A recente tentativa de corte de uma árvore no bairro Moinhos de Vento foi o ponto emblemático de protestos e críticas recentes à remoção e à poda de árvores em Porto Alegre. Um ato impediu o corte de um guapuruvu, na rua 24 de Outubro há 10 dias. Em outubro, podas em ruas do Centro Histórico também foram alvo de críticas.
Caso do guapuruvu do Moinhos desencadeou debate sobre gestão ambiental. Foto Jéssica Alvarenga/Divulgação/JC
Na esteira de mobilizações em diferentes áreas da cidade, foi entregue ontem ao Ministério Público Estadual e à Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Smams) um documento, assinado por 47 entidades da sociedade civil - ONGs ecológicas, sindicatos e associações comunitárias - que pedem transparência na gestão ambiental na Capital. "A população não quer simplesmente saber a quantidade de árvores podadas, suprimidas e a velocidade com que esses serviços foram realizados", diz o texto.
Professor do Instituto de Biociências da Ufrgs e um dos coordenadores do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (Ingá), Paulo Brack pede informação sobre árvores a serem suprimidas ou podadas. Ele lembra que, com a reforma administrativa no início da atual gestão municipal, o trabalho de poda que era de competência do órgão ambiental passou para a Secretaria de Serviços Urbanos, o que teria prejudicado o monitoramento por biólogos. A prefeitura garante todas as podas e cortes de árvores são feitos com laudo e responsáveis técnicos.
"Não se tem mais o cuidado em tentar, se tiver um galho podre, podar o galho ao invés de cortar toda a árvore", aponta Brack. Esse é o caso do guapuruvu do Moinhos de Vento, árvore cuja a queda de um galho em 2019 atingiu um carro que passava pela 24 de Outubro. "Reconhecemos que ficou cicatriz do galho que caiu, mas entre isso e decidir o corte de uma árvore belíssima", pondera o professor, que pede análise criteriosa, sob o risco de a cidade perder árvores saudáveis.
No caso das podas no Centro, a prefeitura justifica que intensificou podas nos últimos meses para aproveitar a menor quantidade de pessoas circulando, atendendo solicitação de moradores e realizando cortes após análise técnica. Mas há reclamações de cortes "desnecessários".
Desde julho de 2018, a Capital conta com uma empresa terceirizada para realizar esses serviços, aumentando a média mensal de intervenções de 500 para quase 2 mil. No caso do guapuruvu do Moinhos, por estar em área privada, um laudo particular orientou a supressão da árvore, com autorização da Smams e execução de empresa particular. A árvore de espécie nativa tem mais de 25 metros de altura. O grupo que impediu o corte questiona a empresa que realizava o serviço por não cumprir requisitos previstos em lei, como placa informativa e porte do documento de autorização. "A prefeitura poderia dar acesso a laudos e um prazo para manifestação (em relação ao corte). Se soubéssemos antes, talvez evitaria esse desgaste e certo confronto", pondera Brack.
Entidades pedem "o resgate, a aplicação e o respeito ao Plano Diretor de Arborização Urbana de Porto Alegre" - elaborado nos anos 2000. O texto orienta métodos para preservação, manejo e expansão das árvores na cidade. Na mesma linha, o Ingá defende que a Smams coordene a arborização e pede "uma auditoria quanto a podas e supressões indiscriminadas e sem responsabilidade técnica".
Raio-X dos investimentos
O investimento em gestão ambiental em Porto Alegre foi de R$ 8,2 milhões em 2019, o que corresponde a 0,14% do orçamento municipal. O dado consta na Declaração de Contas Anual feita pela prefeitura ao Tesouro Nacional. Em 2018 o investimento foi de R$ 3,5 milhões ou 0,06% do orçamento. A informação foi obtida na ferramenta Raio-X dos Municípios, desenvolvida pelo Insper a partir de bases de dados públicas.
Histórico de mobilização pela causa ambiental
A iniciativa que impediu o corte do guapuruvu é mais um capítulo da história do movimento ambientalista em Porto Alegre. A campanha contra a poda indiscriminada de árvores foi uma das primeiras da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), em 1971, liderada por José Lutzenberger. Outra ação que está no imaginário porto-alegrense foi a do estudante Carlos Dayrell, que em 1975, subiu em uma árvore tiipuana em frente a faculdade de Direito da Ufrgs, para evitar o corte. Mais recentemente, em 2013, jovens tentaram impedir o corte de árvores para o alargamento de vias próximo da Usina do Gasômetro, porém, não obtiveram sucesso.
Agapan lança selo e campanha pelos 50 anos
Em comemoração aos 50 anos que irá completar em abril de 2021, a Agapan lançou o selo que estampará as peças de comunicação e produtos da entidade, desenvolvido com apoio da agência Veraz Comunicação. Em dezembro entra no ar o novo site da entidade. Mantida por trabalho voluntário, a Agapan está com uma campanha colaborativa para arrecadar recursos para produção de materiais comemorativos aos 50 anos. Para ajudar, basta acessar http://vaka.me/1399652.