A renda média das famílias em níveis ainda baixos pode frustrar as projeções de crescimento para a previdência complementar nos próximos anos. A expectativa de que a aprovação e implementação da reforma da Previdência tenha como reflexo uma maior demanda por parte do consumidor ainda não se confirmou nas estatísticas do setor.
De acordo com os dados mais recentes da FenaPrevi (Federação Nacional de Previdência Privada e Vida), apesar do crescimento de 66,3% na captação líquida de agosto ante igual mês de 2018, o número de participantes ativos subiu apenas 2,2% no período.
Isso indica que ainda há uma baixa adesão de novos entrantes e um produto ainda muito restrito às classes sociais mais altas: a proporção de trabalhadores que possuem um plano de previdência privada em relação à população ativa é de apenas 12,1%. Em termos relativos, significa dizer que, de cada dez pessoas em idade ativa de trabalho, apenas uma possui uma poupança complementar.
O professor Ricardo José Almeida, do instituto Insper, afirma que o grande problema a ser resolvido no país é a renda média da população, que, nos níveis atuais, não permite que o trabalhador das classes mais baixas tenha uma sobra para conseguir poupar. "Os índices de desemprego ainda estão diminuindo em razão do aumento da informalidade, e a renda média das famílias continua a cair. Sem a possibilidade de poupança, é possível que o cenário positivo que está sendo esperado na previdência complementar não se concretize", diz, ponderando que, para que isso mude, novos produtos e incentivos podem ser necessários.
De acordo com a POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) realizada entre os anos de 2017 e 2018, o rendimento médio mensal das famílias brasileiras ficou em R$ 5.426,70. Esse número, no entanto, sofre influência dos 2,7% de famílias brasileiras que concentram 19,9% da renda no País.
Para Diego Kashiwakura, vice-presidente sênior da agência de classificação de risco Moody's, no entanto, o segmento tem ganhado relevância ao longo dos últimos anos, e, ainda que o volume de ativos sob gestão que estão atrelados a esses planos também dependam da renda disponível e da capacidade de poupar, há uma maior percepção entre os trabalhadores sobre a necessidade de reservar uma quantia para o futuro. "O Brasil enfrentou muitas dificuldades, e essa capacidade de poupança está muito ligada ao nível da atividade econômica. Mas esse produto e a própria discussão ao redor da Previdência Social têm traçado uma tendência positiva para o setor. Já estamos colhendo os resultados."
Em um relatório recente, analistas da Moody's avaliam os pontos positivos que a reforma previdenciária brasileira pode trazer para o segmento. Dentre os fatores que contribuirão para uma maior demanda, estão: o envelhecimento da população, os incentivos fiscais atribuídos a planos PGBL e VGBL e a chegada de novos produtos e preços. Do lado das seguradoras, porém, essa diminuição de preços - também muito atrelada à redução das taxas de carregamento e de saída como forma de manter o rendimento dos segurados ante as consecutivas quedas da taxa básica de juros, a Selic - deve ter um limite.
Segundo o superintendente de previdência do Santander, Victor Bernardes, grande parte dos esforços do mercado já se volta para uma diversificação no mix de produtos como tentativa de mudar a concentração em ativos de renda fixa. "É preciso uma mudança de atitude por parte dos ofertantes para saber conversar com todos os públicos e oferecer produtos simples a preços adequados. Esse produto ainda é muito voltado para um público de alta renda, e isso precisa mudar."
"A demanda deve, sim, se intensificar. Mas temos um papel importante de preparar o mercado para esse movimento e democratizar o acesso aos produtos em relação a cada tipo de renda, com um portfólio completo. É um processo completo, mas necessário", afirma o superintendente de previdência da Icatu Seguros, Henrique Diniz.