Energia renovável é mais do que alternativa

Recursos naturais ganham cada vez mais espaço como matéria-prima para geração

Por Jefferson Klein

Fonte gerou 7.311 MW no pico, registrado na manhã do dia 23
Muitas vezes chamada de alternativa, a energia renovável está longe de ser apenas uma opção de poucos. Cada vez mais relevante na matriz energética, fontes como a eólica e a solar vêm crescendo e deixando de ser apenas uma simples geração complementar. O diretor da Siclo Consultoria em Energia Plinio Milano atesta que a onda da energia renovável veio para ficar. "A fonte de geração limpa é uma necessidade mundial."
Não há dúvidas, segundo o consultor, que, nos próximos anos, haverá um crescimento constante no uso dessa solução. Esse cenário não significa necessariamente a interrupção total da utilização dos recursos fósseis, como o gás natural ou o carvão. Mas Milano salienta que esse tipo de geração terá que se adaptar a um sistema de menor impacto ambiental, utilizando mais e melhores dispositivos que mitiguem as emissões.
O custo de energias como a eólica e a solar ainda não se equivale ao da geração de uma grande hidrelétrica, por exemplo. Entretanto, o diretor da Siclo acredita que está se encaminhando para isso. Entre os fatores que contribuirão para esse panorama de preços mais módicos estão o desenvolvimento de tecnologia e a fabricação em escala de equipamentos.
Os aerogeradores tecnicamente evoluíram, tendo mais potência, e esse fenômeno torna a energia mais barata. "Em uma torre, em que antes gerava-se 2 MW, agora gera-se 4 MW", descreve Milano. O mesmo verifica-se com os painéis fotovoltaicos. O consultor adianta que a tendência no futuro é trocar equipamentos antigos por novos, em usinas já consolidadas, para conseguir um melhor desempenho. O diretor da Siclo compara essa questão à substituição das lâmpadas incandescentes pelas LEDs, um produto mais eficiente, que aproveita a estrutura já existente.
Milano considera que o grande destaque hoje no País, dentro da área de energia, é a geração fotovoltaica. A produção eólica continua aumentando, mas não tão intensamente como no passado, enquanto a solar vem apresentando um incremento exponencial. Isso porque a geração eólica já tem uma base consolidada na matriz energética brasileira, e a solar é uma fonte "mais jovem". Milano argumenta que a sociedade cada vez precisa mais de energia e essa condição terá que ser vinculada a fontes menos poluentes.
> Assista ao vídeo com orientações sobre mini e microgeração de Felipe Ramos, da Uniritter:
O professor do curso de Energia Elétrica da UniRitter, Felipe Ramos, também acredita que o interesse pela energia renovável é algo duradouro. "É uma questão de tempo para que se tenha mais ligações de geração distribuída", projeta. A geração distribuída é a produção de eletricidade no local de consumo e tem se difundido muito no Brasil por meio dos painéis fotovoltaicos. Ramos explica que para a instalação de um sistema fotovoltaico é preciso observar a posição solar da residência e se a área do telhado tem espaço para colocar os aparelhos.
Segundo o professor, o sucesso da geração solar não significará necessariamente a limitação da eólica, já que as duas fontes podem crescer paralelamente. Ramos argumenta que a eólica, para empreendimentos de pequeno porte e em regiões metropolitanas, não tem uma eficiência tão grande. Porém, essa energia tem um bom potencial a partir de complexos de maior envergadura, os famosos parques eólicos.

Micro e minigeração ganham espaço no País

Uma das vantagens para difusão das fontes renováveis, em particular a solar, é a possibilidade de vários agentes utilizarem esse recurso. Nesse sentido, há o conceito da micro e minigeração de energia praticado por pequenos geradores (baixa tensão, como residências e comércios) por meio de dispositivos como painéis fotovoltaicos. Conforme a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), essa categoria de produtores de eletricidade já tem mais de 10 mil instalações no País.
De acordo com dados coletados até meados de maio deste ano, o estado com o maior número de micro e minigeradores é Minas Gerais (2.225 conexões), seguido de São Paulo (2.094) e Rio Grande do Sul (1.096). O vendedor técnico da Fronius Denilson Tinim cita que, segundo a Aneel, em 2024, serão 1 milhão de instalações. "E, até agora, as projeções da agência vêm se confirmando", destaca.
A Fronius é fabricante de inversores, um dos principais dispositivos dos painéis fotovoltaicos, responsável pelo fluxo de energia entre a residência ou estabelecimento e a rede elétrica. Entre 2015 e 2016, obteve crescimento de 160% na venda de inversores. A projeção é que o resultado dobre em 2017 em relação ao ano passado. Um dos benefícios da geração fotovoltaica é que os equipamentos podem ser instalados nos telhados das residências, fábricas ou estabelecimentos comerciais.
Essa característica abre oportunidades para o aproveitamento desse sistema, mais do que, por exemplo, a fonte eólica, que precisa de uma estrutura complexa. Tinim diz que o número expressivo de sistemas fotovoltaicos instalados no Estado se deve ao enorme número de empresas que comercializam essas soluções e às elevadas tarifas cobradas pelas concessionárias locais.

