Arte na ponta dos dedos: acessibilidade para deficientes visuais

Com recursos para deficientes visuais, a curadoria é assinada por Doris Couto e Leila Pedrozo

Por Michele Rolim

Exposição utiliza o tato para inserir deficiente visual no mundo das artes
Há poucos recursos de acessibilidade em produtos culturais diversos, mas uma das áreas que menos desenvolvem ações neste sentido são as artes visuais. Suprindo uma lacuna, a exposição Porto Alegre na ponta dos dedos - Uma exposição para tocar, ouvir e ver inaugura hoje, às 19h, no Centro Cultural CEEE Erico Verissimo (Rua dos Andradas, 1.223).
Com recursos para deficientes visuais, a curadoria é assinada por Doris Couto (pesquisadora e aluna do curso de museologia da Ufrgs) e Leila Pedrozo (bacharel em Museologia pela Ufrgs). A partir de fotografias dos prédios do Centro de Porto Alegre, selecionadas em concurso realizado em homenagem ao aniversário de 243 anos da cidade, são apresentadas maquetes bidimensionais das edificações - desenvolvidas pelo artesão Henrique Grandini - audiodescrição das imagens, legendagem em Braille, histórico de cada prédio em áudio e tapetes com sinalização de alerta.
São poucas as iniciativas como essa, que ampliam o entendimento de acessibilidade para além das adaptações na estrutura física. Doris lembra que recursos de interação por meio do tato com obras originais, maquetes arquitetônicas e réplicas são, de modo geral, mais utilizados por museus, a exemplo da Pinacoteca de São Paulo. "Durante muito tempo se falou que gestores e curadores não tinham o olhar voltado para isso. Mas, além disso, vejo que é muito mais um problema de cidadania. A acessibilidade tem que ser pensada também a partir de quem produz a obra de arte", relata Doris.
Para ela, um dos elementos que acaba sendo um complicador nesse aspecto é o custo, já que a projetos culturais dificilmente têm orçamentos folgados - deste modo, recursos de acessibilidade terminam em segundo plano. Doris lembra que a Lei Rouanet prevê que haja nos projetos mecanismos de acessibilidade. "Via de regra, o Ministério da Cultura tem aceito que a exposição se restringia a rampas e elevadores, como se houvesse apenas pessoas com deficiência motora. Isso precisa ser discutido do ponto de vista de política pública mesmo", defende Doris.
Para que o retorno do público com deficiência visual seja satisfatório, estiveram no local, terça-feira passada, três jovens com diferentes graus de cegueira. Leonardo Guimarães, Giovana Machado Escarcel e Jenyffer Oliveira Santos passaram pela experiência tátil e sonora. "Nunca fui em uma exposição. Consegui perceber direitinho a imagem, isso deveria ter em todos os lugares para todo mundo sentir Porto Alegre", conta Jenyffer, 14 anos, que estuda no Instituto Santa Luzia e já teve experiência com audiodescrição no teatro com a peça A menina do cabelo vermelho. Para as curadoras, é fundamental a visita dos jovens para que a exposição, antes da abertura, estivesse completamente adaptada a eles.
"Na minha cabeça, as maquetes ficariam penduradas na parede como as imagens fotográficas. Mas depois da terceira, o visitante não aguentaria mais ficar de mãos levantadas. O ato de utilizar o tato para sentir leva de 5 a 8 min", afirma ela, que também contou com a consultoria da pedagoga Bruna Schatschineider, a primeira a fazer o teste da maquete. 
A exposição também é um convite ao público em geral. Pelas lentes de 15 fotógrafos porto-alegrenses estão as fachadas de locais representativos da cidade, como Igreja das Dores, prefeitura de Porto Alegre, Confeitaria Rocco, Theatro São Pedro, Catedral Metropolitana, Memorial do Rio Grande Do Sul, Museu Hipólito da Costa, Pórtico do Porto e Usina do Gasômetro.
A ideia é também levar a discussão para Câmara de Vereadores, solicitando que os editais do Fumproarte recomendem e, futuramente, passem a exigir projetos com acessibilidade. "Queremos que essa exposição vá além, desperte a consciência do direito cultural do outro", convida Doris.
Financiada pelo Edital Porto Alegre Amanhã/2014 - do Fundo Municipal de Cultura, a mostra poderá ser visitada até 30 de novembro, de terças a sextas-feiras, das 10h às 19h, e sábados, das 11h às 18h. A entrada é franca. Agendamentos de escolas devem ser efetuados pelo e-mail poanapontadosdedos@gmail.com.