio Estatuto dos Refugiados, criado em 1951 após os acontecimentos da Segunda Guerra Mundial e que possui mais de 140 signatários, incluindo o Brasil. Por esse vínculo, os países são sempre obrigados a receber refugiados e nunca podem retorná-los a seus países de origem, em razão do risco que os refugiados correm. Os países receptores também devem prover os recursos necessários para o devido acolhimento e posterior integração dos refugiados à sociedade de acolhida, o que não necessariamente se aplica aos demais imigrantes.