Buscando dar maior visibilidade ao partido, o Novo lançará o consultor de empresas Mateus Bandeira como candidato ao governo do Estado nas eleições de outubro. Essa será a primeira experiência concorrendo a um cargo eletivo, mas Bandeira já teve passagens pelo Executivo estadual nos governos de Alceu Collares (PDT), Antonio Britto (PMDB) e Yeda Crusius (PSDB), quando presidiu o Banrisul, em 2010.
A privatização do banco gaúcho, que chegou a ser cogitada recentemente durante as tratativas do acordo de recuperação fiscal firmado com a União, é um debate que o pré-candidato pretende pautar no período de campanha. "Parte da dívida que temos (com a União) é resultante desse empréstimo que foi feito para o saneamento do Banrisul", lembra.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Bandeira defende que o ativo do banco poderia render mais em outros tipos de investimentos e critica uma medida anunciada pelo governador José Ivo Sartori (PMDB), de venda de ações do Banrisul para pagar o funcionalismo. "Isso devia ser proibido, porque a despesa corrente tem que ser paga com recursos correntes."
Jornal do Comércio - O Banrisul é um ativo do Estado colocado como passível de vir a ser privatizado. O governo diz que não vai ser neste momento, mas não descarta a possibilidade. Aconteceria na sua gestão?
Mateus Bandeira - O Banrisul, hoje, tem um desempenho muito inferior ao que tinha no ano passado. É verdade que o Banrisul é lucrativo? É verdade. É verdade que é diferente de todas as demais estatais, porque opera num ambiente competitivo? É absolutamente verdade. Quem estiver insatisfeito com a CEEE não tem o que fazer, tem que mudar de cidade. Quem estiver insatisfeito com a Corsan tem que mudar de cidade. Esses operam em monopólio. Quem estiver insatisfeito com o Banrisul atravessa a rua e abre uma conta no Itaú, no Santander, no Banco do Brasil, no Sicredi, na Caixa Federal, onde quiser. Tem vários competidores. O fato de que o banco tem que lutar pela sobrevivência no mercado faz com que seja melhor que as demais estatais.
JC - Qual a justificativa para a privatização?
Bandeira - A questão é a seguinte: o Banrisul cumpre um papel diferente dos demais bancos? Não. Ele cumpre o mesmo papel que os demais bancos no meio financeiro, como um agente financeiro, como um intermediário que capta recurso e que empresta recurso para empresas e para pessoas. Não é um banco de fomento, como o Bndes, que usa recursos públicos para emprestar e a taxas menores, subsidiadas por dinheiro de impostos, de forma absolutamente questionável. Mas o Banrisul é um banco comercial igual os demais. Inclusive, está entre os bancos que têm uma das taxas de juros mais altas. O argumento do governo que não pode privatizar porque o banco dá lucro é verdadeiro? É meia-verdade.
JC - Por quê?
Bandeira - O retorno que temos sobre o capital que está empregado lá é maior que o custo da dívida, por exemplo? Não podemos esquecer que todos os gaúchos pagam uma dívida com a União, e parte desses 13% vem de uma dívida assumida quando o Estado, na época do governo Britto, decidiu ficar com o banco e saneá-lo. Parte da dívida que temos com a União é resultante desse empréstimo que foi feito para o saneamento do Banrisul. Tudo bem, foi uma decisão do governo. O retorno que se recebe hoje é maior do que o custo da dívida? Não. Então esse é o primeiro ponto. Tem algum lugar onde aplicar esse dinheiro melhor do que onde ele está? É uma boa pergunta também. Se ele fosse aplicado em Títulos do Tesouro Direto, ele possivelmente renderia mais. Ou poderíamos aplicar isso pagando um pedaço da dívida? Ou devolvendo o dinheiro aos gaúchos? Aliás, se fizermos essa pergunta aos 11 milhões de habitantes - o banco vale R$ 22 bilhões, por suposição, e vamos devolver R$ 2 mil para cada gaúcho -, acho que a resposta sobre a privatização seria diferente. O banco é nosso?
JC - Além desse aspecto financeiro, a avaliação sobre a privatização considera também o capital social? Prefeitos de pequenas cidades alegam que é o banco que chega onde outros não chegam.
Bandeira - O Banrisul é o banco que tem mais alcance nos municípios do Estado. Cada vez mais, isso passa a ser menos importante. E, com o tempo, será absolutamente irrelevante. Por quê? Porque existe um processo em curso, irreversível, de digitalização. Cada vez mais, usamos isso aqui (smartphone) e, cada vez mais, isso vai chegar também no interior do Estado.
JC - Mas, em cidades do Interior, o acesso à rede de internet não é uma realidade.
Bandeira - O Banrisul terá que caminhar nessa direção e já está fazendo isso, pelo que eu sei. Todos esses argumentos podem ser, em maior ou menor grau, válidos. O banco tem um valor hoje, amanhã ou depois ele pode ter um valor maior ou menor, dependendo do que ele fizer, a capacidade de enfrentar essa transformação digital e de manter o seu espaço no mercado. Agora, de toda essa discussão, o pior dos mundos é o que estava posto no final do ano, a tentativa do governo, que dizia que não podia privatizar porque dá lucro, mas queria vender as ações do banco. Por duas razões isso é muito ruim: a primeira, vender qualquer ativo, seja do banco ou de qualquer outra empresa, para pagar salário. Isso deveria ser proibido, porque a despesa corrente tem que ser paga com recursos correntes. Assim só maquia a situação, este ativo é finito, acabou o dinheiro, mas continua o salário, que é uma despesa obrigatória de caráter continuado. A segunda, e talvez a mais grave, seria vender a ação pelo preço que ela é negociada na bolsa abaixo do preço que ela realmente vale. Está registrado no balanço. O valor patrimonial é o que está registrado no balanço oficial do Estado. Para mim, isso é passível de crime de responsabilidade. Tem várias formas de fazer essa discussão, é uma pauta importante, eu prefiro de fazê-la do ponto de vista conceitual.
JC - Pretende fazer esse debate na campanha?
Bandeira - Com certeza, durante o período eleitoral. Muita gente diz que a grande maioria dos gaúchos é contra a privatização. Nunca vi nenhuma pesquisa com grande estatística para pode falar, mas duvido que seja verdade. Se fosse verdade, dos 11 milhões de habitantes, 7 milhões devem ter conta corrente, então, todas estariam no Banrisul. E a grande maioria não está lá. Quem tem conta nos outros bancos será que defende o controle estatal? Acho que é duvidoso esse argumento e que vale a pena fazer a consulta com a população.