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entrevista especial

- Publicada em 08 de Abril de 2013 às 00:00

Eleição é financiada por 200 grupos, diz Fontana


Marcelo G. Ribeiro/JC
Jornal do Comércio
A Câmara dos Deputados deve iniciar amanhã a votação do pacote de alterações proposto para uma reforma política. Em entrevista ao Jornal do Comércio, o relator do texto, deputado federal Henrique Fontana (PT), afirma que seu único temor é que articulações políticas impeçam a apreciação das medidas, mas avalia que, se o projeto for para o plenário, conseguirá emplacar o financiamento público de campanha.
A Câmara dos Deputados deve iniciar amanhã a votação do pacote de alterações proposto para uma reforma política. Em entrevista ao Jornal do Comércio, o relator do texto, deputado federal Henrique Fontana (PT), afirma que seu único temor é que articulações políticas impeçam a apreciação das medidas, mas avalia que, se o projeto for para o plenário, conseguirá emplacar o financiamento público de campanha.

O petista reconhece que o projeto não engloba todas as mudanças necessárias para qualificar a estrutura política do Brasil, mas acredita que as alterações serão capazes de tornar as eleições mais igualitárias e justas. Fontana explica os principais pontos do projeto de lei e das propostas de emenda à Constituição, que implantam o sistema de lista flexível, redução do número mínimo de assinaturas para a tramitação de projetos de lei de iniciativa popular, extinguem as coligações nas eleições proporcionais e unificam as eleições.

Em um balanço sobre o PT em Porto Alegre, avalia que o partido tem que se modificar, mas indica que o modelo de gestão do ex-prefeito José Fogaça (PMDB) e do atual chefe do Executivo, José Fortunati (PDT), está se esgotando. O deputado também projeta as articulações para a reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT) e do governador Tarso Genro (PT) com a manutenção do PSB entre os aliados. 

Jornal do Comércio - O financiamento público de campanha é a questão mais importante da reforma política?

Henrique Fontana - Sem dúvida. A democracia brasileira é cada vez mais a democracia do dinheiro, ao invés da democracia dos projetos, dos programas, histórias de vida e credibilidade dos candidatos. Há diversos indicativos que mostram isso: por exemplo, das 513 campanhas mais caras do Brasil para deputado federal, 379 tiveram sucesso. A tendência é de que a capacidade de arrecadação, o volume de dinheiro disponível para uma campanha eleitoral, seja o fator decisivo para o sucesso ou para o insucesso dessa candidatura. Outro número interessante é que a diferença do preço médio entre as 513 campanhas vitoriosas para os 513 suplentes é de seis vezes.

JC - O financiamento público é questionado por uma parcela da população. 

Fontana - As pessoas estão iludidas quando pensam que não pagam pela campanha hoje, a partir do sistema de financiamento privado. A população paga porque o preço das doações de campanha vem embutido no preço dos produtos que o cidadão compra, nas obras que o Estado faz. E paga pela rede de ilegalidades e de corrupção que se forma nesse sistema de financiamento privado de campanha. Outra ilusão é sobre quem financia as eleições no Brasil. O custo está sendo suportado por 200 grandes financiadores, que detêm um poder absurdo. O financiamento público será mais barato para o Brasil, vai economizar recursos e vai cortar diversos canais de corrupção.

JC – Quais mecanismos serão criados para evitar o caixa-2?

Fontana – O sistema vai aumentar a capacidade de fiscalização porque só os partidos receberão recursos. Ao invés de milhares de campanhas para fiscalizar, passa-se a ter, em cada estado, no máximo 80 campanhas para financiar, porque o partido vai organizar as contas de campanha. Não há lei perfeita. Há pessoas que fazem uma sabatina minuciosa, crítica com o novo sistema e exigem dele a perfeição, mas não analisam o atual. Tenho colegas deputados que criticam a mudança porque, no fundo, querem deixar tudo como está.

JC – Os partidos menores criticam o fim das coligações nas eleições proporcionais. Como está a negociação?

Fontana - Hoje, os partidos pequenos têm uma enorme dificuldade de financiar suas campanhas, e quando entram em uma eleição, em geral, o candidato a governador ou a prefeito tem poucas chances de vitória. O atual sistema de financiamento é extremamente benéfico para os grandes partidos, que são os únicos a receber recursos das grandes empresas. O financiamento público torna a eleição mais igualitária. A atual tática de sobrevivência do partido é fazer uma coligação com outros dois maiores e escolher um único candidato para representar o partido. A minha proposta é que, ao apresentar uma chapa completa de candidatos a deputado, vou tornar a política mais plural, com mais oferta de candidatos.

