O novo embaixador da Argentina no Brasil, Daniel Scioli, esteve em Porto Alegre nesta sexta-feira (30), onde manteve uma agenda de encontros com líderes empresariais gaúchos. Scioli, que assumiu a embaixada em agosto, foi escolhido para o cargo pelo presidente Alberto Fernández com a missão de normalizar as relações diplomáticas entre os dois países, que vinham abaladas desde 2019, devido a críticas trocadas entre o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, e colega argentino, geradas por diferenças ideológicas.
Na sede da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), Scioli encontrou-se com dirigentes de empresas que realizam comércio com o país vizinho, especialmente do setor automotivo, calçadista, moveleiro e agroalimentar. Na ocasião, ouviu demandas relativas a dificuldades que as companhias brasileiras têm para realizar negócios no país vizinho, como barreiras para emissão de licenças de importação e a burocracia para liberação de produtos nas aduanas, entre outras questões.
Scioli abordou as posições oficiais sobre a economia de seu país, política e comércio da relação bilateral. O embaixador também ouviu propostas dos diferentes setores industriais presentes. “Venho com minha experiência política e executiva ser um agente de integração, já estive com o presidente Jair Bolsonaro e o encontro com o setor produtivo no Rio Grande do Sul tem como objetivo de trabalhar juntos pela indústria dos dois países”, disse o embaixador, que já foi vice-presidente da Argentina e governador da Província de Buenos Aires.
“Temos tudo para construir e desenvolver uma boa relação e estamos aqui para colaborar”, ressaltou Petry, que esteve acompanhado do coordenador do Conselho de Comércio Exterior (Concex) da Fiergs, Aderbal Lima.
A relação comercial do Brasil com a Argentina tem sofrido forte impacto nos últimos anos. A corrente de comércio entre os dois países caiu mais de 35% no ano passado, comparado com 2018. Em 2020, de janeiro a setembro, a redução já supera os 25% na relação com o mesmo período de 2019. Com o Rio Grande do Sul, as quedas foram de 17% e 26%, respectivamente, na comparação com os mesmos períodos. O país é o terceiro maior destino das exportações gaúchas e o maior fornecedor do Estado.
'É preciso que ajuda seja mútua', diz Scioli
Jornal do Comércio - As relações diplomáticas entre Brasil e Argentina sofreram alguns abalos, devido às trocas de críticas entre os presidentes Jair Bolsonaro e Alberto Fernández. Como está buscando a normalização de relações?
Daniel Scioli - Minha primeira missão é recompor o diálogo institucional com os presidentes Bolsonaro e Fernández e os ministros dos dois países. Precisamos trabalhar como o Brasil para aprofundar a integração comercial, energética e de infraestrutura, por exemplo. Temos estabelecido um respeito à vontade popular e às ideologias dos governos de cada país. Mas é preciso lembrar que temos uma história comum muito forte. Nossa vocação é fortalecer a integração. Já me reuni com vários ministros para tratar de temas comuns, como Tarcísio Freitas (Infraestrutura), Bento Albuquerque (Minas e Energia) e Tereza Cristina (Agricultura). Precisamos estabelecer uma agenda inovadora e objetiva.
JC - O comércio bilateral sofreu muito com a pandemia de Covid-19. Recentemente a Argentina perdeu lugar entre os três maiores destinos das exportações brasileiros, ficando em quarto lugar, algo que não acontecia desde 2002. Como resgatar este comércio?
Scioli - Precisamos trabalhar junto com as organizações empresariais, com uma agenda de complementação e integração produtiva maior, explicando a situação econômica e a agenda argentina, que vai gerar benefícios e incentivos a quem investir lá, além de facilitar as barreiras burocráticas. Mas é preciso que a ajuda seja mútua. Há muitas barreiras também do lado brasileiro. Nos últimos 15 anos, a Argentina acumula um déficit comercial com o Brasil que soma US$ 52 bilhões. Não queremos comprar menos do Brasil, mas precisamos que nos permitam vender mais aos brasileiros. Uma solução seria destravar alguns produtos, como camarão, mel e uva, por exemplo. No último mês, já aumentou em 15% o intercâmbio com o Brasil, e em outubro deve aumentar ainda mais. A recuperação vem cada dia mais forte, e isso é bom para nossas economias.
JC - O que os empresários gaúchos podem esperar do governo argentino para melhorar seu comércio com o país vizinho?
Scioli - O Rio Grande do Sul é um lugar estratégico para a Argentina, por sua indústria automotora, de caminhões, pelo setor agroalimentar, entre outros. Existe um grande interesse das empresas gaúchas de aprofundar seus vínculos, muitas delas já têm investimentos na Argentina, e entendem as oportunidades para conseguir mais integração e produção no nosso país. Geramos um mecanismo de consulta permanente através do nosso consulado aqui. Deixei claro aos empresários que terão um canal direto com o governo argentino. Na próxima semana, terei reuniões com todos os ministros da Argentina com que tem relações com empresários brasileiros para buscar resposta às suas demandas.