O Rio Grande do Sul tem o maior número de empresas de aviação agrícola do País, com 72 empresas e 42 operadores privados (produtores rurais ou cooperativas que têm seus próprios aviões). O Estado também conta com a segunda maior frota nacional, de 426 aeronaves, atrás apenas do Mato Grosso, com 494 aviões. Neste ano, o setor ganhou ainda mais visibilidade com a ameaça de invasão de milhares de gafanhotos vindos da Argentina e do Paraguai. O Sindicado Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag)
esteve de prontidão, por cerca de dois meses, caso a nuvem de insetos ingressasse em solo brasileiro - o que ainda não é um risco descartado, ressalta o presidente do sindicato, Thiago Magalhães.
Atualmente, o Sindag é um dos principais envolvidos no debate que o Brasil está fazendo, em consulta pública, sobre novas regras para o uso de drones e o uso desses equipamentos para pulverização agrícola. E, ao contrário do que podem muitos pensar, o Sindag vê nessa tecnologia uma aliada, e não uma concorrente. Tanto que, desde 2016, o sindicato conta com empresas de drones entre suas afiliadas.
Empresas & Negócios - Qual é a relevância da aviação agrícola no Rio Grande do Sul?
Thiago Magalhães - É um setor muito importante para o agronegócio gaúcho, principalmente quando falamos em arroz irrigado, onde fica complicado, e até inviável em muitos casos, a pulverização por tratores, em razão do terreno.
E&N - A questão dos gafanhotos deu muita visibilidade para o setor, recentemente. O que mudou a partir desse evento?
Magalhães - Isso trouxe uma imagem muito positiva. Sempre tentamos mostrar a importância da aviação agrícola a quem normalmente não tem noção de como funciona o agronegócio como um todo. Quando a pessoa pensa nos gafanhotos entrando em sua casa, ela se imagina correndo até a despensa e pegado o inseticida. Agora, percebe melhor para que serve a aviação agrícola e que, em situação de crise, pode ser fundamental para a segurança alimentar do País, pois os insetos podem devorar grandes lavouras e pomares de frutas. É como se fosse uma verdadeira guerra para a qual tínhamos uma arma para combater. Não é uma situação isolada: essas nuvens existem há tempo na Argentina e no Paraguai e devem se tornar mais frequentes.
E&N - Isso pode se refletir de alguma forma nos negócios?
Magalhães - A questão dos gafanhotos ajuda na imagem, mas não vejo como ganho em termos de negócios. Tanto que ofertaríamos aeronaves para uso gratuito do Estado. Muitos empresários cederiam aeronaves e pilotos para a ação, até porque, se isso afeta a produção agrícola, todos perderíamos ali adiante. Acredito que a aviação agrícola tem de continuar fazendo um bom trabalho e desenvolvendo tecnologias, com atenção e treinamento constante. Nosso principal compromisso, como o plano que elaboramos para o Ministério da Agricultura, de combate ao gafanhoto, é o cuidado com o momento da aplicação, de que produto usar e como fazer para que não venha a prejudicar nenhum setor, nem o urbano, nem o agronegócio.
E&N - A aviação agrícola teve uma atuação importante no combate a um grande incêndio na região de Alegrete, em abril, o que mostra a diversidade do setor e suas aplicações. Esse também é um foco de negócios?
Magalhães - Esse é um setor que acreditamos ter grande tendência de avanço no País, graças ao crescimento da consciência ecológica e de preservação de florestas e matas e da necessidade de melhores práticas. Agricultores e governos começam a olhar com mais atenção à fauna e à flora. Muitas vezes, preocupam-se com a aplicação química na lavoura, mas, com o tempo seco, esquecem das queimadas ou acham que são naturais e que nada podia ser feito para evitar. Mas, há, sim, formas de minimizar esses danos, e aviação agrícola está inserida nisso. Hoje, temos vários estados que não contratavam aviação agrícola para combate a incêndios e agora começam a fazê-lo. O Distrito Federal, por exemplo, passou a contratar, depois comprou aeronaves, assim como ocorreu no Mato Grosso, que comprou aeronaves e treinou bombeiros. São Paulo contrata todos os anos, desde 2013. Neste ano, uma licitação foi aberta para contratação no Mato Grosso do Sul, e o Instituto Chico Mendes também usa o serviço. Mesmo no setor privado, isso vem aumentando, como em grandes indústrias de celulose e de cana de açúcar, montando suas brigadas de incêndio com aeronaves, não apenas para manter suas reservas florestais obrigatórias, como também suas próprias culturas.
E&N - O setor está envolvido com a proposta para regulamentação do uso de drones. Como está o andamento desse tema?
Magalhães - Sempre ressaltamos aos empresários do setor que os drones são uma tecnologia de aplicação aérea, e um serviço a mais que a aviação agrícola pode oferecer, e não um concorrente. Se for em uma área maior, pode-se oferecer a aviação. Se for uma área menor, pode ser o drone. Inicialmente, o que vemos é uma expansão das vendas desses equipamentos com até 25 quilos. Então, seria mais uma substituição da bomba costal de aplicação de químicos. As novas gerações não querem mais ter usar a bomba costal e ter contato com os agroquímicos mesmo que seja para aplicação em pequenas propriedades e hortas. Isso pode ser substituído por pequenos drones que, aos poucos, ganharão mais recursos. Como empresário, vejo uma tecnologia segura, e temos que fazer de tudo para que se desenvolva. Nessa discussão da normativa que está aberta, trabalhamos com diferentes setores e junto ao Ministério da Agricultura, de forma que a legislação proteja a segurança jurídica do negócio, mas que não seja tão restritiva a ponto de impedir que a tecnologia se instale no País.
E&N - Quais são as principais propostas do Sindag para essa regulamentação?
Magalhães - Uma das discussões é sobre quem pilotará o drone, já que se trata de uma profissão nova: o piloto remoto (RPA), É preciso ter uma grade de ensino planejada, especialmente para os drones de maior porte, o que está em discussão na Anac (Agência Nacional de Aviação Civil). O debate também inclui questões como distâncias permitidas para o uso da tecnologia. Fala-se em 50 metros de distância de residências e cursos de água, mas em um sítio, por exemplo, às vezes esses 50 metros já estão quase fora da propriedade. Outro ponto tratado é que todo o drone utilizado com químicos deve ter um plano de descontaminação e uma zona de para descarte de resíduos. No caso dos aviões, existe um pátio de descontaminação. No drone, tem que ter um projeto, mas qual? Isso não pode ficar em aberto porque gera insegurança em fiscalizações futuras. Essas são quatro lacunas que precisam ser melhoradas na legislação.