Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultoria Reliance. É doutor em economia pela USP
Após muitas décadas de pesquisa, há consenso de que educação de qualidade é um dos principais determinantes das diferenças de produtividade do trabalhador entre países.
Escolarização de qualidade significa que o aluno, ao frequentar a escola, domine conteúdos e habilidades. O diploma tem pouco valor se não é acompanhado de real aprendizado.
Mais recentemente, aprendemos que, além das capacidades analíticas, a educação formal é muito importante para o desenvolvimento das habilidades socioemocionais. Estas englobam as emocionais, como persistência, autocontrole, autoconfiança etc.; e as sociais, como a capacidade de cooperar, de comunicar-se bem, de solucionar conflitos etc.
Apesar de todo nosso atraso, há boas notícias em educação. Não estamos condenados à ignorância. Atrasamo-nos muito a tratar do tema. Em 1950, nossa taxa de analfabetismo era próxima da taxa da Nova Inglaterra (EUA) em 1750.
Adicionalmente, começamos na ordem errada, priorizando o ensino superior. Nos anos 1950, o gasto público por aluno no ensino superior era mais de 50 vezes maior que o gasto no ensino fundamental. Hoje, é 3,6 vezes.
Conseguimos universalizar o ensino fundamental somente nos anos 1990. Em 2007, apenas 28% das crianças da 5º série tinham nível adequado de leitura e escrita. Em 2017, 60% das crianças atingiram esse nível. Grande avanço em uma década. Agradeço a Priscila Cruz, do Todos pela Educação, por chamar a minha atenção para essa boa nova! Há no Brasil casos de sucesso: Sobral, no Ceará; ensino médio integral em Pernambuco; e o grande avanço no Ideb no Espírito Santo.
Nos últimos 20 anos, houve grande progresso no diagnóstico. Os especialistas da área sabem quais são as políticas necessárias para que a qualidade da educação brasileira se equipare, por exemplo, à do Chile, o melhor caso que temos no continente.
Duas ações são as mais importantes. Precisamos cuidar da primeira infância. Creche de qualidade e apoio às mães que não trabalham -por exemplo, reforço do Bolsa Família e melhoras no programa de visitação Criança Feliz.
Aqui me parece haver espaço para a sociedade responder à urgência do problema. O jovem brasileiro, após completar o ensino médio, deveria dedicar um ano de suas vidas colaborando com as famílias carentes no processo de transmissão cultural em geral. O jovem israelense dedica três anos às Forças Armadas. Nossa batalha é com a transmissão cultural para quem por séculos nada teve.
A segunda ação fundamental para melhorar a qualidade da educação é criarmos mecanismos para recrutar os professores entre os melhores alunos do ensino médio. Isto é, que os estudantes de pedagogia estejam entre os 30% melhores do Enem.
Para atingir esse objetivo, será necessário repensar a carreira de professor e todo o contrato de trabalho. Nos próximos anos, muitos professores serão aposentados, e a necessidade de novos mestres será bem menor, pois há hoje menos crianças.
Temos oportunidade única para redesenhar a carreira, com incentivos corretos para atrair os 30% melhores alunos do Enem para a docência: salários maiores; melhores condições de trabalho na escola; emprego em uma única escola em tempo integral; tempo para preparar aulas e corrigir provas; etc.
A insistência do atual ministro da Educação nas escolas militares e na criação de um canal de denúncia "ideológica", estabelecendo um verdadeiro clima policialesco em nossas escolas, não é agenda minimamente conectada aos enormes desafios à frente e às oportunidades que se oferecem para dar um salto de qualidade educacional no Brasil.