A falta de água gerada pelo aumento do consumo na última semana de 2019 e nos primeiros dias do novo ano provocou desconforto para parte das pessoas que passaram o Natal e Réveillon em Gramado. Segundo o presidente do Sindicato da Hotelaria, Restaurantes, Bares, Parques, Museus e Similares da Região das Hortênsias (Sindtur- Serra Gaúcha), Mauro Salles, o desabastecimento ocorrido nos últimos dias obrigou, inclusive, alguns empresários a comprarem o produto de caminhões pipa particulares. "Devido ao excesso de chamadas junto à Corsan, era preciso aguardar um cronograma de entrega, gerando problemas para alguns empreendimentos."
Segundo Salles, o impacto só não foi maior porque a maioria dos hoteleiros e proprietários de pousadas em Gramado possuem reservatórios. Em nota, a Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) informou que foram atingidos os bairros localizados nas zonas mais elevadas das cidades e que manteve o abastecimento normal para mais de 95% da população. O restante foi atendido com 14 caminhões pipa. Existem 33 reservatórios de água em Gramado, com capacidade total para mais de 7 milhões de litros. Também foi ampliado o fornecimento de água em 5 milhões de litros por dia, segundo a Corsan, que ainda aumentou o tratamento em 22% e a reservação em mais de 60%.
Além das altas temperaturas, o período contou (a exemplo de anos anteriores) com um grande número de visitantes, em função da alta temporada na cidade, promovida por conta do evento Natal Luz, que encerra neste domingo. "A demanda por consumo de água dobra na alta temporada", explica o prefeito de Gramado, João Alfredo Bertolucci. Ele avalia o atual contrato com a Corsan como "ordinário (no sentido de comum)". "Deveria ser especial, porque a cidade conta com 36 mil habitantes e 23 mil leitos oficiais, sem contar os que são gerados por aluguéis de temporada", defende. Com demanda em dobro, a adutora e os reservatórios existentes não têm dado conta do problema já há alguns anos.
"Falta fornecimento de água potável, apesar dos bons canais de distribuição", avalia Bertolucci. Ele afirma que notificou a companhia de abastecimento, e obteve retorno positivo. "Nos prometeram apresentar um plano emergencial nos próximos dias." Também informa que a situação já está sob controle, com alguns problemas pontuais em bairros mais distantes ou mais altos. Esta será a segunda vez, no intervalo de um ano, que a Corsan precisará destinar planejamento para resolver a questão do desabastecimento durante a alta temporada em Canela e Gramado. Em março de 2019, a companhia entregou a duplicação parcial de 3 km da tubulação que capta água em uma barragem em São Francisco de Paula. De lá, o recurso hídrico bruto é levado para duas estações de tratamento (ETAs) em Canela, para depois ser distribuído em Gramado e região.
Em vista deste investimento, a expectativa era de que este ano não ocorressem falhas no sistema de abastecimento, destaca o presidente do Sindtur-Serra Gaúcha. "Estivemos em contato com o poder público, que por sua vez falou com a diretoria da Corsan. Estamos aguardando uma solução", comenta Salles. Ao ressaltar que "vários" hotéis e pousadas tiveram problemas com a falta de água em algum momento entre o recente período de Natal e Ano Novo, o dirigente comenta que a entidade pretende propor uma solução para a Corsan. "Além de investir em estrutura de abastecimento, é preciso trabalhar a questão do consumo. Neste sentido poderiam ser doados (pela Companhia) restritores de vazão de água para os poucos empreendimentos do trade que ainda não possuem este equipamento e caixas d'água para a população de baixa renda."
Aluguéis de temporada e propriedades fracionadas agravam problema
Há descontrole na oferta e na demanda de quartos, diz Mauro Salles
/CRISTINE PIRES/ESPECIAL/JC
Não bastasse Gramado contar com a demanda da hotelaria, que tem número de leitos praticamente igual ao volume de habitantes na cidade, ainda é preciso considerar outro mercado ligado ao turismo, que aumenta o consumo de água. "Os veranistas vêm para suas casas, trazendo parentes e amigos, e há também o grande número de consumidores de aluguel de temporada e proprietários de residências no modelo fracionado, que virou febre na cidade", comenta o prefeito, João Alfredo Bertolucci.
"Há um descontrole na oferta e na demanda", concorda o presidente do Sindtur Serra-Gaúcha, Mauro Salles. "Tem gente que aluga uma casa para dois, mas chegam dez pessoas, e tudo isso sobrecarrega o sistema", destaca o dirigente.
Ao pontuar que muitos hotéis já estão prevenidos, munidos de reservatórios, e destacar que "quem sofre é a população local e mais simples", o gestor do município também critica o crescimento desordenado da hotelaria. "Não justifica a falta de água uma vez que é região turística, seria fundamental ter uma infraestrutura adequada para enfrentar estes picos de consumo", pondera. O desencontro da oferta e demanda vem ocorrendo nos últimos quatro anos, segundo o presidente do Sindtur-Serra Gaúcha. "A hotelaria e o comércio estão tendo que baixar os preços, e já ocorre uma guerra tarifária para manter a ocupação, o que acaba por desqualificar o serviço", lamenta. "Nosso receio é que esse problema perdure e prejudique nossa região."
Na opinião de Salles, o poder público deverá replanejar o crescimento tanto de Gramado, quanto de Canela, que sofre dos mesmos problemas, mas numa proporção menor. "O ticket médio dos turistas caiu em 30%, assim como a taxa de ocupação hoteleira que baixou de 65% para 50%", informa. O dirigente pondera que, por outro lado, o atual cenário acaba beneficiando "o bolso do turista, porque, pelo menos os preços estão mais em conta do que há dois ou três anos atrás." O dirigente comenta que, no caso do abastecimento de água, já houve sinalização da Corsan de que será providenciada uma segunda adutora para transportar a água que sai de São Francisco de Paula para as cidades vizinhas.