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CEEE será dividida em três para privatização
Estratégia do governo pretende atrair mais concorrentes para o processo que deve ocorrer no mês de setembro
A CEEE não passará apenas por um processo de privatização, passará por três. Atualmente, o grupo é constituído pela CEEE-D (braço de distribuição) e CEEE-GT (que atua nas áreas de geração e transmissão de energia). Em fato relevante divulgado nessa terça-feira ao mercado, a estatal comunicou que seu acionista controlador, o governo gaúcho, decidiu dividir os segmentos de geração e transmissão, em decorrência do procedimento de desestatização.
O secretário do Meio Ambiente e Infraestrutura, Artur Lemos Júnior, destaca que existem no mercado players do setor de transmissão que não geram energia, assim como o contrário. Um dos fatores que foram determinantes para a cisão das empresas do grupo foi a percepção que cada concorrente agregado na disputa aumenta o apelo de retorno financeiro da privatização. A venda conjunta poderia afastar alguns possíveis interessados e, com a separação, deve aumentar o número de participantes na concorrência. O dirigente reforça que a medida está embasada em análises que contam com a consultoria do BNDES, que acompanha o processo de alienação da estatal.
O diretor-presidente do Grupo CEEE, Marco Da Camino Ancona Lopez Soligo, detalha que, para fazer a cisão, será preciso criar um CNPJ novo e separar contas a pagar e a receber, espelhar os sistemas de TI e dividir os ativos em termos contábeis e regulatórios. "Dá bastante trabalho", admite o dirigente. Ele adianta que terá que ser contratada uma consultoria para elaborar um laudo de cisão que precisará ser aprovado pelo conselho da empresa e Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O dirigente calcula que esse processo de separação levará de três a quatro meses para ser completado. Alguns empreendimentos, como subestações e usinas, serão mais fáceis de definir em que empresa ficarão. Mas, há estruturas, como prédios, cuja a decisão é mais complexa.
Soligo recorda que o principal imóvel que a companhia possui partilhado é a sua sede em Porto Alegre. Ainda não está determinado em qual empresa ficará o ativo, contudo o dirigente acredita que ficará sob o guarda-chuva da transmissora, que será maior do que a geradora. Apesar de ser considerada um valioso ativo, o diretor-presidente do Grupo CEEE reforça que, no momento, a ideia é de que a área da sede não seja incorporada no processo de privatização e fique para o Estado.
Conforme o secretário do Meio Ambiente e Infraestrutura, os leilões dos três segmentos da estatal não serão feitos na mesma data, sendo que o braço de distribuição será o primeiro a ser vendido. Sobre os impactos da crise do coronavírus no processo de privatização, Lemos comenta que ainda é cedo para fazer uma avaliação neste momento, durante o pico da epidemia, pois isso poderia implicar uma decisão futura equivocada. Ele acrescenta que os trabalhos das consultorias e as reuniões continuam ocorrendo, de forma virtual, para que em maio ou junho possa se ter uma imagem mais precisa de como o mercado estará se comportando.
"Por enquanto, todo o calendário está mantido, sem alteração", enfatiza. A ideia original é que a distribuidora seja alienada em meados de setembro, mas o secretário frisa que será necessário analisar o panorama após o período mais intenso dos problemas criados pelo coronavírus. Lemos salienta que o governo não fará a privatização a qualquer custo e sim para obter o melhor resultado para a sociedade gaúcha. Ainda sobre os impactos da pandemia, o diretor-presidente do Grupo CEEE diz que já foi possível perceber uma queda de cerca de 15% da demanda de energia na área de concessão da distribuidora nos últimos dias.
