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Conselhos se posicionam contra educação exclusivamente on-line
Entidades de Odontologia, Medicina Veterinária, Farmácia e Arquitetura e Urbanismo querem barrar o registro profissional de estudantes formados por meio da modalidade EaD
Cada vez mais em crescimento e com polos até mesmo fora do País, o ensino a distância (EaD) está, novamente, diante de um impasse. O motivo é que conselhos profissionais de diferentes áreas têm aprovado resoluções que proíbem os estudantes formados nessa modalidade de exercerem a carreira.
Só neste ano, ao menos quatro entidades representativas já se manifestaram favoráveis à decisão de recusar o registro profissional de alunos formados a distância. Em fevereiro, seguido pelo Conselho Federal de Odontologia (CFO-BR), os conselhos de Medicina Veterinária e Farmácia também emitiram decisões nesse sentido. Da mesma forma, em março, o Conselho Federal de Arquitetura e Urbanismo (CAU-BR) adotou a medida. Como argumento, todos concordam que não é possível garantir a formação de qualidade apenas com aulas on-line e que atividades práticas são essenciais às respectivas profissões.
Para o CAU-BR, o curso de arquitetura e urbanismo está relacionado com a preservação da vida e bem-estar das pessoas, da segurança e integridade do patrimônio, além da preservação do meio ambiente, o que, portanto, têm impactos diretos sobre a saúde do indivíduo e da coletividade, necessitando experiências práticas para a compreensão de cada conteúdo. "O curso têm como base a condição geográfica e espacial, ao mesmo tempo que o convívio é fundamental para a vivência e o questionamento do próprio espaço, sendo impossível passar essa experiência da relação professor/aluno a distância", diz a nota oficial do CAU-BR.
Com polos nas mais diversas localidades, o ensino a distância se expandiu mesmo em meio à crise econômica, o que não aconteceu na modalidade presencial. Em 2017, o EaD recebeu ainda um incentivo com o decreto do ex-presidente Michel Temer, que facilitou a regulamentação e abertura de novos polos educacionais no País. Em pouco mais de um ano da implementação do decreto, o Ensino Superior a distância teve um crescimento de 6.583 para 15.394 vagas, segundo o Ministério da Educação (MEC). A alta de 133% resulta da diminuição das exigências para a oferta da modalidade.
Conforme o levantamento realizado pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF-BR), o número de vagas autorizadas pelo MEC para cursos a distância na área da saúde teve um aumento significativo. Em fevereiro de 2017, foram ofertadas 274.603 vagas pela modalidade, já em janeiro de 2019 esse número chegou a 913.300.
Na área da Arquitetura e Urbanismo a situação não foi muito diferente. Conforme o último estudo realizado pelo CAU, existem no Brasil 32 instituições de ensino autorizadas pelo MEC a oferecer 84 mil vagas em mais de 400 polos. Desse total, nove são cursos a distância com turmas em andamento.
Para o presidente do CAU-RS, Tiago Holzmann da Silva, a decisão das entidades de vetar o registro profissional de alunos formados a distância busca alertar os estudantes sobre a falta de orientação presencial. "Temos o entendimento que a formação exclusivamente por ferramentas EaD não é o suficiente e não atende às exigências que as nossas profissões apresentam. Alguém formado a distância não tem condições de aprender tudo que é necessário para a formação de um bom profissional", destaca Silva, completando que, no País, ainda não há turmas formadas na modalidade no curso de Arquitetura e Urbanismo.
Segundo Silva, o ensino EaD é importante, mas não é o suficiente para a formação dos alunos. "Nós não temos nenhuma restrição quanto ao modelo de ensino a distância, pelo contrário, ela é uma ferramenta que tem um potencial muito grande para qualificar o ensino, mas não é o suficiente para substituir todo o ensino presencial", diz.
De acordo com o presidente do CAU-RS, é preciso uma discussão aprofundada sobre o tema junto ao MEC, pois as responsabilidades precisam ser compartilhadas. "Precisamos definir em conjunto o assunto, ou seja, precisamos fazer toda a organização do ensino e da profissão, porque o MEC entende de ensino e nós entendemos da profissão. Se não trabalharmos juntos, o ensino vai ser de má qualidade".
No mesmo sentido, o Conselho Regional de Farmácia do Rio Grande do Sul (CRF-RS) também se manifestou contrário ao ensino exclusivamente a distância. Por meio de nota, a presidente Silvana Furqui, informou que a metodologia de ensino EaD é uma realidade muito útil para diversas situações, mas não é o suficiente para suprir as necessidades práticas que a profissão exige. "Pelo menos 70% das disciplinas de graduação em Farmácia exigem a prática, ou seja, laboratórios bem estruturados onde serão ensinadas a manipulação de medicamentos, produtos biológicos, tecidos humanos, entre outros".
Conforme Silvana, os cursos ofertados exclusivamente por essa modalidade não oferecem um grau mínimo de qualidade aos alunos, pois os afastam de práticas imprescindíveis à formação. "Defendemos um ensino de qualidade, pois os profissionais formados irão oferecer seus serviços para a população, que necessita de segurança para o seu atendimento em saúde".
Impasse na justiça
A Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes) informou, por meio de nota, que vem atuando junto ao Ministério da Educação (MEC) no sentido de impedir as constantes tentativas de usurpação de poder proferidas pelos conselhos profissionais. A Abmes comunicou ainda que está buscando o Judiciário como forma de coibir essa atuação das entidades e fazê-las se explicarem judicialmente a respeito da irregular e ilegal restrição ao registro profissional.
"A ação da Abmes está fundamentada no fato de que proibir a inscrição e o registro de egressos de cursos ofertados na modalidade a distância extrapola, em grande medida, a competência dos conselhos, além de ir de encontro ao marco legal vigente no País", diz a entidade.
De acordo com o advogado Rafael da Cás Maffini, a educação a distância consiste em uma modalidade educacional legítima e legalmente prevista, conforme consta no art. 80 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, regulamentado por uma série de atos normativos. "Se os cursos estão devidamente autorizados e credenciados pelo Ministério da Educação, mostra-se indevida qualquer conduta que restrinja os efeitos de uma formação acadêmica que se encontra devidamente autorizada pelos órgãos competentes".
Para Maffini, é incoerente que os conselhos queiram definir quem terá acesso ou não ao registro. "Por mais respeito que mereçam os conselhos profissionais, não parece haver legitimidade para refutar um grau acadêmico ou mesmo criar restrições para o exercício profissional, se derivada tal formação de um curso devidamente reconhecido pelo Ministério da Educação".
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