Em sua primeira sessão desde a explosão que arrasou Beirute, no dia 4 de agosto, o Parlamento do Líbano aprovou, nesta sexta-feira (14), a declaração de estado de emergência que dá mais poderes ao Exército em meio a protestos contra a classe política, apontada como responsável pela tragédia. Para grupos de direitos humanos, a medida representa uma ameaça às liberdades no país.
O estado de emergência, com duração de duas semanas, havia sido declarado pela primeira vez pelo presidente libanês, Michel Aoun, no dia da explosão, mas precisava da aprovação parlamentar para torná-lo oficial.
A partir de agora, o Exército poderá impor toques de recolher, ordenar o fim de assembleias ou reuniões e censurar publicações na imprensa que considere uma ameaça à segurança nacional. A medida também estende a capacidade de oficiais de julgar civis em tribunais militares e deve durar até 21 de agosto - com possibilidade de ampliação.
A decisão do Parlamento veio em um momento de fortes protestos - as autoridades são acusadas de negligência ao manter, por 6 anos, 2.750 toneladas de nitrato de amônio em condições inadequadas no porto de Beirute. O governo sabia da existência do material e dos perigos de deixá-lo no local.
A turbulência derrubou, na segunda-feira (10), o primeiro-ministro Hassan Diab, mas muitos ministros permaneceram alegando que uma saída em massa colocaria o país de volta ao impasse que enfrentou no ano passado, quando protestos forçaram a renúncia de outro primeiro-ministro Saad Hariri.
Karim Makdisi, professor associado de política internacional da Universidade Americana de Beirute, classificou a aprovação das medidas como "um passo muito perigoso, que pode levar ao abuso do poder do Exército sem recurso para os cidadãos". A sessão do Parlamento teve de ocorrer no teatro do Palácio da Unesco, em Beirute, pois os prédios do Legislativo foram atingidos pela explosão.
Karim Nammour, advogado e membro do conselho do The Legal Agenda, um grupo que monitora as políticas públicas no Líbano, disse que a declaração do estado de emergência seguiu uma "abordagem repressiva" semelhante à de emergências anteriores. "A lei realmente não especifica o que constitui uma ameaça à segurança, então isso pode ser interpretado sem critério para incluir outras atividades que não são necessariamente ameaçadoras, mas não são compatíveis com o regime ou visão dos poderes sobre como as coisas deveriam ser", disse.
Nammour também afirma que permitir que as autoridades militares proíbam qualquer publicação de conteúdo que considerarem uma ameaça à segurança é o aspecto mais alarmante da medida de emergência, pois a imprensa tem desempenhado um papel importante ao responsabilizar as autoridades pelo desastre.
Os esforços de recuperação ainda estão em seus estágios iniciais na cidade, onde a explosão causou cerca de US$ 15 bilhões (R$ 80,4 bilhões) em danos, de acordo com o governo de Beirute. Grupos internacionais e organizações não governamentais assumiram a liderança nos esforços de ajuda. O Brasil, por meio de uma missão comandada pelo ex-presidente Michel Temer, desembarcou em Beirute nesta semana com mantimentos e remédios. No Rio Grande do Sul, a comunidade libanesa também se mobilizou e abriu um canal permanente de comunicação para quem quiser ajudar -www.consuladohonorariolibanors.org.br. A União Europeia (UE) mobilizou uma ajuda emergencial equivalente a 33 milhões de euros.
FBI ajuda em investigação sobre causas da explosão
Na quinta-feira, David Hale, diplomata norte-americano número três na hierarquia do Departamento de Estado dos EUA, visitou Beirute e disse que o FBI, o Departamento Federal de Investigação, participaria de uma apuração sobre a causa da explosão. "O FBI vai juntar forças com investigadores libaneses e estrangeiros, depois de receber um convite do Líbano", disse. Ao todo, 171 pessoas morreram e 6,5 mil ficaram feridas na explosão no porto, que devastou metade de Beirute.
Autoridades francesas também abriram uma investigação por causa da presença de vítimas do país na tragédia.