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Publicada em 13 de Agosto de 2019 às 03:00

Os tratados internacionais e a dificuldade em efetivá-los

Dom Paulo Evaristo Arns (1921-2016)

Dom Paulo Evaristo Arns (1921-2016)

ROVENA ROSA/AGÊNCIA BRASIL/JC
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Jornal do Comércio
O ex-cardeal e arcebispo de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns se destacou na defesa dos perseguidos políticos durante a ditadura militar. Com trabalho junto aos mais pobres, ficou conhecido como o “cardeal dos direitos humanos”. Foi o fundador da Comissão Justiça e Paz de São Paulo, na qual se notabilizou pela condenação intransigente da tortura.
O ex-cardeal e arcebispo de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns se destacou na defesa dos perseguidos políticos durante a ditadura militar. Com trabalho junto aos mais pobres, ficou conhecido como o “cardeal dos direitos humanos”. Foi o fundador da Comissão Justiça e Paz de São Paulo, na qual se notabilizou pela condenação intransigente da tortura.
A barbárie da Segunda Guerra (1939-1945) fez o mundo abrir os olhos para a necessidade de balizadores que garantissem o respeito aos direitos básicos de todo ser humano. A Declaração Universal (1948) lançou os princípios que guiaram a criação dos tratados internacionais. Hoje, não faltam normas. Por que, então, as violações seguem ocorrendo? No segundo caderno especial tratando sobre os direitos humanos, o Jornal da Lei aborda a legislação internacional e a real efetividade dos tratados. Em entrevista exclusiva, o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos fala sobre a crise das democracias e os riscos para os DH.

Punições à violação de tratados são pouco efetivas

O que acontece quando uma nação viola os direitos humanos de seus cidadãos? Para evitar que as populações fiquem reféns de governos tirânicos ou negligentes, foram criados diferentes instrumentos internacionais de pressão e condenação a estados e indivíduos violadores de direitos, mesmo quando a violação cometida não é considerada crime dentro daquele país.
A defesa dos direitos humanos está designada, sobretudo, a órgãos internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização dos Estados Americanos (OEA), que materializam juridicamente esses direitos a partir de pactos internacionais, jurídicos e políticos. A partir da assinatura desses pactos pelos estados, eles se comprometem a cumpri-los e as organizações internacionais se incumbem de vigiar e fazer com que as nações respeitem o que foi assinado. A atuação não é somente judicial, condenando estados, mas também política, com recomendação de ações de políticas públicas, por exemplo, para melhorar pontos de um pacto firmado.
No entanto, apenas a sentença condenatória a uma nação não significa que ela será efetivamente responsabilizada por suas violações aos direitos. Assim, a imagem é de que as punições são mais simbólicas - gerando mal-estar diplomático com outros países - do que concretas.
Uma vez assinado um tratado internacional de direitos humanos, o Estado tem três obrigações: respeitar, garantir e satisfazer. Respeitar exige que não interfiram no gozo dos direitos humanos, enquanto garantir demanda que os estados se oponham às violações desses direitos por terceiros, e satisfazer os obrigam a adotar disposições legislativas, administrativas, orçamentárias e judiciais capazes de promover os direitos humanos.
Os tratados permitem que estados afeitos aos direitos humanos tenham legitimidade para agir em defesa deles. Os efeitos práticos de um ato que contrarie um pacto internacional são variados - a família de uma vítima que perdeu a vida por conta de omissão de um agente público pode ser indenizada monetariamente, e o Estado pode, também, ser obrigado a rever uma política pública.
"Muitos tribunais internacionais de direitos humanos têm condenado, por exemplo, a construir um hospital e colocar o nome da vítima nele, ou não só equipar uma escola, mas também habilitar seus profissionais. São sentenças exemplificantes", aponta o presidente do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, Renato Zerbini Ribeiro Leão.
Desde dezembro de 2009, os tratados internacionais de direitos humanos têm hierarquia superior às leis brasileiras, pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), ficando acima de todos os códigos, como penal, civil, tributário ou de trânsito, e tendo equivalência constitucional em alguns casos. Os tratados permitem que juízes e tribunais invalidem normas internas que entrem em desacordo com o estabelecido por esses instrumentos internacionais.
Doutor em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Valério Mazzuolli celebra o fato de os tratados de direitos humanos estarem sendo cada vez mais aplicados pelo Poder Judiciário brasileiro. O jurista aponta que, guardada a soberania de cada nação em decidir como incorporará os tratados à normativa interna, seu cumprimento deve ser sempre uniforme, e os tratados devem ser usados como paradigmas aplicados para dar direitos aos cidadãos.
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