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Permissionários do Mercado Público podem disputar concessão
Presidente da Associação do Comércio do Mercado Público Central aponta temores e propostas para mercadeiros entrarem no leilão
O Mercado Público de Porto Alegre deve encarar em 2020 uma das suas maiores mudanças. O comando deve passar para um gestor privado. O modelo, que a prefeitura da Capital, não abre mão, gera temores, questionamentos e movimentação acelerada dos chamados mercadeiros, que são os atuais permissionários. É grande a chance que os comerciantes façam parte de um dos grupos para disputar o leilão para assumir o mercado por 25 anos.
Na semana passada, pelo menos três investidores fizeram propostas para os permissionários entrarem como sócios na Sociedade de Propósito Específico (SPE) a ser criada para se habilitar à concessão de uso, revela a presidente da Associação do Comércio do Mercado Público Central (ASCOMEPC), Adriana Kauer. Um deles já enviou proposta que começa a ser examinada. Adriana aposta que é possível estar em um dos grupos, mas destaca que o mais decisivo é que os comerciantes sejam parceiros, independentemente de quem vença. Em novembro, deve ser publicado o edital com as regras finais, quando se saberá quantas das 84 sugestões feitas em consulta pública serão acatadas. Audiência teve questionamentos e críticas.
JC – Quando surgiu a proposta da concessão, a associação tentou retomar o convênio?
Adriana - Foi a primeira coisa que oferecemos aos integrantes da atual gestão. Mas não foi aceito. Eles diziam não, não, não e não, ponto. O convênio seria muito mais rápido, muito mais fácil.
JC – A associação pode concorrer na modelagem da concessão?
Adriana – Como está o edital, a associação não pode, pois não tem fins lucrativos. Além disso, não temos como comprovar R$ 12 milhões no contrato social, exigência para se habilitar. O que pode é sermos sócios, como comerciantes, de algum investidor em um consórcio, constituindo uma SPE, para entrar na concorrência. E já fomos procurados por três investidores que querem fazer este namoro com a gente.
JC – Quem são os investidores?
Adriana – Não posso revelar nomes, mas são dois de fora do Estado e outro tem sócio minoritário gaúcho. Nenhum é 100% daqui. São investidores que atuam com shopping e na área de administração de empreendimentos. O legal disso é que eles tiveram a sensibilidade que, para dar certo (a concessão), tem de levar junto os permissionários. Um dos investidores já formalizou proposta e outros dois conversaram e devem oficializar suas ofertas. Por outro lado, quem ignorar a força dos mercadeiros acabará se inibindo. Por isso, deveria ter algum item no edital sobre esta participação. Não temos como saber, claro, se o investidor que poderá compor com a gente vai vencer. Acho que terá mais interessados buscando essa parceria.
JC - Como vai ser a participação dos mercadeiros em um consórcio?
Adriana - Ainda não tivemos uma conversa, não falamos ainda, estou falando pela primeira vez sobre isso com o Jornal do Comércio. Tenho certeza que as pessoas vão se animar e querer fazer parte da SPE.
JC - O que os porto-alegrenses vão ver de mudança no mercado com a concessão?
Adriana - Espero que vejam um mercado reformado, que continue na essência como é, mas melhorado. Se for algo pasteurizado nenhum porto-alegrense e gaúcho vai gostar. O Mercado Público é tão perfeito que fala o que é no próprio nome. O mercado é um prédio lindo, mas o mercadeiro é a alma.
Adriana fala da trajetória do negócio da família: 'Meu pai inventou o sacolé'
A presidente da associação dos comerciantes do Mercado Público, Adriana Kauer, vive desde os 12 anos a rotina do local. A partir dos 17 anos, Adriana passou a se dedicar integralmente ao ponto da família, o número 11, que fica na lateral voltada ao terminal de ônibus. A presidente conta a trajetória do seu pai, Tercio Kauer, que abriu a loja em 1983. O pai de Adriana faleceu em 1996, e ela faz questão de contar as mutações e evoluções do negócio que está na família há 36 anos. Em uma das sacadas, o mercadeiro Kauer inventou o sacolé. Confira mais detalhes no trecho da entrevista em que Adriana conta a história no Mercado Público:
"Meu pai comprou o ponto em 1983, que abrigava venda de fumo. Meu pai trabalhava com venda de sacos plásticos, na época em que o plástico não era tão demonizado (risos). Ele montou a loja, e a prefeitura veio e disse que não podia vender plástico, pois o mercado é um centro de abastecimento intimamente voltado para alimentação. O pai decidiu colocar, então, um freezer de picolé que pelo menos não vu embora de imediato e até decidir o que iria colocar de produto. Foi um verão muito quente e muita gente comprava picolé na nossa loja. O pai aí pensou: ‘Por que vou ficar vendendo picolé de uma marca bem conhecida e ganhando centavos? Vou fazer meu próprio picolé’. Ele, então, dividiu a loja e montou uma fabriqueta de picolé, espaço de 3x3 metros. Deu outro verão muito quente, e as pessoas compravam o produto de forma insana, formavam filas e filas. Aí mais uma vez o seu Tércio pensou: ‘Peraí, estou ganhando dinheiro fazendo picolé. Por que as pessoas não podem ganhar dinheiro com isso também?’ O pai, então, foi além e começou a comercializar o pó de sorvete e picolé fracionado. Na época, só quem comprava esses ingredientes era quem tinha sorveteria e indústria, e ele acabou trazendo para o consumidor final um produto que era restrito. Isso foi muito legal, pois muitas pessoas começaram a comorar para fazer em casa. A loja do pai foi a primeira no Brasil a vender pó de picolé e sorvete para consumo final. E as pessoas começaram a ganhar dinheiro. Sabe os famosos sacolés? Meu pai se deu conta que não bastava fazer sorvete, e para fazer o picolé, as pessoas teriam gastos com palito, forma etc. Como a gente vendia saco plástico, o pai teve a sacada de colocar o líquido dentro de saco plástico. Meu pai foi o inventor do sacolé. Hoje uma coisa que todo mundo conhece. A gente acha que as coisas vêm de longa, mas o sacolé foi inventado por um comerciante dentro do Mercado Público. As pessoas vinham e contavam quanto estavam ganhando, muito sustentavam filhos. Era muito bonito ouvir. Aí meu pai, pensou: ‘As pessoas estão ganhando dinheiro no verão, mas elas precisam fazer alguma coisa no inverno para ganhar dinheiro. Algumas lojas vendiam chocolate. Aí ele foi conferir como seria e se deu conta que as pessoas tinham de fazer chocolate.’ Isso foi agregando, começamos a vender. Meu pai me mandou ara a Argentina para estudar confeitaria, pois aqui não tinha curso extensivo. Fui estudar e voltei e coloquei artigos de confeitaria na loja. Isso foi em 1992. A própria loja foi uma evolução, tanto que hoje o que tu menos vê é a gente vendendo saco plástico."