CEEE-D tem prejuízo de R$ 1 bilhão
Apesar de pertencerem ao mesmo grupo, os desempenhos financeiros da CEEE-D e da CEEE-GT são bem distintos. Conforme os balanços das companhias, em 2019, a área de distribuição teve um prejuízo de R$ 1,082 bilhão, contra um revés de R$ 989 milhões no ano anterior. Já a empresa de geração e transmissão obteve um lucro líquido de R$ 391 milhões, em relação a outro resultado positivo de R$ 176 milhões em 2018.
O secretário do Meio Ambiente e Infraestrutura, Artur Lemos Júnior, diz que a performance ruim da distribuidora era esperada, pois os prejuízos vêm se repetindo. A dificuldade da companhia, ressalta o secretário, concentra-se na sua geração de caixa. Porém, o dirigente acrescenta que os resultados negativos não inviabilizam a privatização da estatal. "Quem tem interesse em uma empresa como essa é quem tem recursos disponíveis para fazer as correções e os investimentos necessários para retomar o caminho do crescimento", argumenta.
Sobre o lucro da área de geração e transmissão, Lemos pondera que se trata de uma empresa mais enxuta que a distribuidora e que pode se concentrar em investimentos pontuais em um segmento mais consolidado, proporcionando caixa suficiente. O secretário não vê contradições em privatizar uma companhia que dá lucro. Ele enfatiza que é preciso questionar se o serviço prestado pela estatal é uma atividade essencial em que o Estado precisa atuar ou se não há dentro da inciativa privada alguém que possa atender a essa demanda de uma maneira igual ou melhor. Lemos sustenta que o poder público pode ser o regulador e o fiscalizador dessas operações, cobrando a qualidade no retorno apresentado pelo empreendedor.
Separação das companhias não surpreende mercado
A visão da Fiergs e do Sindicato dos Eletricitários do Rio Grande do Sul (Senergisul) quanto à privatização da CEEE é totalmente antagônica, mas nenhuma das entidades demonstrou surpresa com a decisão de segregar as áreas de geração e transmissão do grupo. A presidente do Senergisul, Ana Maria Spadari, contrária à alienação da estatal, recorda que o governo já sinalizava que a divisão poderia render mais dinheiro no momento da venda.
A dirigente afirma que a medida, no dia a dia dos funcionários, não mudará a forma de atuar. Sobre o argumento que a privatização poderia fazer com que a empresa tivesse melhores condições de operação, Ana Maria enfatiza que a prestação de serviços da CEEE não deixa a desejar em relação às companhias privadas do setor, inclusive a respeito da RGE (que assumiu dois terços da área de concessão que anteriormente eram de responsabilidade da estatal). Ela enfatiza ainda que fornecimento de energia se trata de um serviço essencial.
A presidente do Senergisul defende que o governo do Estado, para melhorar as condições financeiras da CEEE, deveria dar mais atenção a uma ação judicial que busca o reconhecimento do custo que a companhia teve com os ex-autárquicos (antigos servidores aposentados vinculados à empresa) a partir de 1993. Os ex-autárquicos oneram até hoje o grupo e o valor da causa é estimado em mais de R$ 8 bilhões. A estatal já havia conquistado o direito a R$ 3 bilhões devido a créditos com a Conta de Resultados a Compensar (CRC), relativa à compensação de pagamentos a ex-autárquicos e inativos até o ano de 1993.
O diretor e coordenador do Grupo Temático de Energia do Conselho de Infraestrutura da Fiergs, Edilson Deitos, favorável à privatização, considera a estratégia de separar as empresas para a venda como adequada, podendo atrair mais interessados na disputa. Sobre a velocidade da alienação dos ativos, o dirigente enfatiza que o trâmite envolvendo empreendimentos estatais não é tão rápido como os de uma empresa privada. "E na hora do leilão o governo terá que ter sabedoria ao avaliar se o momento é propício ou não", aponta. O integrante da Fiergs afirma que é difícil visualizar como estará o mercado e o setor elétrico após passar os efeitos da pandemia, entretanto acredita que o segmento de geração, pelo menos, deverá retomar em breve os investimentos.