Marcelo Beledeli
Há quase 50 anos no mercado de educação, o Grupo A passa por um processo de transformação. Fundada em 1973 como uma livraria por Henrique Kiperman, a empresa, que se tornou uma editora líder na área acadêmica - especialmente com o selo Artmed -, hoje, volta-se para tecnologias de educação (edtech) e se torna referência nacional do segmento no País. Com faturamento anual de R$ 200 milhões, 700 colaboradores, mais de 1 milhão de brasileiros em sua plataforma de ensino (a Blackboard) e 2,4 mil títulos ativos em seu segmento editorial, reúne, atualmente, um grande portfólio de negócios que integra conteúdo, tecnologia e serviços, com marcas como McGraw-Hill, Blackboard e Sagah.
A mais nova aposta é o projeto Campus, que disponibilizará troca de conhecimento e inserção em projetos e atividades de ensino, pesquisa e extensão em uma plataforma. "Com esse negócio novo, devemos dobrar o faturamento da empresa nos próximos dois anos", explica o presidente do Grupo A, Celso Kiperman,
Empresas & Negócios - Por que a empresa está vivendo esse processo de transformação?
Celso Kiperman - Tenho uma crença pessoal que o que não cresce, apodrece. É fundamental que as empresas, para se manterem saudáveis, invistam em negócios novos e estejam sempre buscando o crescimento. Tenho a maior paixão pela indústria editorial, mas ela está vivendo um ponto de inflexão, não cresce há muito tempo e vem perdendo relevância, importância e faturamento. O nosso grande mérito foi percebermos nosso real negócio: que não éramos editores, mas sim uma empresa de educação. Não precisávamos ficar restritos à atividade editorial. O nosso negócio editorial é, hoje, uma linha de conteúdo dentro de um contexto maior de uma empresa de educação. Essa foi nossa grande sacada. Vejo o exemplo da Kodak. Ela sucumbiu sendo uma empresa excelente, fazia com perfeição seus produtos (filmes e máquinas fotográficas), revelação de fotos, fazia um serviço impecável, mas que ficou obsoleto. Nossa virtude foi ter ampliado nosso horizonte.
E&N - As edtechs serão o novo carro-chefe?
Kiperman - Estamos com essa iniciativa, que vai mudar radicalmente a cara da empresa, que é o Campus. Usamos todas nossas soluções de edtech, mas, ao invés de vendermos, fazemos parceria com algumas instituições. Hoje, já temos 15 parceiros. Aportamos plataformas e fazemos a operação, especialmente a parte de captação e vendas das instituições. Estamos virando operadores de educação a distância. Por exemplo, o negócio editorial, hoje, representa menos de 30% do nosso faturamento, que é de R$ 200 milhões. Com o Campus dando certo, devemos dobrar o faturamento da empresa nos próximos dois anos, e esse crescimento vai se dever, principalmente, a essa nova operação.
E&N - A empresa sempre se destacou como uma das raras editoras especializadas fora do eixo Rio-São Paulo. Como essa distância do Centro do País influenciou os negócios?
Kiperman - Acho que essa questão de estarmos no Rio Grande do Sul foi importante para nosso sucesso editorial. Aqui, temos um tecido social e acadêmico diferenciado, o que sempre foi importante, como fonte de bons autores locais e ótima produção científica. Além disso, sempre tivemos felicidade de contar com bons tradutores técnicos. Podíamos contar com profissionais mais qualificados e com custo menor do que em São Paulo, por exemplo. Claro, por estarmos longe do mercado, tivemos que lançar alguns artifícios, como abrir filiais. No entanto, hoje, temos nos questionado bastante se faz sentido ou não estarmos localizados no Rio Grande do Sul.
E&N - Por que há essa dúvida?
Kiperman - Sempre foi conveniente estarmos aqui, pelo tecido social e acadêmico local, mas esse tecido está se esgarçando e, hoje, com a maior complexidade de nosso negócio, precisamos trazer profissionais de fora, mais caros e onerosos, pois têm competências mais específicas. Temos cinco diretores, dos quais quatro vieram de fora, só um é gaúcho. Claro, por um lado, isso me preocupa, como gaúcho, ter que buscar profissionais fora do Estado, mas também mm envaidece como empresário conseguir trazer pessoas que estavam bem empregados em empresas boas devido ao propósito do nosso projeto. Além disso, ertamente, neosso mercado não é aqui. O Rio Grande do Sul representa apenas 5% do faturamento.
E&N - Planejam sair do Estado?
Kiperman - Hoje, não tem possibilidade de sair daqui, porque estamos investindo em outra sede aqui em Porto Alegre, no 4º Distrito, um investimento de cerca de R$ 8 milhões. Devemos começar a mudança em maio e terminar até dezembro. Tomamos decisões que são difíceis de serem revertidas, mas, se fossem tomadas hoje, talvez nosso destino fosse diferente.
E&N - Como os efeitos da crise econômica afetaram a empresa?
Kiperman - Esse mercado de educação superior e de ensino a distância (EaD) é muito sensível às questões macroeconômicas. Quando o nível de desemprego sobe 1%, isso já impacta no número de novas matrículas. Nos últimos anos, passamos pela pior recessão da história do País, e também por políticas equivocadas - como o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) -, que inflacionaram os números do setor e criaram perspectivas distorcidas. Várias instituições de Ensino Superior sofreram muito porque fizeram investimentos baseados em números fictícios. Isso provocou uma crise, e, agora, o setor está sofrendo uma acomodação. Mas essa crise nos afetou pouco, porque não operávamos educação superior, somos apenas fornecedores de serviços. Claro, o negócio não cresceu como imaginávamos nos últimos anos, mas passamos ilesos.
E&N - Como vê as tendências para o segmento de educação?
Kiperman - Temos uma expectativa muito grande. No Brasil, havia uma perspectiva do governo de que, em 2015, haveria 10 milhões de alunos no Ensino Superior. Esse número, obviamente, não se realizou. Hoje, temos 8,5 milhões de estudantes. Mas imaginamos que essa população vai crescer. Um dado que acho importante é que, no Brasil, apenas 30% da população que teria idade correta para estar no Ensino Superior o frequenta, enquanto, no Chile, essa proporção chega a 60%. Nos Estados Unidos são 88%. Tem muita gente aqui que gostaria de ter Ensino Superior, então é um mercado que ainda deve crescer. No longo prazo, deve haver uma mudança. Entretanto, um movimento que a gente nota é a diminuição da importância do diploma de graduação. Em empresas de inovação e tecnologia, por exemplo, importa mais dominar ferramentas e competências do que ter um "canudo". Já temos iniciativas, como, por exemplo, um dos nossos parceiros da Tecnopuc do Paraná, que chama Slash, um programa que oferece cursos livres, pílulas de conhecimento, ao invés de cursos longos que entregam um diploma. O conceito é que as pessoas têm múltiplos interesses, que vão mudando ao longo de suas vidas, e, portanto, são oferecidas aulas livres e curtas, para desenvolver competências e habilidades específicas.