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Crise obriga academias a reinventar os negócios
Queda no movimento fecha cerca de 40 empreendimentos na Capital
A crise econômica pegou de jeito o mercado fitness no Brasil, terceiro no mundo em número de academias (31,8 mil) e sétimo em movimentação financeira (em torno de R$ 7,2 bilhões por ano). Pesquisa realizada por SPC Brasil e CNDL no ano passado, auge da crise, apontava que 26% dos brasileiros deixaram de malhar para economizar. Desemprego, inflação alta e juros nas alturas formaram uma série difícil de ser superada até pelos mais experientes, forçando mudança - nada saudável - nos hábitos de consumo.
Apenas em Porto Alegre, cerca de 40 academias fecharam as portas nos últimos três anos, principalmente pelo menor movimento, de acordo com a Associação das Academias do Rio Grande do Sul (Acad-RS) - que recentemente, por ironia, também encerrou as atividades e foi incorporada à Acad Brasil. O número de baixas é expressivo, considerando que há em torno de 350 unidades em atividade hoje em Porto Alegre, segundo o Conselho Regional de Educação Física (Cref-RS), que registra todos os estabelecimentos. "Nunca tinha visto uma crise como essa de 2015 e 2016. Mas quem passou por ela vai começar a ter uma reação", afirma o ex-vice-presidente da Acad-RS, Ricardo Paranhos, proprietário da Academia Alternativa nos bairros Cidade Baixa e Santana, marca que opera há 25 anos.
Paranhos fala com orgulho da variedade de atividades e da inovação, segundo ele, que promove nas duas unidades da rede na capital gaúcha. Diz ter sido a Alternativa a primeira academia de Porto Alegre a investir em aulas de zumba - que alia exercícios aeróbicos e dança latina - e uma das poucas que hoje oferecem ballet fitness, treinamento funcional com técnicas de ballet clássico, voltado ao público feminino. No ano passado, porém, foi obrigado a dar prioridade a ajustes nos custos da empresa para se manter no mercado. "Busquei a estratégia que tinha quando (o negócio) era pequeno. Tivemos algumas demissões no quadro de funcionários, mudamos os horários da ginástica. Não sabia qual era o fundo do buraco", afirma. Os preços dos planos de 6 e 12 meses também ficaram mais baratos, segundo ele. "Fizemos promoções com 50% de desconto (em relação à venda avulsa), quando o normal era entre 30% e 38%."
A gestão financeira também foi marcante no ano passado para a Moinhos Fitness, rede de academias com 10 unidades em Porto Alegre e cerca de 8 mil alunos. O proprietário, Henrique Petersen, conta que o movimento foi cerca de 30% menor no verão 2015-2016. "Aquele verão teve dois meses chovendo direto, então as academias daqui também sentiram um pouco antes da crise. Depois, o ano todo foi bem ruim", lamenta. A estratégia foi trabalhar forte no comercial, facilitando o pagamento e baixando os preços. Ele conta que voltou a trabalhar com pagamento em cheque, fez planos em 12 parcelas, deixou de cobrar alguns valores à vista e passou a aceitar em três ou quatro vezes. Para Petersen, a rede mirou, de certa forma, um nicho de mercado - o aluno sem crédito -, mesmo que, para isso, a inadimplência tenha aumentado, chegando a cerca de 4%. "É melhor do que perder o aluno."
A expectativa agora é que 2017 seja de retomada para as academias. Segundo Paranhos, o movimento aumentou 7% no primeiro trimestre do ano, recuperando em parte a perda de alunos em 2016. Petersen, da mesma forma, diz que a procura normalizou em março. "Esse aluno (que perdeu por conta da crise) termina, uma hora ou outra, voltando, e agora tem menos gente no mercado."
Redes low cost crescem no mercado devido ao novo perfil de consumidor
Contar com uma dezena de unidades em Porto Alegre também acaba diminuindo os custos para a Moinhos Fitness. A rede de academias consegue, por exemplo, comprar mais equipamentos com preço unitário menor, pode aproveitar o quadro administrativo em várias academias, traz profissionais de fora para dar treinamento com melhor custo-benefício e ainda ganha em visibilidade de marca sem investir tanto em publicidade, conta o proprietário, Henrique Petersen.
É justamente investindo no menor custo possível que grandes redes de academias têm encontrado sucesso mesmo na crise, com estabelecimentos conhecidos como low cost - aqueles com bons equipamentos e planos baratos, pois os profissionais atendem a número bem maior de pessoas por hora. Um exemplo na capital gaúcha é a rede SmartFit, que tem cinco unidades e atende a mais de 15 mil alunos. "O número de clientes vem aumentando", conta Edgard Corona, presidente do Grupo Bio Ritmo, dono da SmartFit. Para estar na contramão do mercado, o empresário cita como diferencial "um serviço com qualidade e conveniência aos clientes", investindo na estrutura e localização das unidades e ofertando preço de mensalidade mais baixo.
Cultura do fitness mudou, afirma consultora de qualidade de vida
Não é só o menor poder aquisitivo do brasileiro que responde pelo movimento menor nas academias. Para a consultora em qualidade de vida Carla Lubisco, à frente de um grupo de personal trainers que leva seu nome, o mercado fitness passa por uma repaginação - e quem manda nela é o cliente. "Na crise, realmente as pessoas cortam algumas coisas que não deveriam cortar, como a saúde. Mas existe um movimento forte de mudança, que é o aluno escolher o que fazer. Ele quer uma experiência única", afirma a gaúcha, que trabalha há 40 anos no setor.
Para Carla, é cada vez mais comum o aluno não se sentir realizado com uma rotina de exercícios, ir todos os dias repetir treinos em um mesmo local para ter saúde e um corpo bonito. O segredo para atender a esse tipo de consumidor seria a variação de atividades, como yoga, meditação, musculação, corrida ao ar livre. "O aluno quer sair da mesmice. Isso não é o mesmo que descuidar das repetições, do exercício técnico, é uma questão de mais democracia."
Teria sido essa mudança de hábito que fez com que a personal trainer mantivesse o número de clientes no período crítico na economia brasileira, o que considera positivo. Também conta que foi importante explicar aos alunos o que o exercício físico significava para a saúde. "Crise gera estresse. Sem saúde, a pessoa não consegue segurar."