No vacinômetro gaúcho da Covid-19, um número chama a atenção: o Rio Grande do Sul recebeu 2,2 milhões de doses, distribuiu aos municípios 2,14 milhões e apenas cerca de 1,3 milhão de doses foram aplicadas até agora.
O Jornal do Comércio buscou a Secretaria Estadual da Saúde (SES) para entender as razões deste "estoque" de imunizantes nas localidades. O vacinômetro estadual tem dados até este domingo (28) e é alimentado por informações registradas no Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), explica a coordenadora do Departamento de Atenção Primária e Políticas de Saúde da SES, Ana Costa.
Ana apontou algumas razões, como a demora no registro das aplicações no SI-PNI, reserva para a segunda dose e dificuldades estruturais das secretarias municipais, para a diferença entre imunizantes recebidos e o que já foi aplicado, e aproveitou para fazer um apelo contundente aos municípios:
"Vacinar o mais rápido possível. Esta é a ordem".
O que chegar deve ser aplicado na população, seguindo os grupos prioritários, foco no atual estágio da campanha. Em Porto Alegre, por exemplo, um terço de tudo que foi recebido ainda não chegou à população: chegaram 417.810 doses e 267.147 foram aplicadas. Nesta semana, as
faixas de 69, 68, 67 e 66 anos recebem a vacina. Serão mais de 36 mil pessoas.
O Rio Grande do Sul soma mais de 5 milhões dos 11,3 milhões de habitantes nestes grupos. Só para isso serão necessárias 10 milhões de doses devido às duas aplicações. Se for mantida a regularidade de remessas verificada em março, Ana avalia que será possível completar os prioritários até o fim de junho. Já
Porto Alegre projeta ir até setembro.
"A gente prefere ficar sem vacina do que ficar com vacina parada", reforça a coordenadora do departamento da SES.
Nas últimas semanas, o fluxo de remessas de imunizantes enviados pelo Ministério acelerou. Quase 1,3 milhão de doses desembarcaram no Estado somente em março (Veja os números de cada lote no fim do texto). É o mesmo volume já aplicado. Com isso, as cidades puderam ampliar mais rapidamente as faixas etárias. Mas também precisaram se organizar para dar vazão à essa velocidade.
'A gente prefere ficar sem vacina do que ficar com vacina parada", reforça Ana Costa. Foto: Marília Bissigo/SES/Divulgação
"Vacinar rápido significa fazer bloqueio e mais chance de reduzir a capacidade da doença atingir mais pessoas", associa a coordenadora. A imunização, e preferencialmente em massa quando tiver mais oferta, é apontada como a maior arma na guerra da pandemia, inclusive para liberar mais atividades, como eventos, hoje suspensos.
"A pessoa vai ter antiticorpos que vão parar o vírus", traduz, em linguagem simples, o governador Eduardo Leite, em live em seu perfil no Instragam a noite desse sábado (27). Leite não estava analisando a velocidade da aplicação de doses, mas justificando medidas mais restritivas, "enquanto não tiver vacina para parar o vírus no organismo das pessoas".
"Precisamos parar as pessoas que transportam o vírus", avisou o chefe do Palácio Piratini, que projetou mais duas a três semanas para ter "um quadro melhor", neste caso, de redução da pressão em UTIs, com lotação acima de 100% há semanas.
Ana comenta que o governo fez reuniões, na semana passada, com universidades em busca de apoio e mais estrutura para acelerar a vacinação. A ideia é que estudantes que estão concluindo a formação possam se somar na linha de frente da aplicação.
Também devem ser convocados voluntários, como aposentados em diversas áreas da saúde para auxiliar. Além disso, a SES acredita que farmacêuticos e odontólogos possam também se somar nos mutirões. Casos como o de Porto Alegre, que concentra em farmácias a aplicação em profissionais de saúde, poderiam ser ampliados a outros públicos, como os idosos para rapidamente usar as doses.
A intenção de buscar profissionais alternativos é por que as equipes de saúde em postos estão muito demandadas pelos atendimentos da Covid-19. Por isso, o número de postos que estão vacinando não reflete a capacidade total. O Estado tem 2,6 mil unidades de saúde.
Em Porto Alegre, são mais de 140 unidades, mas 33 estão na campanha de imunização, só que de segunda à sexta-feira. No sábado, as opções são drive-thrus, que não estão dando conta da demanda, como ocorreu neste fim de semana. A prefeitura chegou a pedir que
os idosos buscassem os postos nesta segunda-feira (29).
