Governo do Rio Grande do Sul quer 'sensibilizar' TJ para recuperar polo naval

Desembargadores decidem sobre assembleia de credores da Ecovix

Por Patrícia Comunello

Estaleiro Rio Grande possui passivos no valor de R$ 7,5 bilhões
O governo gaúcho vai conversar com os três desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) que julgarão, amanhã, em Porto Alegre, recurso encarado como crucial para o futuro da recuperação judicial da Ecovix. A meta é "sensibilizar" os magistrados sobre os impactos da decisão para a economia gaúcha. A Ecovix, dona do Estaleiro Rio Grande, busca derrubar medida judicial que suspendeu a assembleia de credores que avaliaria a proposta de plano de recuperação envolvendo passivo de cerca de R$ 7,5 bilhões. O estaleiro é a maior estrutura de construção e manutenção de embarcações do Hemisfério Sul e o maior ativo no polo naval montado na década de 2000 em Rio Grande. 
Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e Casa Civil devem marcar encontros individuais entre a manhã de hoje e a de amanhã com os três desembargadores da 6ª Câmara Cível de Direito Privado que estarão na sessão - Luís Augusto Coelho Braga, presidente da câmara e relator do recurso, Ney Wiedemann Neto e Niwton Carpes da Silva. "São decisões extremamente importantes para o futuro do polo naval do Rio Grande do Sul", resumiu o secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia, Evandro Fontana, sobre o tom que o governador José Ivo Sartori recomendou na abordagem do Judiciário, após encontro ontem com prefeitos de Rio Grande e São José do Norte, Universidade de Rio Grande (Furg), legislativos locais e direção da empresa, no Palácio Piratini.
O foco é manter os ativos, neste caso um equipamento no dique seco avaliado em US$ 1 bilhão, ou cerca de R$ 3,5 bilhões. "O Sartori determinou que se faça contato com o Tribunal de Justiça, mas respeitando a independência dos poderes. Vamos colocar a posição do Estado", adiantou Fontana. "É uma decisão que cabe ao Poder Judiciário." Nas conversas, os interlocutores do Piratini vão detalhar os prejuízos com a descontinuidade total do polo para a economia. Entre os efeitos, estão o fim de quase 15 mil empregos que a operação do estaleiro gerou no auge das encomendas de plataformas da Petrobras. O dique receberia oito cascos. O estouro da Operação Lava Jato em 2013, escancarando o envolvimento de empreiteiras, como a própria Ecovix, mudou o rumo dos pedidos, cancelados, interrompendo montagens em andamento em 2016, como a da P-71.
A audiência que encheu a mesa nas dependências onde Sartori faz os despachos era considerada peça crucial para mandar um sinal de unidade em torno do resgate do polo ao TJ-RS. Os convidados da audiência foram preparados para influenciar uma entrada em campo do Piratini. A 6ª Câmara Cível de Direito Privado se reúne a partir das 14h para julgar recurso da empresa oceânica que tenta reverter despacho de Coelho Braga, da própria câmara, suspendendo a assembleia de credores que ocorreria em 15 de março em Rio Grande. Um dos acionistas indiretos da Ecovix, o Fundo de Pensão dos Funcionários da Caixa Econômica Federal (Funcef), ingressou no TJ-RS por discordar da inclusão entre os credores do fundo de investimento Brasil Plural. O fundo soma R$ 4,3 bilhões da dívida total, sem incluir impostos. 
Uma fonte que acompanha de perto o processo acredita que a abordagem junto à câmara do TJ-RS pode reforçar o interesse social em jogo. "O plano de recuperação é a proposta de reestruturação da empresa. A forma de pagamento dos credores tem de ser aprovada, modificada ou rejeitada pela assembleia", delineia a fonte. Entre as lideranças locais e mesmo de integrantes do governo, o consenso é que a recuperação pode ser a via mais rápida para o desfecho sobre a operação do estaleiro.
A empresa acumula R$ 7,5 bilhões em dívidas com credores trabalhistas, com garantia real e os quirografários, sem garantia real para débitos. Nessa cifra, não estão dívidas com tributos. O prefeito de Rio Grande, Alexandre Lindenmeyer (PT), lembrou, ao sair da audiência que há duas boas razões para o Piratini se envolver. "A área cedida para o estaleiro era do Estado e o Banrisul é um dos credores", citou. A dívida junto ao banco estadual é de R$ 84,8 milhões.

'O pior é ver equipamentos virando sucata', alerta prefeito

"A melhor maneira de preservar os ativos e equipamentos é gerando empregos e botando a funcionar. O pior é ver aqueles equipamentos virando sucata", alertou o prefeito de Rio Grande, Alexandre Lindenmeyer, que voltou ontem a bater na tecla do risco de colapso do dique, com "impacto ambiental para a área e para o entorno". Isso poderia ocorrer com desgaste das estruturas de metal em caso de paralisação total e manutenção na área. "Além disso, a simbologia de uma falência na indústria naval se alastrará como sentimento de que o setor não tem futuro", completou o prefeito rio-grandino.
Christiano Morales, diretor executivo da Ecovix, observou que o risco ambiental só ocorrerá se os equipamentos permanecerem sem uso ou cuidados. "Como está, vai virar um dique-fantasma." Morales avaliou que a audiência com Sartori "foi muito boa". "Mais é saber o desfecho na Justiça, espero que haja uma conscientização e que se dê continuidade para a assembleia de credores", projeta o executivo, que repetiu, na grande mesa da audiência, os planos para reativar o potencial do dique, que inclui ampliar serviços para processamento de aço - com capacidade de 100 mil toneladas ao ano -, e também a construção naval.
Também é possível direcionar o dique para logística, com embarque e desembarque de mercadorias de navios. "São atividades complementares, que não atrapalham o foco original de construção e reparos de embarcações", garante Morales. Até 2020, a empresa projeta abrir 1,2 mil postos de trabalho com os serviços. Hoje, são apenas 64 empregados diretos e 60 indiretos no estaleiro. Há ainda expectativa de concluir a P-71, com 30% de montagem, "se tiver comprador". Esta possibilidade abriria até mil empregos em 12 meses, plano que seria implementado em 2019.