Dos 171 casos de discriminação racial no futebol brasileiro nos últimos três anos, entre 2019 e 2021, apenas 35, ou 20% do total, tiveram algum tipo de punição. Embora quatro deles estejam em andamento, a maioria das situações não resultou em sanções para clubes, torcedores ou dirigentes. Especialistas apontam que a descrença das vítimas no desfecho dos casos, falhas na legislação e a falta de negros na composição dos tribunais desportivos ajudam a explicar o quadro.
Os dados são do Observatório da Discriminação Racial, entidade que propõe ações afirmativas a partir de relatórios anuais sobre casos de discriminação no esporte desde 2014. A partir das informações da entidade, aourou-se que, dos 82 casos de injúria racial em 2019, 18 tiveram sanções. Em 2020, foram cinco em 36 ocorrências. Em 2021, a proporção subiu: de 53 situações, houve dez análises.
Foram episódios analisados pelos tribunais estaduais e também pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), que verifica os casos em grau de recurso. Quando o recorte é apenas do STJD, observa-se que o órgão parece ter a "mão mais pesada".
Segundo o próprio tribunal, 12 casos de injúria racial no futebol foram julgados nos últimos três anos. Destes, oito receberam punições variadas (multas e suspensões de atletas e dirigentes), dois tiveram absolvições (por descaracterização da acusação) e outros dois estão em andamento.
Neste ano, as ocorrências continuam frequentes. Já foram 13 (até março) e a temporada nacional ainda está apenas no começo. Os atos de racismo são tão recorrentes que há situações em que o mesmo jogador já foi discriminado ao atuar por clubes diferentes.
Isso aconteceu com o zagueiro Eduardo Bauermann, contratado pelo Santos neste ano. Em novembro de 2019, o defensor, então no Paraná Clube, enfrentou o Atlético-GO pela Série B do Campeonato Brasileiro, em Goiânia (GO). No aquecimento, ele foi chamado de "macaco" por um torcedor adversário. No fim do confronto, registrou um boletim de ocorrência e o agressor foi expulso da Torcida Dragões Atleticanos.
Em janeiro do ano seguinte, o zagueiro, já no América-MG, ouviu ofensas racistas de um integrante da torcida organizada do seu próprio time. O torcedor foi novamente expulso, mas Eduardo não registrou boletim de ocorrência.
No futebol, casos de racismo são caracterizados como injúria racial, de acordo com o artigo 243-G do Código Brasileiro de Justiça Desportiva. Nessa categoria, eles preveem penas de um a três anos de prisão. Mas existe a possibilidade de conversão em trabalho social ou pagamento de cestas básicas - as punições mais comuns no País. Por outro lado, a lei estabelece o racismo como um crime inafiançável.