Um levantamento realizado pelo Jornal do Comércio, com base nos sites das câmaras de vereadores de 28 municípios do Estado constatou que, destas, apenas sete casas legislativas têm parlamentares negros e pardos, ou assim autodeclarados. A média não chega a 2% de ocupação, enquanto a proporção de negros e pardos entre a população gaúcha é de cerca de 16%. No caso das mulheres, apesar de a média de vereadoras eleitas ser de 11,7%, o índice também está aquém da representação feminina na população gaúcha, que é de 51,3% dos 10.693.929 habitantes, segundo o último Censo populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2010.
Em Porto Alegre, município que concentra a maior população do Estado, com 1.409.351 habitantes dos quais 53,6% é de mulheres e 20% é de negros e pardos, a diversidade do povo não se reflete na Câmara de Vereadores. Dos 36 parlamentares, apenas quatro são mulheres e dois, negros.
A Câmara onde o cenário é mais desigual é a de Passo Fundo, na região da Produção, no Norte gaúcho, onde, dos 21 vereadores, há apenas uma mulher e nenhum negro ou pardo. A representatividade desses grupos na população da cidade é de 52,3% e 16,5%, respectivamente.
O único município onde não há nenhuma vereadora é Pelotas, onde todos os 21 parlamentares em exercício são homens, dos quais há um vereador autodeclarado negro. As mulheres representam 53% da população pelotense.
Além de Pelotas e Porto Alegre, os únicos municípios que contam com vereadores negros e pardos são Caxias do Sul (um vereador), Taquara (um vereador), Três Passos (um vereador), Uruguaiana (um vereador) e Bagé (dois vereadores).
Bagé, na região da Campanha, na Fronteira-Oeste, pode ser considerada uma exceção entre os municípios. Sua Câmara Municipal é a mais diversa em relação às 27 outras cidades pesquisadas. Dos 17 parlamentares, 29,4% são mulheres. O número, apesar de estar aquém da representatividade feminina na população local, de 52%, é superior à cota feminina obrigatória nas candidaturas, que atualmente é de 10%. No caso dos negros e pardos, que são 9,3% da população - menos que a média do Estado -, a representação na Câmara é de 11,7%.
Para a professora Maíra Kubik Mano, do Departamento de Estudos de Gênero e Feminismo da Universidade Federal da Bahia, a própria divisão desigual do trabalho acarreta na escassa presença feminina no Poder Legislativo em geral. "As mulheres têm menos tempo para participar da política institucional, porque, nessa divisão laboral, elas ficam sobrecarregadas", analisa. Maíra reforça que mesmo dentro da política partidária, as candidaturas femininas são menos prioritárias, o que se reflete na campanha. "Há menos dinheiro para a campanha (feminina) na distribuição do fundo partidário e menos tempo de TV", completa.
Em 2012, a professora Maíra foi coautora do livro "Mulheres e negros na política: estudo exploratório sobre o desempenho eleitoral em quatro estados brasileiros", que avalia as principais razões para a sub-representação desses grupos em cargos eletivos.
Além de haver um perfil específico do político de raça branca e renda elevada, a pesquisa constatou que um dos principais impeditivos para o sucesso de candidaturas femininas e de negros e pardos é a tradição familiar no exercício da política, com filhos e netos de políticos renomados chancelados pela tradição familiar.
Ao mesmo tempo, Maíra afirma que a tradição familiar é um dos meios pelos quais as mulheres mais chegam ao poder atualmente. "São as mulheres que vêm das famílias tradicionais de políticos, mulheres cujo avô, bisavô, marido, tio, filho, primo participam da vida política institucional, e aí elas ingressam pela força da família, e não pela força individual da candidatura, o que é mais vinculado aos partidos de centro e centro-direita", disse. "Já nos partidos de centro-esquerda e esquerda, encontramos mais mulheres que vêm de espaços de militância, principalmente sindical", afirma.
Porém, segundo a pesquisadora, o mesmo fenômeno não ocorre com candidatos e candidatas negros e pardos. "Nesse caso a questão da família não se reproduz, porque não existe tradição familiar. Nesse sentido eles estão ainda mais excluídos do que as mulheres", analisa. Para Maíra, a questão que remete à desigualdade é estrutural. "Ou a gente democratiza mais a sociedade ou a gente não vai conseguir ultrapassar essa barreira", conclui.