Honda busca diversificação da matriz energética

O grupo Honda apostou na diversificação da matriz energética em resposta à meta definida pela própria empresa de reduzir em 30%, até 2020, as emissões de CO2 de seus automóveis, motocicletas, produtos de força e também de seus processos produtivos em todo o mundo, tendo como base as medições do ano 2000. "Em uma iniciativa inédita na companhia e no setor automotivo nacional, a filial brasileira propôs a criação de um parque eólico e, já em 2015, conseguiu reduzir mais de 50% das emissões", enfatiza o presidente da Honda Energy do Brasil, Carlos Eigi.
Os investimentos necessários para concretizar o complexo, que opera no município de Xangri-Lá, giraram em torno de R$ 100 milhões. Até o momento, o parque eólico já registrou a geração de mais de 170 mil MWh de energia elétrica. Com esse resultado, mais de 14 mil toneladas de CO2 deixaram de ser emitidas no meio ambiente. O empreendimento conta com nove aerogeradores, resultando em uma capacidade total de 27,7 MW.
Eigi considera que o parque eólico gaúcho consolida-se como uma iniciativa bem-sucedida na incorporação de energia limpa e renovável ao processo produtivo dos automóveis da marca. Além de uma fábrica de veículos, com capacidade produtiva de 120 mil unidades ao ano, a Honda Energy supre a demanda de energia elétrica dos escritórios da marca nas cidades de Sumaré e São Paulo e do centro logístico da LSL Transportes, empresa coligada, localizada em Paulínia, responsável pelas operações de movimentação de materiais e abastecimento das linhas de montagem.
A energia gerada em Xangri-Lá não vai diretamente para essas unidades, mas é disponibilizada no sistema interligado nacional. Trata-se de uma espécie de compensação da energia usada. Conforme o executivo, a empresa está sempre em busca de aprimorar todos os processos visando à redução de emissão de CO2 na atmosfera. "Pensamos em expansão da operação, mas, por questões estratégicas, não comentamos mais detalhes", afirma.
 

Rio Grande do Sul possui potencial para geração solar

Apesar de uma primeira impressão poder passar a ideia de que o Estado não tem boas oportunidades para a produção fotovoltaica, devido ao seu inverno mais rigoroso em relação a outras regiões do País, quem acompanha o setor afirma que os gaúchos podem, sim, aproveitar o sol como fonte de eletricidade. Uma frase do professor do curso de Energia Elétrica da UniRitter, Felipe Ramos, ilustra o assunto: "o pior lugar no Brasil para geração solar comparado ao melhor local na Alemanha ainda fica acima deles".
O diretor da Siclo Consultoria em Energia Plinio Milano acrescenta que locais com altas temperaturas não são os melhores. Isso porque um painel fotovoltaico, sob muito calor, começa a perder rendimento, pois as peças esquentam. Porém é evidente que não são adequados lugares com chuvas recorrentes ou clima nublado.
Uma prova de que o Rio Grande do Sul tem como explorar essa área foi dada recentemente, através de um posto de combustíveis em São Jerônimo, que recebeu 80 painéis fotovoltaicos. O serviço foi feito pela da Eco Energy em quatro dias e a operação começou em outubro do ano passado. Inicialmente, a meta era abater 82% do consumo do cliente (cerca de 33,4 mil kWh ao ano). "Como o uso de energia do posto diminuiu, o sistema está praticamente atendendo toda à demanda", conta sócio-proprietário da Eco Energy Gerson Preto. O custo da implantação dos equipamentos foi de R$ 115 mil, e a perspectiva de retorno do investimento é de quatro a cinco anos.
Preto enfatiza que uma solução bem projetada pode durar em torno de 25 anos operando à plena capacidade. Depois desse período, o sistema terá uma perda de 20% de potência. "Muitos clientes residenciais pensam em investir, porque a energia não será um custo que eles terão durante a aposentadoria", comenta. Raciocínio semelhante pode ser adotado por empresas que pretendem reduzir gastos futuros. Além disso, há a motivação ecológica de propiciar um menor impacto ambiental. A Eco Energy também aposta no campo das energias alternativas. Uma das iniciativas abrange as bicicletas de academias de ginástica. Um dispositivo (alternador) é conectado à bicicleta e, quando a pessoa começa a pedalar, também gera energia.

Ambev busca mercado livre

A multinacional AB Inbev (união da brasileira Ambev e da belga Interbrew) estipulou como meta fazer com que suas unidades produtoras de bebidas comprem apenas eletricidade de fontes renováveis até 2025. A iniciativa permitirá que o grupo diminua a pegada de carbono operacional da empresa em cerca de 30%, o percentual é equivalente à retirada de 500 mil carros das ruas. Para implementar esse plano no Brasil, a companhia precisará recorrer ao mercado livre de energia (formado por grandes consumidores, que podem escolher de quem vão adquirir a eletricidade).
O diretor de suprimentos de energia e matérias-primas da Ambev, Jorge Fontan, detalha que as fábricas do grupo no País terão que comprar toda sua energia nesse ambiente, pois no mercado cativo não é possível assegurar que a eletricidade consumida seja de fontes renováveis. Hoje, a companhia adota uma prática mista, sendo tanto consumidora cativa como livre. Além da aquisição de energia, a Ambev também pretende atender parte do seu consumo através da instalação de painéis fotovoltaicos em suas plantas. A meta é satisfazer aproximadamente 15% das demandas elétricas das fábricas com essa medida.
Entre as fontes que são alvo do interesse da empresa estão a eólica, solar, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). Conforme o executivo, as grandes hidrelétricas, por enquanto, serão evitadas, pois também representam um forte impacto ambiental devido à necessidade de enormes áreas alagadas. Fontan acrescenta que no Brasil há muitas oportunidades quanto ao uso de energias renováveis, principalmente porque as tecnologias do setor foram aprimoradas e devem continuar melhorando.
Hoje, o consumidor final, especialmente as novas gerações, leva em conta a sustentabilidade do produto antes de adquiri-lo. Fontan acredita que a AB Inbev terá um aspecto relevante dentro desse conceito. "Somos uma das empresas de consumo massivo mais importantes, podemos assumir um papel de liderança para diminuir o uso de combustíveis fósseis", afirma.