A 11ª Vara Cível da Justiça Estadual de São Paulo condenou a empresa chinesa Baidu pela prática de concorrência desleal contra a startup brasileira de segurança digital PSafe. A decisão foi tomada em dezembro de 2016 e chama a atenção por seu ineditismo: é a primeira vez que a Justiça brasileira aplica a lei da concorrência em uma disputa de dois produtos digitais e sem conexão com o mundo físico. A chinesa ainda pode recorrer.
"É um caso inovador", afirma o professor do Instituto de Direito Público de São Paulo, Jacques Labrunie. "Concorrência desleal entre empresas existe desde o início do comércio. Mas é a primeira vez que a lei é aplicada em relação a serviços digitais no Brasil, como se fosse um loja praticando atos ilegais contra outra loja."
Segundo a decisão, baseada em um laudo técnico elaborado por um perito da Universidade de São Paulo (USP), "a Baidu programou seu aplicativo Du Speed Booster para emitir alertas falsos em relação ao PSafe Total." Os alertas, que não têm fundamentação técnica, segundo laudo, aconselhavam o usuário a desinstalar o app da startup, alegando que ele estava infectado com vírus e outros malwares.
Com a condenação, a chinesa terá de pagar indenização por danos materiais, lucros cessantes (prejuízo associado à desinstalação do app) e danos morais pela prática de concorrência desleal, como previsto na Lei da Propriedade Industrial. A Baidu também deverá se retratar publicamente e modificar seu aplicativo para não emitir alertas contra o PSafe Total.
Segundo especialistas, a multa pode chegar a 20% do valor do faturamento bruto da empresa. Como a Baidu não divulga seu faturamento no País, não foi possível estimar o valor da pena.
"Casos assim já ocorreram no exterior envolvendo a Microsoft e a Netscape, por exemplo", diz o professor de direito do Ibmec, Leonardo Pessoa. "É importante que casos assim ocorram para que empresas digitais também respeitem as leis do País."
Procurada, a Baidu informou que vai recorrer da decisão. A empresa ainda afirmou que "usará todos os instrumentos legais para combater qualquer ato de competição desleal". Já a PSafe, por meio de nota, frisou que se trata de "uma vitória da livre concorrência no Brasil."
Não é só o ineditismo que chama a atenção, mas também o desenrolar do processo, que começou em janeiro de 2015. Na época, a PSafe processou a Baidu, dizendo que a chinesa usava seu programa para prejudicar o app de antivírus.
Em junho daquele ano, a Baidu tentou reverter o jogo, processando a PSafe pelo mesmo motivo pelo qual era acusada. "Não é normal acontecer uma acusação cruzada", diz Pessoa, do Ibmec. Por causa disso, as acusações foram unidas em um só processo. "Havia risco de existirem resultados divergentes em outros julgamentos."
Apesar de a Baidu ainda poder recorrer, a situação não deve ser revertida, dizem especialistas. "A decisão está bem fundamentada em uma perícia cuidadosa, feita por gente especializada", diz Labruine, do IDP.