Focar em drive-thrus nos fins de semana acaba também restringindo o acesso. Quem não tem carro ou não consegue carona não é vacinado. Na Capital, a prefeitura chegou a emitir nota alertando que pessoas que fossem
a pé aos três drives-thrus não receberiam as doses.
Novas orientações vão incentivar ampliação da aplicação para domingos e mais horários. Foto: Cesar Lopes/PMPA
Mais gente para aplicar e ainda em mais dias da semana, como domingos, que apenas algumas cidades estão adotando, e horários, como a noite. Pelotas é um dos exemplos de localidades com vacinação dominical. A ideia é ampliar as opções de locais, dias e horários, para evitar aglomeração.
"O que precisamos e queremos é que as vacinas não fiquem paradas. Sabemos que os municípios estão fazendo todo o esforço possível, mas precisamos mais", destaca Ana.
Nesta semana, devem sair orientações da SES para esta mobilização, em estilo de força tarefa, para acelerar a imunização, adianta a coordenadora.
Dois motivos para o elevado estoque de doses
Duas razões principais explicam parte do armazenamento elevado de doses: demora no registro das aplicações e reserva de imunizantes para a segunda dose.
A coordenadora do Departamento de Atenção Primária e Políticas de Saúde da SES cita que muitos locais adotam a reserva da segunda dose para aplicar à medida que as pessoas vencem o prazo desde a primeira aplicação. A maior demanda é pela Coronavac - ministrada em até 28 dias -, que chegou com mais volume até agora. A outra é a vacina de Oxford/AstraZeneca, com segunda dose a ser feita em três meses.
Outra razão que explica em parte ter mais de 831 mil doses não aplicadas, pelo menos pelo controle da SES, é a demora das localidades em lançar dados no SI-PNI. Os municípios devem inserir as informações até 48 horas após a aplicação das doses. O vacinômetro estadual puxa estes dados, lembra Ana. Muitas cidades têm dificuldades em atender a este prazo, seja por inabilidade com o sistema ou por falta de gente.
Mesmo fazendo essa atualização, ainda estão armazenadas 145.401 doses (diferença entre as 417.810 unidades recebidas e as 272.409 aplicadas). Ou seja, 35% de tudo que foi distribuído à Secretaria Municipal da Saíde (SMS) ainda não foi usado.
Pelo painel da SES, é possível ver que muitas grandes cidades estão com taxas de aplicação abaixo de médias e pequenas localidades. Algumas indicam situações mais críticas, como Eldorado do Sul, que só ministrou 3,2% das 4.942 unidades recebidas. Isso significa que apenas 159 pessoas teriam sido vacinadas. "Estamos monitorando e vendo o que aconteceu", diz a coordenadora.
RS já recebeu 10 lotes de imunizantes; março lidera com quase 1,3 milhão de doses. Foto: Gustavo Mansur/Palácio Piratini
Lotes de vacinas recebidos pelo Rio Grande do Sul
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Doses recebidas pela SES: 2.216.450
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Doses distribuídas aos municípios: 2.142.155
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Doses aplicadas (1ª e 2ª): 1.310.766
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Doses aplicadas do total distribuído: 61,2%
Fluxo de chegada dos lotes mês a mês
Janeiro: 511,2 mil doses
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Dia 18 (1): 341,8 mil doses da Coronavac
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Dia 24 (2): 116 mil doses de Oxford/AstraZeneca
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Dia 25 (3): 53,4 mil doses da Coronavac
Fevereiro: 412,4 mil doses
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Dia 7 (4): 193,2 mil doses da Coronavac
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Dia 24 (5): 135 mil doses de Oxford/AstraZeneca e 84,2 mil doses da Coronavac
Março: 1.292.850 mil doses
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Dia 3 (6): 174,8 mil doses da Coronavac
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Dia 9 (7): 187,8 mil doses da Coronavac
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Dia 17 (8): 318,2 mil doses da Coronavac
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Dia 20 (9): 285,8 mil doses da Coronavac e 36,25 mil doses de Oxford/AstraZeneca
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Dia 26 (10): 227,4 mil doses da Coronavac e 62,6 mil doses de Oxford/AstraZeneca
Fonte: Vacinômetro RS