A expectativa de retomar a revisão do Plano Diretor de Porto Alegre não foi atendida em 2021, mesmo assim a pauta urbana esteve presente no primeiro ano do governo Sebastião Melo (MDB) à frente da prefeitura. Em diversas declarações nos últimos 12 meses, Melo deu o tom do que espera para o planejamento urbano na Capital: prédios mais altos, desregulamentação e definição das regras para a construção por regiões.
"Existem muitas cidades dentro da cidade" disse Melo a empresários em outubro. Ele trata isso como "vários Planos Diretores" ou "fatiamento", modelo que inaugurou com o projeto que muda as regras para investimentos da construção civil no Centro Histórico - aprovado em novembro e que ainda depende de sanção. Os parâmetros (incentivos urbanísticos, como desconto ou isenção de pagamento por solo criado) serão replicados em outras áreas da cidade, e uma proposta semelhante já foi apresentada para o 4º Distrito.
No entanto, a ideia de dividir o planejamento e definir regras para construção por partes não existe no ordenamento jurídico brasileiro. O Estatuto da Cidade, lei que orienta o planejamento urbano no Brasil, define que "o Plano Diretor deverá englobar o território do Município como um todo". Para sustentar a opção da prefeitura, Melo e a equipe da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade falam em planos setoriais, se valendo de definições previstas no Plano Diretor de Porto Alegre, como as áreas de revitalização e os projetos especiais.
Outro assunto recorrente no discurso do chefe do Executivo é a crítica à "cidade espalhada", que ele aponta como um problema por obrigar o poder público a levar infraestrutura para lugares afastados do Centro. Para combater isso, defende o adensamento das áreas centrais com prédios mais altos, embora seja consenso entre especialistas que essa relação não é direta.
A ideia do prefeito não é criar um novo limite de altura, e sim acabar com ele. Em reunião aberta com vereadores em dezembro, chamou de "mediocridade" o que classificou como "redução" da discussão do Plano Diretor à definição da altura de novas edificações. Ele quer que essa decisão seja caso a caso, como conseguiu aprovar para o Centro: "se dependesse da minha opinião, o Plano Diretor não tinha que ter (definição de) altura. O Estudo de Viabilidade Urbanística é que tem que dizer 'ali cabem dois andares, ali cabem 10, ali cabem 30, ali cabem 100 ou 200 metros'".
Esses são posicionamentos que agradam o mercado da construção civil, ao mesmo tempo que preocupam entidades ligadas ao planejamento urbano. Mesmo com a revisão do Plano Diretor parada em 2020 e 2021 por causa da pandemia, alterações seguem acontecendo pontualmente, com a participação muitas vezes restrita ao ambiente virtual. Esse é um dos pontos na mira de investigação do Ministério Público Estadual, assim como a ideia de fatiar o planejamento.
Sebastião Melo conhece o terreno e o tamanho do desafio que está enfrentando - vale lembrar que ele presidiu a Câmara Municipal em 2008 e 2009, quando tramitou a primeira revisão da lei que instituiu em Porto Alegre o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental (PDDUA). A escolha de fazer alterações por partes pode ser entendida como a forma que o prefeito encontrou para garantir protagonismo no planejamento da cidade no seu mandato à frente do Paço Municipal.
Paralelas
Protagonismo
A articulação com o Legislativo a cada novo projeto apresentado e a ampla base que formou na Câmara garantiram ao prefeito Sebastião Melo facilidade para aprovar as propostas do governo colocadas em votação no ano que se encerra. A mudança no Plano Diretor para o Centro, por exemplo, foi aprovada em menos de quatro horas de sessão, com 26 votos favoráveis e 10 contrários. A resistência vem somente da oposição e parece não preocupar. Com isso, o Executivo tomou para si o protagonismo na pauta urbana, que no passado já foi compartilhado com a Câmara.
Pauta urbana em 2022
O primeiro tema urbano de Porto Alegre a ser debatido na Câmara Municipal em 2022 deve ser a mudança na área do estádio Beira-Rio para permitir a construção de duas torres. Também tramita um projeto da prefeitura com nova alteração na lei do Solo Criado. Na sequência, a expectativa é avançar com a proposta que cria um programa de incentivos para investimentos no 4º Distrito.
Revisão do Plano Diretor
Sem anunciar data de início, a prefeitura apresentou novamente, na semana passada, as cinco etapas que integram a revisão do Plano Diretor. Assim que retomado, o processo será realizado ao longo de 20 meses. A projeção é enviar para a Câmara em 2023.