JC - E o coeficiente eleitoral, que hoje também é considerado um impedimento para os pequenos partidos?

Fontana - O coeficiente eleitoral é uma cláusula de barreira e será retirada. E isso é algo justo, que beneficiará os partidos menores. Tenho sido acusado de defender pontos que beneficiam partidos grandes. Mas, se fosse olhar o interesse preciso do PT, no momento atual da política, provavelmente, continuar com o financiamento privado faria do PT um partido que elegeria mais deputados.

JC - A deputada federal Manuela d’Ávila (PCdoB) lidera um grupo de partidos que pede a reforma completa, ao invés de uma minirreforma. Como vê isso?

Fontana - A crítica é no sentido de que a reforma não deve votar apenas o fim das coligações, e tenho a mesma posição que ela. Queremos garantir que, em primeiro lugar, aconteça a votação do projeto de lei que garante o financiamento público de campanha e a do sistema belga de votação. Depois uma emenda constitucional, que propõe a coincidência de eleições e alteração de data de posses, uma terceira emenda propõe o fim das coligações proporcionais. Isto pode ser mexido no plenário, em qualquer votação existem riscos no plenário, mas entendo que o maior risco para a democracia brasileira é não votar a reforma política.

JC – Como funcionará o sistema de votação em lista? 

Fontana – O chamado sistema belga vai fazer uma mudança moderada no sistema político eleitoral, uma mudança que a cultura do brasileiro vai acolher, porque o brasileiro está muito acostumado a votar nominalmente em seu deputado. Os partidos vão ordenar a lista de seus candidatos, com sistema democrático interno. O filiado a um partido vai ter a obrigação e o direito de votar em quatro nomes para ordenar a lista de seu partido. Neste ordenamento, haverá uma ação afirmativa, na qual proponho a ampliação do papel da mulher na política brasileira. Coloco que, de cada três candidatos, sejam dois homens e uma mulher ou duas mulheres e um homem, com a garantia de que, no mínimo, o número de mulheres no próximo Parlamento duplique.

JC - A mudança na proporcionalidade entre o número de eleitores e o de deputados é um tema polêmico e não foi mexido. Por quê?

Fontana - É justa a ideia de que um brasileiro tem direito a um voto. Não pode o voto de um acreano valer 10 vezes mais ou 15 vezes mais do que o voto de um gaúcho. Só que não há nenhuma possibilidade de isso mudar no Parlamento brasileiro. Se fosse colocada esta proposta, seria derrotada na arrancada, não começaria nem o debate. Como pretendo mudar coisas estruturais, que melhorem a democracia, tive que fazer escolhas. Acredito que um assunto como este só pode ser debatido se, em algum momento, o País fizer uma Constituinte exclusiva para analisar seu sistema político. 

JC – Como está a articulação no plenário? A principal bancada aliada, o PMDB, tem afirmado que não dá respaldo para o financiamento público.

Fontana - Não temo isso. Temo que impeçam a votação. Se for à votação, tenho convicção de que vamos ganhar na questão do financiamento público. Está crescendo o número de pessoas na sociedade que o apoiam. À medida que as pessoas compreendem os porões do financiamento privado, passam a apoiar o público.

JC – A ampliação da participação popular é um dos temas que tem tido menor repercussão dentro reforma.

Fontana – Sim, e haverá uma ampliação real. Hoje, a população só pode apresentar projetos de lei, a Constituição não permite que uma emenda constitucional nasça da iniciativa popular. Mas é tão difícil este projeto ser criado que, desde que está prevista a possibilidade de projetos de lei de iniciativa popular, apenas três foram apresentados na Câmara dos Deputados. Proponho a diminuição no número de assinaturas para 500 mil, nos projetos de lei, e 1,5 milhão para emenda constitucional.

JC – O senhor é um dos principais líderes do partido no Estado e foi sondado para disputar a prefeitura da Capital. Como avalia a derrota petista em Porto Alegre?

