Boschin comenta que foi feita uma conta obscura, que não leva em consideração os benefícios da geração distribuída para o setor elétrico como o fato de ser uma energia renovável e diminuir as perdas com o deslocamento da eletricidade oriunda das grandes usinas, que estão distantes dos maiores centros urbanos. O advogado reforça que a situação traz insegurança jurídica para o setor, não podendo se afastar a hipótese de judicialização da questão.
Empreendedores criticam proposta
Surpreendido por uma proposta desequilibrada e que utiliza uma metodologia diferente da Análise de Impacto Regulatória (AIR) apresentada no início do ano pela Aneel. Assim define seu sentimento o presidente da Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD), Carlos Evangelista.
"A sugestão divulgada agora não busca o equilíbrio do mercado, e sim a perpetuação do monopólio das distribuidoras", acusa. Segundo o dirigente, a ideia atual foi mal vista pelo mercado, por quase todos os agentes, o único setor que avaliou bem foi o das distribuidoras. Para Evangelista, sem dúvida, se aprovada, essa medida vai refrear o crescimento da geração distribuída no País. "As análises que fizemos demonstram que, em praticamente todos os estados, a geração distribuída fica inviável", alerta. O presidente da ABGD comenta que o tempo de retorno financeiro com a atividade cresce para 25 anos ou mais (a média atual no País, segundo a associação, está entre quatro e nove anos). "Ou seja, vai cair bastante o desenvolvimento das energias renováveis no Brasil, principalmente na área de micro e minigeração distribuída", adianta.
Os pontos críticos da modificação são, conforme Evangelista, levar em conta um cenário no qual serão cobradas as perdas, as taxas e os encargos de transmissão e vários outros componentes que a geração distribuída ajuda a mitigar. "Cobrar transmissão de quem gera a própria energia e injeta na rede, que nem utiliza esse serviço, é um absurdo completo", avalia. Para chegar em um regramento adequado para o setor, a primeira sugestão da ABGD é que preservem como estão as conexões efetivadas antes da publicação da revisão da Resolução Normativa nº 482. Evangelista acredita que ainda é possível sensibilizar a Aneel e fazer alterações na proposta antes do texto final ser oficializado (que deve ocorrer no primeiro semestre de 2020).
O presidente-executivo da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), Rodrigo Sauaia, defende que o desafio do órgão é fazer a conta dos custos e dos benefícios com a adoção da geração distribuída, colocar na balança, e alcançar um ponto de equilíbrio. "E não se observou isso", lamenta o dirigente. Sauaia destaca que a Aneel propôs na consulta pública que as regras atuais para quem já investiu na geração distribuída (ou seja, para quem já instalou os painéis fotovoltaicos) vigorem até 2030. O presidente-executivo da Absolar recorda que a agência falava, anteriormente, em manter a norma para esses consumidores por 25 anos, e não somente 10 anos. "O sinal que passa para o mercado é ruim", frisa.
O dirigente acrescenta que a geração distribuída representa apenas 0,2% dos consumidores de energia do País. São cerca de 84 milhões de unidades de consumo no mercado cativo, faturados pelas distribuidoras, e 145 mil consumidores com geração distribuída. "É meia gota no oceano, por isso mudar a norma agora é prematuro, é o momento errado", sustenta Sauaia.
Abradee ressalta que outros consumidores são onerados com regras atuais
Para a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), a Resolução nº 482 da Aneel, criada em 2012, criou condições extremamente favoráveis, como a isenção de custos, para o crescimento da micro e minigeração distribuída. E isso ocorreu em uma época em que os custos das placas fotovoltaicas eram muito elevados. Entretanto, essas condições extremamente favoráveis para alguns têm um efeito colateral negativo: parte da economia da conta de energia de quem instala o sistema é arcada pelas distribuidoras e depois ocasiona aumento das tarifas de energia elétrica dos demais consumidores.
"A micro e minigeração não precisa mais desses subsídios para continuar a crescer", afirma a Abradee, através de nota. Pela regulamentação atual, os consumidores que usam a geração distribuída acabam pagando menos pelos serviços das distribuidoras, embora continuem usando suas redes. Isso significa que os demais consumidores vão pagar pela diferença, enfatiza a associação. Além disso, esses usuários ficam desonerados de outros componentes da conta de energia, como os encargos setoriais.
Se a regra não for alterada, em, aproximadamente, dois anos, esse subsídio será da ordem R$ 2,5 bilhões anuais, adverte a Abradee, dado a pouco mais de 600 mil beneficiados. Segundo a associação, o que se propõe com a revisão das regras é que os beneficiários da micro e minigeração distribuída paguem, como os demais usuários, adequadamente pelos serviços prestados pelas distribuidoras de energia e pelo setor elétrico, evitando, assim, o aumento das tarifas dos demais consumidores.
O diretor da Aneel, Rodrigo Limp, destaca que a medida permitirá o avanço responsável da geração distribuída, que permanece atrativa, sem gerar passivos para os demais consumidores. "A proposta em consulta reconhece que a geração distribuída veio para ficar, que a modalidade está crescendo exponencialmente e alcançou a maturidade; portanto, é tempo de revisarmos o normativo, para, mais adiante, não termos um efeito colateral negativo ao sistema elétrico", afirma. Os estudos realizados pela agência indicam que, mesmo com a alteração do regulamento, o retorno do investimento em geração distribuída continua muito atrativo. O payback (retorno) do investimento, de acordo com a Aneel, é estimado em quatro e cinco anos.
Ministério da Economia reforça custo da atividade
O Ministério da Economia produziu um documento chamado Micro e Mini Geração Distribuída: Perguntas e respostas, em que também ressalta o ônus para os outros consumidores da rede elétrica devido à prática. O sistema de compensação hoje em vigor para a atividade custaria ao sistema elétrico mais de R$ 56 bilhões entre 2020 e 2035, de acordo com a pasta. Em valor presente, seria equivalente a R$ 34 bilhões.
Conforme o texto do mistério, esse valor seria suficiente para construir mais de 9 mil creches, ou comprar 180 mil ambulâncias, e, "independente de quem pagará essa conta (se o usuário de energia elétrica ou o pagador de impostos), isso é dinheiro que está sendo consumido do bolso do cidadão brasileiro". No trabalho, a pasta cita o exemplo de um microgerador que produz 500 kWh ao longo do mês, principalmente nos dias e horários com maior incidência solar. Esses 500 kWh geram créditos que podem ser consumidos livremente em qualquer outro dia e horário.
O benefício percebido pelo consumidor é equivalente ao valor da tarifa paga à distribuidora, que considera todos os custos do sistema: distribuição, transmissão e geração (centralizada). O ministério enfatiza que cada usuário que deixa de pagar seus custos, "trocando" créditos por energia solar, deixa um custo para trás que deverá ser pago pelo vizinho, que não possui painel fotovoltaico.