Novo projeto da prefeitura altera o Plano Diretor na Zona Sul da Capital

Ministério Público questiona mudança pontual em área conhecida como Fazenda do Arado

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Medida cautelar será mantida até a decisão sobre o pedido de liminar do MP Estadual; audiência de conciliação está marcada para o dia 13 de dezembro
Além da intenção de mudar regras para construção no Centro Histórico, com direito a visita do prefeito Sebastião Melo (MDB) à Câmara para a entrega da proposta, a prefeitura de Porto Alegre também quer modificar o Plano Diretor na área conhecida como Fazenda do Arado. O Projeto de Lei Complementar (PLC) Nº 24/2021, que define novo regime urbanístico da área na Zona Sul, chegou ao Legislativo um dia depois do texto para o Centro. Pela medida, ficam alterados os limites do quanto pode ser construído e do número de habitantes previstos.
O objetivo, anunciado no primeiro artigo da proposta, é viabilizar o parcelamento do solo pela Arado Empreendimentos Imobiliários, proprietária do terreno de 426 hectares, que pretende vender condomínios residenciais. Nos terrenos próximos das avenidas que ligam a Fazenda com o restante do bairro Belém Novo, também são previstas unidades comerciais e de serviço. A justificativa, conforme a prefeitura, é a descrita no artigo 21 do Plano Diretor, o qual define que o município irá promover ações políticas e instrumentos para gerenciamento do solo, incorporando oportunidades empresariais aos interesses do desenvolvimento urbano.
Mas, além do trâmite legislativo, o projeto de lei enfrentará um debate nos tribunais. Isso porque alguns dias antes, em 23 de setembro, o Ministério Público (MP) Estadual entrou na Justiça com pedido liminar que tenta impedir a tramitação do projeto. A Ação Civil Pública é assinada por duas promotorias de Justiça, a de Habitação e Defesa da Ordem Urbanística e a de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre.
As demandas expressas no documento são duas: que a prefeitura não enviasse a proposta para a Câmara e, caso já tivesse enviado, que o Legislativo não desse andamento. O caso foi remetido à 10ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Porto Alegre. Em despacho no dia 30 de setembro, a juíza Nadja Mara Zanella determinou a intimação das partes a prefeitura de Porto Alegre, a Câmara Municipal e a Arado Empreendimentos Imobiliários para que se manifestem no prazo de 10 dias.
O propósito dessa medida no Judiciário é ter acesso a mais elementos para a análise do caso e somente após isso será analisado o pedido de antecipação de tutela. Como a apreciação pela juíza foi após o envio do projeto à Câmara, a discussão será se o texto terá ou não andamento no Legislativo.
Embora a justificativa do projeto informe que o Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU) do empreendimento foi analisado pela Comissão de Análise Urbanística e Gerenciamento (Cauge), etapa administrativa necessária a projetos de grande porte, o pedido do MP justifica a suspensão do trâmite "a fim de que sejam elaborados todos os estudos, diagnósticos técnicos e debates sobre a alteração do perímetro e do regime urbanístico por ocasião da Revisão do PDDUA (Plano Diretor)".
No pedido, o MP aponta o que seriam ilegalidades na tramitação do processo administrativo, no âmbito da prefeitura, como tratar-se de alteração pontual do Plano Diretor, que encontra-se em andamento. Portanto, a avaliação sobre o regramento urbano na área deveria considerar avaliação conjunta com o contexto da cidade. Ainda conforme a ação, não há Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (EIA/Rima) para embasar o pedido de alteração, alegando que o apresentado não é considerado válido. A justificativa se refere a inquérito policial que questiona o documento.
Ou seja, o MP expressa preocupação com as pautas ambiental, pois trata-se de Área de Proteção ao Ambiente Natural, e urbana, por ser um terreno em zona considerada Rururbana, definida como de baixa densificação. Com isso, sustenta na nova ação que mais estudos devem embasar o pedido do empreendedor à prefeitura, bem como o debate precisa acompanhar a revisão do Plano Diretor.

Proposta é tema de debate há uma década

Para entender do que se trata, é preciso recuperar o histórico dessa proposta. O primeiro pedido do empreendedor para mudar as regras de construção na Fazenda do Arado é de 2011, quando estudos de impacto ambiental e de viabilidade urbanística apresentados pela empresa passaram a tramitar na prefeitura. As alterações urbanísticas foram aprovadas pela Câmara e disso resultou a Lei Complementar Nº 780/2015. Em 2017, o Ministério Público conseguiu suspender liminarmente os efeitos da lei, decisão confirmada depois. Ainda cabe recurso, mas a prefeitura abriu mão de recorrer tanto que o PLC protocolado revoga a lei de 2015.
Na época, a Ação Civil Pública questionou o descumprimento do rito, já que alteração do Plano Diretor precisa ter consulta prévia à população, que não foi registrada pela prefeitura. Um projeto do Legislativo aprovado no ano passado tentou recuperar a redação da lei suspensa, mas foi vetado pelo prefeito Sebastião Melo por vício de origem (matéria urbana é de competência do Executivo). Neste ano, em agosto, uma audiência pública híbrida (virtual e presencial no bairro Belém Novo, onde fica a Fazenda do Arado) buscou sanar essa falha.