Fontana - O PT tem que tirar profundas lições desses dois últimos processos eleitorais, e não são lições referentes a personalidades. O partido tem que se revitalizar na cidade, redescobrir o conjunto de relações políticas que tinha e que perdeu e tem que ter humildade para reconhecer que, se as perdeu, é porque não conseguiu motivar essas relações políticas. Um voto não é eterno. O mesmo PT que perdeu a eleição em Porto Alegre de maneira bastante dura é o PT que, quando teve um candidato a governador como o Tarso (Genro), teve vitória ampla em Porto Alegre. Sinto que o governo que vai agora encerrar esses 12 anos, o governo José Fogaça (PMDB), que é continuado pelo governo José Fortunati (PDT), dá um conjunto enorme de sinais de cansaço e de falta de algumas medidas estruturais de que a Capital precisa.

JC – Mas a expressiva votação não legitimou este governo?

Fontana – Sim, foi uma votação muito grande, mas percebo que algumas temáticas, no seu devido tempo, serão discutidas. A maneira como está sendo feita a expansão urbana de construções em Porto Alegre, por exemplo, com altíssima verticalização em alguns lugares e alta ocupação de solo urbano, não está sendo acompanhada de devidas contrapartidas que esses investimentos teriam que dar para a cidade. Mas, antes desse debate, o PT tem que fazer seu dever de casa, que é redescobrir o contato com uma série de setores que evidentemente perderam a confiança em nós na última eleição.

JC – Qual é a sua avaliação do quadro político para a reeleição da presidente Dilma?

Fontana - Estou entre os que vão fazer um grande esforço para manter o PSB na nossa aliança. O (governador de Pernambuco) Eduardo Campos (PSB) tem toda a legitimidade para ser candidato, mas se a economia dá certo e o País vive um volume de obras como nunca, então, será melhor apoiar a reeleição de Dilma. Eduardo se fortalece mais como líder político se estivermos juntos. Vamos enfrentar, provavelmente, o (senador mineiro) Aécio Neves (PSDB), que tem se mostrado com muita dificuldade de sintonizar com a opinião da população brasileira. E a (ex-ministra do Meio Ambiente) Marina Silva (ex-PT, ex-PV e hoje sem partido) é uma candidatura que tem demonstrado muita fragilidade. Respeitamos os adversários, mas sinto que a presidenta é franca favorita.

JC – E a reeleição do governador Tarso Genro (PT)?

Fontana - Tarso será uma candidatura fortíssima. É candidato à reeleição, ainda que não nos autorize a dizer isso oficialmente. Tenho uma enorme motivação e convicção da importância da reeleição do governador Tarso, porque ele está promovendo mudanças estruturais no Estado. O governador restabeleceu, ampliou a capacidade de investimento do Estado, há uma melhoria em diversas áreas, estradas, obras em escolas. Quando chegar ao final dos quatro anos de governo e compararmos com os governos anteriores, teremos resultados superiores em quase todas as áreas. Vamos enfrentar a (senadora) Ana Amélia (PP) e uma candidatura do PMDB. O (deputado federal) Beto Albuquerque (PSB) só será candidato se Eduardo Campos concorrer à presidência da República, e acredito que isso não vai acontecer.

JC – O senhor concorrerá à reeleição? 

Fontana – É a maior possibilidade. O PT deve ter Tarso como candidato à reeleição e deve ter as vagas do Senado e de vice-governador para compor a nossa aliança. Preferencialmente devemos trabalhar para manter a aliança com PDT, PTB, PSB, PCdoB e PPL. 

Perfil

Henrique Fontana nasceu em 18 de janeiro de 1960, em Porto Alegre. Formado em Administração de Empresas e Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Henrique cumpre o quarto mandato de deputado federal, eleito em 2010 com 131.510 votos. Atualmente, Fontana é vice-líder da bancada do PT na Câmara  dos Deputados e relator da Comissão Especial da Reforma Política. O petista foi eleito vereador da Capital em 1992. Em 1996, foi reeleito para o Legislativo e se tornou secretário municipal da Saúde, na gestão de Raul Pont (PT). Candidato a deputado federal pela primeira vez em 1998, teve expressiva votação e ingressou na bancada do PT na Câmara Federal. Foi selecionado pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) como um dos parlamentares mais destacados do Congresso. Em 2008 e 2009, foi eleito pelos parlamentares como o segundo deputado mais destacado do Congresso Nacional. Pela sua atuação, recebeu também prêmios do site Congresso em Foco. 
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