Não é de hoje que especialistas preveem mudanças no mercado de trabalho em virtude do avanço tecnológico. Contudo, estudo inédito divulgado pela Universidade de Brasília (UnB) conseguiu materializar o quanto a evolução pode afetar algumas áreas. Segundo o levantamento, 30 milhões de postos de trabalho estão ameaçados pelo fechamento ou substituição de seus ocupantes por máquinas.
O número representa 54% dos empregos formais no País. O estudo feito pelo Laboratório de Aprendizado de Máquina em Finanças e Organizações da instituição levou em conta 2.602 ocupações, e apontou que 25 milhões de trabalhadores estão em áreas com probabilidade muito alta (acima de 80% de chance serem afetadas) ou alta (entre 60% e 80%) de automação. O número foi alcançado após a consulta dos pesquisadores a acadêmicos e profissionais do campo de Inteligência Artificial (IA), cruzando as respostas com atribuições das atividades para avaliar o risco.
A diretora de soluções e serviços da SAS na América Latina, Mônica Tyszler, vê os trabalhos mais operacionais com risco mais concreto de serem atingidos, e entende que os trabalhadores dessas áreas devem se antecipar a essas probabilidades. "Como em qualquer área, precisamos sempre nos aperfeiçoar e buscar novas habilidades. Mesmo que a tecnologia ocupe alguns postos, ainda é necessário abastecê-la", explica a diretora.
Nesse caso, Mônica relativiza a afirmação do total desaparecimento de algumas profissões. O estudo da UnB aponta profissões como recepcionista, cobrador de transporte público e carpinteiro como fadadas à substituição. No entanto, para a diretora, a IA não se sustenta apenas por conta própria. "Não adianta eu ter um profissional que saiba programar muito bem um robô se ele não souber fazer outras coisas importantes para essa criação", afirma.
Profissionais ligados à psicologia, para o entendimento das emoções, de marketing, para divulgação do projeto e de planejamento são alguns exemplos de áreas associadas ao desenvolvimento tecnológico. Por isso, na visão de Mônica, será ainda mais fundamental o entendimento dessas questões para a IA evoluir.
Mulheres podem ser mais afetadas
Outro estudo, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial, trouxe um diferente viés sobre a automação. Para os pesquisados, o avanço da Inteligência Artificial pode aumentar a disparidade entre homens e mulheres, uma vez que elas "não são encorajadas" a seguir para essas áreas. O relatório aponta que apenas dois em cada 10 profissionais na área de IA são mulheres, diferença três vezes maior em relação a outros setores da indústria. Além disso, há baixa representatividade delas em áreas essenciais para o desenvolvimento da tecnologia, como pesquisa, matemática e engenharia, e isso pode ter reflexos na programação das máquinas. Levando em conta todo o mercado de trabalho no mundo, a projeção é que se leve 202 anos para haver paridade entre os gêneros.
Especialista sugere ter mais de uma carreira
Empresas querem perfis mais generalistas, afirma Sabrina Malinoski
PRODUTIVE/DIVULGAÇÃO/JC
As mudanças provocadas pela tecnologia no mercado de trabalho devem trazer forte impacto, sobretudo no setor de serviços e de mão de obra braçal, no qual boa parte das vagas é ocupada por pessoas com baixa renda. Ao andar por
shoppings, restaurantes e até mesmo no transporte público, por exemplo, é possível ver cadeiras vazias, antes ocupadas por trabalhadores e agora substituídos por máquinas.
A tendência se estende para setores como a indústria. Uma pesquisa realizada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) mostrou que 62% dos brasileiros empregados no setor temem perder seus postos para robôs dentro de 10 anos. No entanto, a maioria deles tem a convicção que retornarão ao mercado de trabalho, se as previsões pessimistas se confirmarem.
Por isso, a consultora de carreiras da Produtive, Sabrina Malinoski, afirma que o trabalhador precisa cada vez mais ser protagonista em sua vida profissional, ou seja, buscar conhecimento, ter pró-atividade e estar constantemente atualizado com as práticas da profissão. Menos cética em relação ao futuro tecnológico, a consultora vê a evolução como parceira do ser humano. "Advogados e contadores, por exemplo, lidam com uma carga de informação gigantesca. Um software é capaz de absorver o trabalho pesado e facilitar a vida deles em consultas e tomadas de decisão", avalia Sabrina.
Referente ao setor terciário, como comércio e serviços, a consultora de carreiras avalia como essencial a busca pelo estudo, com cursos e formação profissional, para que o trabalhador não dependa exclusivamente dessa ocupação durante toda a vida. "Há muito tempo, vivíamos e morríamos sendo profissional de uma área específica. Hoje, é comum seguirmos várias carreiras", explica Sabrina. Acostumada a assessorar executivos, ela percebe em seus clientes uma busca cada vez maior por outras ocupações para ampliar os horizontes. Tornar-se empreendedor ou seguir como docente são algumas das opções escolhidas.
Acima de tudo, Sabrina vê nas empresas a busca por um perfil de profissional mais "generalista", ou seja, capaz de operar em mais de um campo com excelência. Ela também ressalta que o surgimento de novas profissões a partir da tecnologia deve ser considerado pelos estudantes ao ingressarem na faculdade, sob uma condição. "É preciso se perguntar: eu gosto disso? Terei prazer em trabalhar com o assunto por vários anos? Não adianta escolher uma profissão tendência nos próximos anos e não se identificar", afirma a consultora.
As 10 profissões mais ameaçadas pela automação...
- Taquígrafo
- Torrador de café
- Cobrador
- Recepcionista de hotel
- Cumim (auxiliar de garçom)
- Salgador de alimentos
- Serrador de madeira
- Mestre de galvanoplastia
- Leiloeiro
- Gerente de almoxarifado
... e as 10 profissões menos propensas ao risco da tecnologia
- Engenheiro de telecomunicações
- Psicanalista
- Engenheiro de sistemas operacionais em comunicação
- Restaurador
- Analista de suporte computacional
- Técnico em enfermagem
- Estatístico-Agente de ação social
- Médico oftalmologista
- Artesão voltado à materiais recicláveis
Fonte: Estudo: 'Na era das máquinas, o emprego é de quem? Estimação da probabilidade de automação de ocupações no Brasil' e Universidade de Brasília