Em estudo publicado na Carta de Conjuntura Fundação de Economia e Estatística (FEE) do Rio Grande do Sul do mês de julho, duas pesquisadoras evidenciam a importância da proteção à mulher e do acesso ao atendimento especializado pelas vítimas para enfrentar a violência de gênero. De acordo com as pesquisadoras Clitia Helena Backx Martins e Deisi Conteratto, a violência contra as mulheres, problema antigo e de âmbito universal, mostra-se ainda mais frequente e legitimado nas regiões do mundo com predominância de culturas de forte cunho patriarcal e sexista. Isso acontece porque a violência contra a mulher não é vista como um crime relevante por parcela significativa da população, o que leva à naturalização do comportamento agressivo e à culpabilização das vítimas.
Mesmo o Brasil contando com um amplo arcabouço jurídico e de políticas públicas - como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio - a ocorrência de crimes violentos contra as mulheres, tanto no âmbito público como no doméstico, segue elevada. Nesse contexto, a caracterização do Brasil como sendo um país de cultura misógina e inseguro para as mulheres tem sido divulgada internacionalmente. "Jornais e sites de turismo e de negócios colocam o Brasil entre os 10 destinos turísticos ou países mais perigosos do mundo para viajantes do sexo feminino. Como exemplo, na lista global dos least female-friendly places, do The New Economy, o Brasil aparece acompanhado de Afeganistão, Índia, Paquistão e República Democrática do Congo, entre outros", destaca a análise.
Sobre os dados de violência, as pesquisadoras trazem o Mapa da Violência 2015, publicado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, para comprovar a reputação brasileira em termos internacionais. A pesquisa evidencia que o Brasil, entre 83 países, está entre os cinco com maior taxa de homicídios femininos (4,8 por 100.000). Contudo, o estudo ressalta a importância das leis de proteção à mulher, já que, no período de 1980 a 2006, anterior à Lei Maria da Penha, o crescimento da taxa de homicídio feminino foi de 2,5% ao ano e, pós 2006, já sob a vigência da legislação, a taxa reduziu para 1,7% ao ano.
Rede de atendimento inexiste na maioria das cidades gaúchas
No que diz respeito à taxa de homicídios de mulheres por estados, o Rio Grande do Sul ocupa o 24º lugar, com uma taxa de 3,8 por 100.000 abaixo da média brasileira. Nas piores posições estão Roraima, com 15,3; Espírito Santo, com 9,3; Goiás e Alagoas, com 8,6; e Acre, com 8,3. Quanto às capitais, Porto Alegre está em 24º lugar, atrás de Vitória (ES), Maceió (AL), João Pessoa (PB) e Fortaleza (CE) com as piores taxas, nessa ordem.
Para o enfrentamento efetivo da violência de gênero, as pesquisadoras ressaltam a necessidade do estabelecimento de redes de proteção à mulher e de acesso a atendimento especializado às vítimas nos municípios brasileiros. No Estado, existem equipamentos e serviços como Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), Patrulha Maria da Penha e Posto Policial para a Mulher, cada um deles presente, não concomitantemente, em 22 municípios dos 497 existentes. Há ainda as casas-abrigo, para o acolhimento das vítimas de violência doméstica, presentes em 12 municípios, e a Sala Lilás, espaço nas Deams destinado ao primeiro atendimento, inclusive com exame de corpo de delito, em oito municípios - Porto Alegre, Vacaria, Rio Grande, Caxias do Sul, Bento Gonçalves, Santa Maria, Santana do Livramento e Bagé.
Por fim, as pesquisadoras ressaltam uma mudança de visão das próprias mulheres, que vêm buscando com maior intensidade os recursos e serviços disponibilizados, o que repercute no aumento das denúncias.